Arábia Saudita adota mil chicotadas para calar a crítica
Ángeles Espinosa - El País
Reprodução/Facebook
Raef Badawi foi condenado na Arábia Saudita a
mil chicotadas por "desrespeitar o Islã" ao defender a liberdade de
expressão em um portal na internet
Ensaf Haidar treme diante da mera perspectiva das mil chicotadas que aguardam seu marido, Raef Badawi, condenado na Arábia Saudita por "desrespeitar o Islã". Seu crime foi defender a liberdade de expressão e ter fundado um portal na internet onde se podia discutir religião. O brutal castigo, que será executado em lotes de 50 chicotadas aplicadas em sextas-feiras sucessivas e que se soma a dez anos de privação da liberdade, busca dissuadir outros ativistas dos direitos civis no Reino do Deserto. Como nas demais monarquias da península Arábica, o temor de que a menor abertura solape seu poder absoluto se exacerbou desde a Primavera Árabe.
"Em outros países se denuncia a redução do espaço para a sociedade
civil; nesta parte do mundo não há espaço para reduzir", lamenta Khalid
Ibrahim, codiretor da GCHR (Gulf Center for Human Rights). "Os
defensores dos direitos humanos são tratados como criminosos, não
conseguem encontrar trabalho e não têm permissão para se organizar. De
Omã, onde um ativista foi detido e não sabemos onde está, à Arábia
Saudita, onde prendem qualquer um que discorde, passando pelos Emirados,
que não toleram a crítica, e Bahrein, onde continuam os protestos, a
situação é muito ruim", resume em uma conversa por telefone.Ensaf Haidar treme diante da mera perspectiva das mil chicotadas que aguardam seu marido, Raef Badawi, condenado na Arábia Saudita por "desrespeitar o Islã". Seu crime foi defender a liberdade de expressão e ter fundado um portal na internet onde se podia discutir religião. O brutal castigo, que será executado em lotes de 50 chicotadas aplicadas em sextas-feiras sucessivas e que se soma a dez anos de privação da liberdade, busca dissuadir outros ativistas dos direitos civis no Reino do Deserto. Como nas demais monarquias da península Arábica, o temor de que a menor abertura solape seu poder absoluto se exacerbou desde a Primavera Árabe.
"Raef não é um criminoso. Não é um assassino ou um violador. É um blogueiro. Seu único delito é ser uma voz livre em um país que não tolera nem entende a liberdade", repete a citada Haidar, que, depois da detenção de seu marido em 2012, exilou-se com seus três filhos no Canadá.
O saudita Badawi, 30, recebeu em novembro passado o prêmio Liberdade de Imprensa da Repórteres Sem Fronteiras por seu trabalho para promover a liberdade de informação. Além disso, a organização, cujo capítulo espanhol apadrinha o blogueiro, pediu ao rei Abdallah que perdoe as chicotadas e o liberte. A Arábia Saudita, que a Repórteres Sem Fronteiras situa no fim de sua classificação mundial de liberdade de imprensa, aprovou este ano uma lei draconiana que considera terrorismo os crimes de opinião.
"O controle oficial dos meios de comunicação tradicionais fez os ativistas recorrerem às redes sociais, e os governos responderam com leis antiterroristas e contra os crimes cibernéticos", denuncia Ibrahim. "Estão utilizando o Poder Judiciário como instrumento político contra os que defendem a liberdade de expressão", acrescenta.
Na opinião desse ativista, "a situação piorou muito no último ano; não só mais defensores foram presos, como se generalizou a proibição de viajar para aqueles que ainda não foram julgados e às vezes nem sequer acusados formalmente".
É o caso de Samar Badawi, irmã de Raef e mulher de Walid Abualkhair, um destacado advogado de direitos humanos e prisioneiro de consciência saudita, condenado a 15 anos por "prejudicar a reputação do reino" e "incitar a opinião pública". Badawi, que fazia uma campanha internacional pela libertação de seu marido e outros ativistas, viu negada sua saída do país no início de dezembro, quando viajaria a Bruxelas para participar de um fórum da UE.
"Ainda não me explicaram o motivo", responde por mensagem eletrônica. No entanto, sua mobilização parece ter surtido efeito. "Walid está melhor agora e o estão tratando bem", indica a ativista, que em 2012 recebeu o prêmio Mulheres de Coragem, concedido pelo Departamento de Estado americano pelas mãos de Hillary Clinton e da primeira-dama Michelle Obama. Para ela, "o problema mais agudo na Arábia Saudita é que se silenciam as vozes dos que pedem reformas".
"As revoltas árabes animaram os defensores dos direitos humanos nos países do Golfo a pedir que as liberdades e os direitos civis sejam respeitados, mas quando os governantes viram a queda de Ben Ali e de Mubarak decidiram agir de forma preventiva. Os que não estão na prisão esperam julgamento ou fugiram de seu país", resume Ibrahim. "Os governos da região estão usando todos os instrumentos em suas mãos para evitar as mínimas concessões aos cidadãos", conclui.
Pena de morte por comentar na web
Apesar das diferenças e rivalidades políticas, do outro lado do golfo Pérsico, no Irã, a situação dos direitos humanos também é preocupante. O Tribunal Supremo confirmou há um mês a pena de morte a Soheil Arabi, 30, devido a comentários escritos em sua página no Facebook que um juiz considerou um "insulto ao profeta", referindo-se a Maomé. Continua-se a executar pessoas que eram menores quando cometeram os crimes, e as organizações de direitos denunciam a falta de garantias processuais.A chegada à presidência de Hasan Rohani, em 2013, representou alguma melhora, mas os ativistas temem que as negociações nucleares eclipsem suas demandas.
"Vimos uma melhora na liberdade de expressão, mas a situação dos ativistas políticos e dos direitos civis quase não mudou; ainda restam muitos presos políticos detidos", resume por telefone de Teerã a advogada e defensora dos direitos humanos Nasrin Sotudeh, libertada no ano passado, mas que continua proibida de exercer a advocacia.
Por isso, todos os dias ela se senta diante do Colégio de Advogados para reclamar seu direito. "[As autoridades] também permitiram manifestações. Apesar de que na última, em protesto contra os ataques com ácido contra mulheres, detiveram alguns participantes e Mahdieh Golru [uma jovem ativista] ainda não foi libertada. Outro indicador é o número de executados, que aumentou nos últimos 18 meses", acrescenta.
Para ela, o principal problema é que "não libertaram certos advogados [membros do Centro de Defensores dos Direitos Humanos, fundado pela prêmio Nobel da paz Shirin Ebadi], como Abdolfattah Soltani". Salienta também que "as ativistas dos direitos da mulher sofrem muitas pressões e limitações".
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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