A dependência do Bolsa Família
O Estado de S.Paulo
A mais recente Síntese de Indicadores Sociais
do IBGE mostra que os brasileiros mais pobres dependem cada vez mais
dos programas de transferência de renda. Com uma década de existência, o
Bolsa Família representa hoje a maior parte dos ganhos de uma parcela
significativa da população. O programa - que deveria ser temporário e
servir apenas como forma de auxiliar os beneficiários em sua luta para
sair da miséria - consolidou-se como a base da sobrevivência dessas
famílias, pois a renda do trabalho, quando existe, é insuficiente, e não
há perspectivas de que essa situação mude num futuro previsível. Esses
brasileiros se tornaram, portanto, clientes permanentes de favores do
Estado.
Segundo o estudo divulgado pelo IBGE, a
participação da renda do trabalho no orçamento das famílias mais pobres -
com renda per capita de até um quarto de salário mínimo - caiu de 73,6%
em 2004 para 57% em 2013. Já a participação de "outras fontes" - que,
no caso das famílias mais pobres se limita ao Bolsa Família e a outros
programas de transferência de renda - subiu de 20,3% para 37,5%, contra
uma média nacional de 18,3%. No Nordeste, esse porcentual chega a 43,8%;
no Piauí, atinge 53,2%.
Os responsáveis pela pesquisa
concluíram que o orçamento dessas famílias passou a ser determinado por
essa renda oferecida pelo governo, embora a maior parte dessas pessoas
continue a ter alguma renda proveniente do trabalho.
"Essas
famílias têm uma característica de inserção precária no mercado de
trabalho", disse Barbara Cobo, coordenadora do levantamento. "Elas
entram e saem do mercado de trabalho o tempo todo. Com a transferência
de renda governamental, elas passam a contar com uma renda
complementar", explicou Barbara, salientando que o Bolsa Família é uma
garantia de que o beneficiário terá alguma renda mesmo desempregado e
pode recusar trabalho degradante.
A importância do Bolsa
Família em um país desigual como o Brasil é evidente. O problema,
conforme a pesquisa do IBGE mostra, é que o programa se tornou central, e
não mais auxiliar, para seus beneficiários. E isso acontece porque não
há "porta de saída".
Os números mostram que a pobreza
diminuiu nos últimos anos. A mesma síntese do IBGE indica que a
participação dos 10% mais ricos na renda do País recuou de 45,8% em 2004
para 41,7% em 2013. Já a participação dos 40% mais pobres cresceu de
9,4% para 11,6% no período. Enquanto isso, o Índice de Gini, que vai de 0
a 1, no qual zero representa menor desigualdade social, caiu de 0,555
para 0,501 entre 2004 e 2013.
No entanto, é importante
sublinhar que essa queda da desigualdade se deu em um contexto econômico
bem diverso do atual. Entre 2004 e 2011, o PIB do País cresceu em média
4,3% ao ano, graças principalmente ao aumento global do consumo de
commodities vendidas pelo Brasil. Não é mera coincidência que o Índice
de Gini tenha caído de forma mais acelerada (de 0,555 para 0,506)
justamente naquele período.
Mas essa mudança socioeconômica
só chegaria a bom termo se o País continuasse a crescer e se,
principalmente, estivesse lastreada em pesados investimentos no setor
produtivo e na melhoria da educação e da saúde justamente daqueles que
hoje mais precisam do Bolsa Família. Os governos lulopetistas, no
entanto, preferiam o caminho fácil da expansão do crédito e do estímulo
ao consumo - como se a capacidade de pagar prestações fosse suficiente
para definir a condição social dos cidadãos e como se essa fórmula
econômica gerasse impulso suficiente para o crescimento sustentável do
País.
Diante do estado vegetativo da economia sob o governo
de Dilma Rousseff, é improvável que a tendência apontada pela pesquisa
do IBGE se altere nos próximos tempos. Isso significa que os brasileiros
mais pobres continuarão fortemente dependentes do Bolsa Família e, como
mostraram as últimas eleições, traduzirão sua gratidão em votos
naqueles que lhes concedem esse imenso favor - perpetuando assim uma
relação clientelista que nada tem a ver com distribuição de renda.
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