Natalie Angier - NYT
Todo ano, os norte-americanos descartam cerca de 450 quilos de lixo por
cabeça --coisas como borra de café, embalagens de comida, papel de
bala, fraldas usadas, seringas vazias e bonequinhos feitos com meias
velhas que confiamos aos lixeiros e sobre as quais nunca mais pensamos.
Todas essas contribuições anuais aos aterros, de acordo com Richard Alley, professor do Instituto de Sistemas Ambientais e da Terra na Penn State, são um fiapo em comparação a outro tipo de lixo que produzimos: as 18,15 toneladas por ano de dióxido de carbono (CO2) que cada um de nós lança para a atmosfera.
Todas essas contribuições anuais aos aterros, de acordo com Richard Alley, professor do Instituto de Sistemas Ambientais e da Terra na Penn State, são um fiapo em comparação a outro tipo de lixo que produzimos: as 18,15 toneladas por ano de dióxido de carbono (CO2) que cada um de nós lança para a atmosfera.
Quando os cientistas falam sobre a pegada de carbono e os gases de
efeito estufa que estão por trás das mudanças climáticas, eles se
referem principalmente ao dióxido de carbono, um gás composto por uma
parte de carbono e duas partes de oxigênio e que é extremamente
eficiente para manter o calor do sol perto de nós. Por mais
familiaridade que tenham com a física e a química da produção e do
consumo de energia, os pesquisadores ainda se surpreendem com a
velocidade e a escala com as quais estamos extraindo carbono da terra,
sob a forma da matéria orgânica de plâncton e plantas há muito tempo
enterrados e lentamente cozidos, que chamamos de combustíveis fósseis, e
queimando-os e soltando-os no ar como dióxido de carbono.
Um carro norte-americano típico, diz Alley, expele 450 gramas de dióxido de carbono pelo escapamento a cada milha percorrida (1,6 quilômetro). Uma usina norte-americana típica que queima carvão para gerar a eletricidade que ilumina sua casa, seu computador e sua escova de dentes elétrica libera mais de 9.000 toneladas de dióxido de carbono no céu a cada dia, diz Donald J. Wuebbles, professor de ciências atmosféricas na Universidade de Illinois.
Além disso, quando você pega sua bagagem depois de um voo de Chicago a Salt Lake City, também poderia carregar os 900 quilos que são a sua parte no CO2 expelido no trajeto pela queima do combustível do avião. Mas, então, já é tarde demais. As moléculas flutuantes, sem cheiro e sem cor, do dióxido de carbono já se dispersaram ao seu redor, onde o vento e as correntes as misturarão em maior ou menor proporção com os gases nitrogênio e oxigênio que compõem a maior parte da nossa atmosfera, onde as moléculas fortes de CO2 permanecerão, em média, por mil anos.
Os pesquisadores enfatizam a importância de entender o caráter essencial do dióxido de carbono e gases de efeito estufa relacionados a ele, e o papel fundamental que eles vêm desempenhando em transformar nosso planeta no esconderijo da Cachinhos Dourados, até a morte. Mas, da mesma forma que uma pitada de sal pode ressaltar o sabor na comida e um punhado pode arruiná-la, o excesso de CO2 pode transformar nosso mundo em um cozido horroroso.
Quarto elemento mais abundante no universo (depois de hidrogênio, hélio e oxigênio), o carbono é um átomo versátil, capaz de se curvar, dobrar-se e se ligar com uma série de outros átomos. Todos os organismos vivos contêm carbono e funcionam com algum tipo de combustível baseado em carbono, como açúcares e carboidratos.
A química orgânica é a química do carbono. Tire a água do corpo humano e metade do peso seco que resta é carbono. O carbono também forma as rochas, e a maior parte do quociente de carbono da terra está preso, sem poder ser extraído, no calcário e outras rochas.
E antes que a vida começasse a empregar o carbono para o uso estrutural e energético, o carbono cooperou para torná-la possível. A atmosfera que cobre a Terra a uma altitude de 80,5 quilômetros deve muito a ele, e ela não seria uma cobertura muito eficiente sem uma pitada de dióxido de carbono. Cerca de 78% da atmosfera seca consiste de gás de nitrogênio, ou N2; a molécula dupla de oxigênio que respiramos corresponde a 21%; o gás argônio, gás nobre resultante da decomposição radioativa na crosta terrestre, responde por quase 1%. Nos 1% restantes, encontramos nossos gases de efeito estufa, principalmente o CO2.
De fato, quando a luz solar atinge a Terra e o planeta devolve essa energia solar em forma de radiação infravermelha, ou calor, as moléculas dominantes da atmosfera essencialmente dão de ombros, com indiferença: as ondas infravermelhas que sobem podem passar por elas e ir direto para o espaço sem nenhum problema. É necessário um personagem atomicamente mais complexo como uma molécula de dióxido de carbono para impedir que o calor passe.
"É como um buraco na estrada", disse Alley. "Se ele tem três centímetros de diâmetro, você não percebe. Se ele tem um quilômetro de diâmetro, é um vale, e você o atravessa. Mas se ele tiver o tamanho certo, digamos, meio metro de diâmetro, você cai dentro." O dióxido de carbono, diz ele, "é um buraco para a radiação infravermelha que sai da terra".
No início da formação da Terra, os vulcões injetaram plumas de dióxido de carbono e metano na atmosfera, e também foi uma coisa boa. "Se não tivéssemos gases de efeito estufa, o planeta seria uma bola de neve congelada", diz Wuebbles.
Com o advento da fotossíntese, as algas e as plantas começaram a capturar dióxido de carbono do ar e a transformá-lo em açúcar e outros combustíveis --e assim começou a cadeia alimentar. Ainda hoje, as plantas têm uma influência considerável sobre as concentrações de dióxido de carbono. No hemisfério norte, com sua massa comparativamente maior de terra, as concentrações do gás caem durante o verão, à medida que as plantas fotossintetizam bem mais, e então aumentam novamente quando as folhas verdes apodrecem, colocando o CO2 de volta em circulação.
No geral, o ciclo do carbono na vida gira rápido. As plantas absorvem dióxido de carbono para produzir açúcares (e nos dão oxigênio na troca). Os animais comem os açúcares e liberam dióxido de carbono a cada expiração. Mas, como explicou David Archer, da Universidade de Chicago, em uma série de aulas gravadas em vídeo, "em condições especiais, o carbono orgânico pode ser isolado ao ser enterrado na lama no fundo do oceano ou em um pântano".
Você provavelmente não vai querer comer esse doce pré-histórico, mas as cadeias de carbono sequestradas ainda oferecem energia para queimar. O carvão é a matéria ancestral de árvores e plantas: massas de raízes, folhas, ramos, troncos que afundaram no leito de pântanos anóxicos e formaram a turfa, que mais tarde foi "cozida" e se transformou em carvão, o tipo de combustível fóssil mais abundante. O petróleo foi formado pelo plâncton preservado nos sedimentos do oceano. O gás natural pode surgir do carvão da turfa ou do óleo do plâncton, desde que a temperatura seja alta o bastante. O petróleo tem mais energia por átomo de carbono do que o carvão, e o gás natural tem mais energia ainda, mas todos os combustíveis fósseis liberam CO2 quando consumidos, da mesma forma que liberariam se [as plantas ou o plâncton] tivessem sido comidos por dinossauros muito tempo atrás.
O que preocupa os pesquisadores é o ritmo vertiginoso com o qual os seres humanos estão desenterrando reservas de carbono que levaram dezenas de milhões de anos para serem produzidas e jogando seus produtos finais gasosos de volta à atmosfera em apenas um punhado de décadas. Durante toda a história, sempre que os vulcões ou outras erupções semelhantes arremessavam novas massas de gases de efeito estufa vindos das entranhas da Terra, ecossistemas inteiros eram severamente alterados e as taxas de extinção cresciam. E esses picos naturais de dióxido de carbono eram longos, em comparação ao ritmo da mudança que os cientistas dizem que está acontecendo hoje.
Pieter Tans, do Laboratório de Pesquisa de Sistemas da Terra na Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA, diz que reduzir os combustíveis fósseis é uma "tarefa monumental", mas que fazer isso ofereceria benefícios econômicos bem como ecológicos. E, ele acrescentou, há muitas "frutas ao alcance da mão" para serem colhidas; se os norte-americanos trocarem seus carros por outros que sejam duas vezes mais eficientes em termos de consumo de combustível do que a frota atual, diz ele, só isso cortará as emissões do país em cerca de 16%.
Ou peguem o trem ou usem a bicicleta. Instalem vidros de proteção térmica. Usem um rastelo em vez de uma máquina de soprar folhas. Mantenham o planeta da Cachinhos Dourados seguro para os pássaros, abelhas e ursos.
Tradutor: Eloise De Vylder
Um carro norte-americano típico, diz Alley, expele 450 gramas de dióxido de carbono pelo escapamento a cada milha percorrida (1,6 quilômetro). Uma usina norte-americana típica que queima carvão para gerar a eletricidade que ilumina sua casa, seu computador e sua escova de dentes elétrica libera mais de 9.000 toneladas de dióxido de carbono no céu a cada dia, diz Donald J. Wuebbles, professor de ciências atmosféricas na Universidade de Illinois.
Além disso, quando você pega sua bagagem depois de um voo de Chicago a Salt Lake City, também poderia carregar os 900 quilos que são a sua parte no CO2 expelido no trajeto pela queima do combustível do avião. Mas, então, já é tarde demais. As moléculas flutuantes, sem cheiro e sem cor, do dióxido de carbono já se dispersaram ao seu redor, onde o vento e as correntes as misturarão em maior ou menor proporção com os gases nitrogênio e oxigênio que compõem a maior parte da nossa atmosfera, onde as moléculas fortes de CO2 permanecerão, em média, por mil anos.
Os pesquisadores enfatizam a importância de entender o caráter essencial do dióxido de carbono e gases de efeito estufa relacionados a ele, e o papel fundamental que eles vêm desempenhando em transformar nosso planeta no esconderijo da Cachinhos Dourados, até a morte. Mas, da mesma forma que uma pitada de sal pode ressaltar o sabor na comida e um punhado pode arruiná-la, o excesso de CO2 pode transformar nosso mundo em um cozido horroroso.
Quarto elemento mais abundante no universo (depois de hidrogênio, hélio e oxigênio), o carbono é um átomo versátil, capaz de se curvar, dobrar-se e se ligar com uma série de outros átomos. Todos os organismos vivos contêm carbono e funcionam com algum tipo de combustível baseado em carbono, como açúcares e carboidratos.
A química orgânica é a química do carbono. Tire a água do corpo humano e metade do peso seco que resta é carbono. O carbono também forma as rochas, e a maior parte do quociente de carbono da terra está preso, sem poder ser extraído, no calcário e outras rochas.
E antes que a vida começasse a empregar o carbono para o uso estrutural e energético, o carbono cooperou para torná-la possível. A atmosfera que cobre a Terra a uma altitude de 80,5 quilômetros deve muito a ele, e ela não seria uma cobertura muito eficiente sem uma pitada de dióxido de carbono. Cerca de 78% da atmosfera seca consiste de gás de nitrogênio, ou N2; a molécula dupla de oxigênio que respiramos corresponde a 21%; o gás argônio, gás nobre resultante da decomposição radioativa na crosta terrestre, responde por quase 1%. Nos 1% restantes, encontramos nossos gases de efeito estufa, principalmente o CO2.
De fato, quando a luz solar atinge a Terra e o planeta devolve essa energia solar em forma de radiação infravermelha, ou calor, as moléculas dominantes da atmosfera essencialmente dão de ombros, com indiferença: as ondas infravermelhas que sobem podem passar por elas e ir direto para o espaço sem nenhum problema. É necessário um personagem atomicamente mais complexo como uma molécula de dióxido de carbono para impedir que o calor passe.
"É como um buraco na estrada", disse Alley. "Se ele tem três centímetros de diâmetro, você não percebe. Se ele tem um quilômetro de diâmetro, é um vale, e você o atravessa. Mas se ele tiver o tamanho certo, digamos, meio metro de diâmetro, você cai dentro." O dióxido de carbono, diz ele, "é um buraco para a radiação infravermelha que sai da terra".
No início da formação da Terra, os vulcões injetaram plumas de dióxido de carbono e metano na atmosfera, e também foi uma coisa boa. "Se não tivéssemos gases de efeito estufa, o planeta seria uma bola de neve congelada", diz Wuebbles.
Com o advento da fotossíntese, as algas e as plantas começaram a capturar dióxido de carbono do ar e a transformá-lo em açúcar e outros combustíveis --e assim começou a cadeia alimentar. Ainda hoje, as plantas têm uma influência considerável sobre as concentrações de dióxido de carbono. No hemisfério norte, com sua massa comparativamente maior de terra, as concentrações do gás caem durante o verão, à medida que as plantas fotossintetizam bem mais, e então aumentam novamente quando as folhas verdes apodrecem, colocando o CO2 de volta em circulação.
No geral, o ciclo do carbono na vida gira rápido. As plantas absorvem dióxido de carbono para produzir açúcares (e nos dão oxigênio na troca). Os animais comem os açúcares e liberam dióxido de carbono a cada expiração. Mas, como explicou David Archer, da Universidade de Chicago, em uma série de aulas gravadas em vídeo, "em condições especiais, o carbono orgânico pode ser isolado ao ser enterrado na lama no fundo do oceano ou em um pântano".
Você provavelmente não vai querer comer esse doce pré-histórico, mas as cadeias de carbono sequestradas ainda oferecem energia para queimar. O carvão é a matéria ancestral de árvores e plantas: massas de raízes, folhas, ramos, troncos que afundaram no leito de pântanos anóxicos e formaram a turfa, que mais tarde foi "cozida" e se transformou em carvão, o tipo de combustível fóssil mais abundante. O petróleo foi formado pelo plâncton preservado nos sedimentos do oceano. O gás natural pode surgir do carvão da turfa ou do óleo do plâncton, desde que a temperatura seja alta o bastante. O petróleo tem mais energia por átomo de carbono do que o carvão, e o gás natural tem mais energia ainda, mas todos os combustíveis fósseis liberam CO2 quando consumidos, da mesma forma que liberariam se [as plantas ou o plâncton] tivessem sido comidos por dinossauros muito tempo atrás.
O que preocupa os pesquisadores é o ritmo vertiginoso com o qual os seres humanos estão desenterrando reservas de carbono que levaram dezenas de milhões de anos para serem produzidas e jogando seus produtos finais gasosos de volta à atmosfera em apenas um punhado de décadas. Durante toda a história, sempre que os vulcões ou outras erupções semelhantes arremessavam novas massas de gases de efeito estufa vindos das entranhas da Terra, ecossistemas inteiros eram severamente alterados e as taxas de extinção cresciam. E esses picos naturais de dióxido de carbono eram longos, em comparação ao ritmo da mudança que os cientistas dizem que está acontecendo hoje.
Pieter Tans, do Laboratório de Pesquisa de Sistemas da Terra na Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA, diz que reduzir os combustíveis fósseis é uma "tarefa monumental", mas que fazer isso ofereceria benefícios econômicos bem como ecológicos. E, ele acrescentou, há muitas "frutas ao alcance da mão" para serem colhidas; se os norte-americanos trocarem seus carros por outros que sejam duas vezes mais eficientes em termos de consumo de combustível do que a frota atual, diz ele, só isso cortará as emissões do país em cerca de 16%.
Ou peguem o trem ou usem a bicicleta. Instalem vidros de proteção térmica. Usem um rastelo em vez de uma máquina de soprar folhas. Mantenham o planeta da Cachinhos Dourados seguro para os pássaros, abelhas e ursos.
Tradutor: Eloise De Vylder
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