Pronta a persistir nos mesmos erros
Não se vê, no discurso da presidente Dilma, o mais tênue sinal de disposição para corrigir o rumo da política econômica
ROGÉRIO FURQUIM WERNECK - O Globo
Aos
trancos e barrancos, o governo chega ao primeiro turno da eleição
presidencial com a economia fazendo água por todos os lados. Apesar do
represamento do câmbio e dos preços de energia létrica e combustíveis, a
inflação em 12 meses rompeu o teto de tolerância da meta. Em queda há
17 semanas, a mediana das expectativas de crescimento do PIB em 2014 já
não passa de mísero 0,3%. Com o saldo da balança comercial praticamente
zerado, o déficit em conta corrente deste ano deverá ser de mais de US$
80 bilhões, ou 3,5% do PIB. E, na esteira de um longo processo de perda
de credibilidade do registro das contas fiscais, o resultado primário do
setor público em 2014, extirpado de receitas e despesas não
recorrentes, deve ser inferior a 0,5% do PIB. Mesmo quem nunca nutriu
ilusões sobre o que esperar desse governo jamais imaginou que o desastre
pudesse atingir tais proporções.
O que é especialmente
desanimador é que não se vê, no discurso da presidente Dilma, o mais
tênue sinal de disposição para corrigir o rumo da política econômica, à
luz dos equívocos cometidos nos últimos anos. A impressão que se tem é
que a intenção da candidata à reeleição é dobrar a aposta e persistir
nos mesmos erros, na vã esperança de que o desempenho da economia no
segundo mandato acabe por lhe dar razão.
O que o Planalto
contemplava era poder conduzir a campanha da reeleição no mundo
encantado de João Santana, ao largo de qualquer discussão mais séria
sobre o desempenho da política econômica. Mas a rápida deterioração do
quadro econômico, as críticas dos demais candidatos e o assédio da mídia
vêm tornando essa estratégia cada vez mais difícil. E deixando claro
que a presidente não tem qualquer proposta articulada de reorientação da
política econômica, para fazer face às dificuldades que vêm sendo
enfrentadas.
É o que ficou evidente na entrevista concedida por
Dilma Rousseff no programa “Bom Dia Brasil”, da Rede Globo, que foi ao
ar na manhã de segunda-feira. Instada pelos entrevistadores a esclarecer
como pretende reverter o quadro de estagnação e inflação alta, caso
seja reeleita, a candidata gastou nada menos que oito minutos em uma
resposta repleta de evasivas, subterfúgios e rodeios, da qual pouco ou
nada se salva.
Na resposta, a presidente se aferra ao diagnóstico
turrão — e conveniente — de que não há nada de errado com sua política
econômica e que tudo decorre da crise econômica mundial. Como “a
situação do mundo está extremamente problemática”, o país “está na
defensiva em relação à crise internacional”, empenhado em “proteger
emprego, salário e investimento”. Não houve a mais leve menção ao fato
de que, não obstante esse suposto empenho, o investimento está em queda
há quatro trimestres.
Pressionada pelos entrevistadores a ser
mais específica, Dilma revela, afinal, que sua ideia é “apostar numa
retomada”. E apressa-se em esclarecer que “na retomada, você muda a sua
política econômica de defensiva para ofensiva” e que “eu posso, na
retomada, gastar menos para sustentar emprego, salário e investimento”.
Mas logo recua: “Só que investimento eu tenho de manter.” Se não, “eu
comprometo emprego e salário”.
“Então o que nós achamos?”, indaga
Dilma. “Nós achamos que a gente tem de ver como é que evolui a crise”,
pois, “se ela evoluir para uma situação um pouco melhor”, o país “pode
entrar em uma outra fase, que precisa menos estímulos”, “pode ficar mais
entregue à dinâmica natural da economia e pode, perfeitamente, passar
por uma retomada”.
Parece difícil de acreditar, mas não foi mais
do que isso que a candidata a presidente que, com folga, lidera as
pesquisas de intenção de voto no primeiro turno, tinha a dizer sobre
como pretende lidar com os sérios desafios de política econômica que o
país tem pela frente.
Se o leitor não teve oportunidade de ver a
entrevista, pode recorrer ao site do programa, onde estão disponíveis
tanto o vídeo como a transcrição. É imperdível.
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