Em torno de um líder invisível, poder do Taleban passa por mudanças
Matthew Rosenberg - NYT
Reprodução
Mohammad Omar, líder do Taleban
Se o líder recluso do Taleban, o mulá Mohammad Omar, quisesse se afirmar mais publicamente, este seria o ano de fazê-lo. Em uma temporada de imensa agitação no mundo jihadista, o Taleban ganhou terreno em novas ofensivas afegãs, resistiu a uma sangrenta disputa interna de poder e teve que lidar com a ascensão do grupo militante Estado Islâmico como rival ideológico.
Além disso, apesar de ter permanecido completamente fora do olhar público desde que fugiu dos ataques aéreos americanos no final de 2001, sua reclusão se tornou ainda mais pronunciada no último ano. Agora, todos os líderes do Taleban que tinham acesso direto a Omar, com exceção de dois, foram cortados, segundo importantes figuras do Taleban e autoridades afegãs e ocidentais, todas as quais dizem que uma mudança significativa de poder está em andamento.
"Eu não vejo o mulá Omar há muito tempo", disse Maulvi Najibullah, um alto comandante militar taleban, em uma entrevista por telefone de Peshawar, no norte do Paquistão.
A invisibilidade de Omar é acentuada pelo papel visível de Abu Bakr al-Baghdadi, o líder do Estado Islâmico, reforçando o papel cada vez mais secundário do Taleban no mundo dos militantes islâmicos, disseram autoridades afegãs e ocidentais.
Logo, será que a influência do mulá esquivo está diminuindo?
Importantes insurgentes que faziam objeção à reclusão de Omar foram marginalizados --ou pior, disseram insurgentes e autoridades. Acredita-se que um líder taleban, o mulá Abdul Raqib Takhari, tenha sido morto em fevereiro, após dizer furiosamente aos seus compatriotas que passaria a tomar decisões por conta própria se não lhe fosse concedida uma audiência com Omar, disseram autoridades afegãs e europeias.
Os rachas aparentes na estrutura de comando do Taleban são vistos como uma oportunidade por alguns, particularmente dentro do novo governo afegão do presidente Ashraf Ghani. As autoridades afegãs dizem que a revolta representa uma chance de ressuscitar os esforços de paz, talvez ao separar os líderes insurgentes desencantados em vez de realizar uma grande barganha com todo o grupo, que até o momento provou ser um esforço inútil.
Ávido por explorar qualquer fraqueza potencial do Taleban, o Diretório Nacional de Segurança, a agência de inteligência afegã, sugeriu em uma coletiva de imprensa em outubro a possibilidade de Omar estar morto.
Em uma entrevista separada, Rahmatullah Nabil, o chefe em exercício da inteligência afegã, disse não saber ao certo "se Omar está vivo ou morto. É difícil dizer a esta altura".
Mas o Taleban negou rapidamente que seu líder estava morto. E outras autoridades afegãs, juntamente com alguns de seus pares europeus e americanos, disseram que as sugestões de que Omar estava morto eram um truque de propaganda visando enfraquecer o moral dos talebans, não um reflexo do que pensa de fato o governo afegão.
"Há um consenso entre todas as três braços das forças de segurança afegãs que o mulá Omar está vivo", disse uma autoridade europeia, que falou sob a condição de anonimato para discutir os informes confidenciais de inteligência. "Elas não apenas pensam que ele está vivo, como dizem saber onde exatamente ele está em Karachi", a metrópole paquistanesa onde alguns dizem que Omar está escondido.
Omar sempre funcionou mais como o líder espiritual e ideológico do movimento do que como comandante operacional. Seu círculo interno, composto de mulás locais que se conhecem há décadas, forneceu a liderança ativa de muitas facções locais do Taleban.
Mas agora um homem, o mulá Akhtar Muhammad Mansour, ascendeu ao papel de Nº 2 e se tornou a principal ligação com Omar, o que lhe permite posicionar seus seguidores leais nas fileiras, segundo Nabil.
Nabil disse que, em um exemplo, um comandante proeminente que atuava ao sul de Cabul foi morto por outros talebans em maio ou junho, por ser próximo de um rival do mulá Mansour.
Em sua avaliação, Nabil considera as mudanças sendo impulsionadas pelo establishment de segurança do Paquistão, uma conclusão compartilhada por algumas autoridades ocidentais. Algumas disseram ser uma tentativa de conseguir maior controle sobre a insurreição, outras como uma evolução do antigo esforço paquistanês de evitar o embaraço da descoberta de Omar sendo abrigado em seu país.
"Há dúvida sobre se ele está vivo ou não", disse Nabil. Mas "nós estamos mais confiantes de que ele está em Karachi".
O governo afegão não é o único tentando explorar a confusão de liderança dentro do Taleban. Autoridades afegãs e ocidentais disseram que o Estado Islâmico, recém-saído de seus sucessos nos campos de batalha na Síria e no Iraque, está cada vez mais tentando espalhar sua influência além do mundo árabe, para atrair centenas de milhões de muçulmanos nas regiões sul e central da Ásia.
Talvez sentindo o aumento da rivalidade, acredita-se que o Taleban afegão, supostamente com a bênção de Omar, tenha enviado dois emissários em meados do ano até o Estado Islâmico, para ver como os militantes poderiam trabalhar juntos, disseram autoridades afegãs e ocidentais.
Os emissários do Taleban levaram uma mensagem simples: Osama Bin Laden respeitava Omar, de modo que Al-Baghdadi deveria fazer o mesmo, disse Nabil, o chefe da espionagem afegã.
O Estado Islâmico tinha uma visão diferente: Al-Baghdadi se declarou califa --o líder de todos os muçulmanos. Para o grupo, isso significa que ele está acima de Omar, que se declarou apenas emir nos anos 90, quando o Taleban conquistou o Afeganistão.
O Estado Islâmico já desfruta de alguns sucessos no Sul da Ásia, obtendo juras públicas de cooperação de algumas poucas facções do Taleban paquistanês, uma divisão turbulenta do grupo que nasceu do movimento afegão. Alguns poucos comandantes talebans afegãos menores em cantos remotos também expressaram seu apoio.
Há sinais, entretanto, de que o Estado Islâmico está tentando cultivar comandantes talebans mais importantes. Uma autoridade europeia disse que nos últimos dois meses um número crescente de militantes árabes começou a percorrer os vales remotos do leste do Afeganistão à procura de novos simpatizantes, trabalhando nas mesmas áreas que forneceram abrigo aos remanescentes da Al-Qaeda e outros grupos militantes estrangeiros com ambições globais.
Apesar de o Estado Islâmico parecer ter conseguido sucesso apenas limitado até o momento --os afegãos tendem a suspeitar de estrangeiros-- muitos entre a liderança do Taleban estariam consternados com o crescente perfil internacional do Estado Islâmico.
De todos os líderes das grandes insurreições do mundo, Omar é o menos documentado. Sua data de nascimento é apenas um palpite, entre 1959 e 1962.
Os relatos variam sobre se ele nasceu na província de Oruzgan ou de Kandahar, no sul do Afeganistão. Há apenas duas supostas fotos dele --uma que o Departamento de Estado diz ser realmente ele, e outra que algumas autoridades dizem não ser.
Um ex-comandante militar americano, que falou sob a condição de anonimato por razões operacionais, disse nunca ter visto Omar como um adversário militar direto da mesma forma que Ho Chi Minh no Vietnã, porque "nunca tivemos qualquer inteligência crível sobre seu paradeiro ou sobre se estava realmente no comando".
Apesar das autoridades terem decidido optar por acreditar que Omar ainda está vivo, é improvável que alguém, exceto aqueles mais próximos dele, saberia se ele morresse.
"Eu não sei se ele está vivo ou morto", disse Maulvi Najibullah, o comandante militar taleban em Peshawar.
Zabihullah Mujahid, o porta-voz do Taleban, creditou a sobrevivência de Omar à sua reclusão, alegando que Osama Bin Laden foi encontrado por causa de seus mensageiros indo e vindo com vídeos e cartas.
"Nós estamos tentando eliminar qualquer oportunidade possível que possa ajudar nossos inimigos a encontrar nosso líder", disse Mujahid.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
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