Ninho de escândalos
O Estado de S.Paulo
Não é novidade que uma excessiva proximidade
entre empresas e governo gera uma relação promíscua entre ambos, com
graves danos ao interesse público. No entanto, esses graves danos
receberam recentemente contornos mais nítidos. Os fatos relativos à
atuação pouco decorosa entre diretores da Petrobrás, executivos de
empreiteiras e dirigentes de partidos políticos ajudam a dar uma
dimensão mais acurada do mal que causa ao País essas relações antiéticas
e, sobretudo, ilegais. Diante de tanta corrupção - desprezo pelo bem
público e apreço pelo privado, seja ele pessoal ou partidário -, não é
hora de desperdiçar nenhuma medida que possa contribuir para melhorar o
ambiente institucional.
Uma das medidas
moralizadoras que o País tem em mãos para diminuir esse mal é a
proibição do financiamento de partidos políticos por pessoas jurídicas.
Sobre o tema há uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), proposta
pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), na qual se pede o
reconhecimento da inconstitucionalidade desse tipo de contribuição aos
partidos políticos. A ação se baseia no fato de que o financiamento por
pessoas jurídicas viola o preceito constitucional da igualdade, pois os
financiadores ganham peso maior nos negócios do Estado. A maioria dos
ministros do STF já votou em sentido favorável ao pedido da OAB,
aprovando a derrubada do financiamento por pessoas jurídicas. O
processo, no momento, está parado, em razão de um pedido de vistas feito
pelo ministro Gilmar Mendes.
Em entrevista ao Estado, um
dos autores da ação no Supremo Tribunal Federal, o procurador regional
da República Daniel Sarmento, comentou que "a representação se baseou em
duas ideias. A primeira é a de que a democracia pressupõe que os
cidadãos tenham igualdade na influência sobre decisões do Estado. O
nosso sistema é o contrário disso". Como já se afirmou neste espaço, em
editorial, "as empresas não têm direito a voto". E as suas contribuições
para as campanhas influenciam o voto de quem detém o direito a ele - o
cidadão. Permitir que empresas façam doações às campanhas eleitorais é
atribuir-lhes um protagonismo político a que elas não têm direito.
O
segundo motivo que fundamenta a ação no STF - e que vem ganhando
relevância a cada novo episódio do petrolão - é a moralidade pública.
"Há preocupação também com o princípio republicano que tem a ver com
corrupção", afirmou Sarmento. "Essa corrupção é crime, mas também é
corrupção em outro sentido, o de corromper a lógica do sistema político
que começa a ser a do atendimento de financiadores. Mesmo quando isso
eventualmente não envolva crime", esclareceu o procurador da República.
A
história do PT no poder, que vem sendo mais bem contada a cada dia,
mostra como um partido pode ir corrompendo as relações institucionais,
transformando-as em ocasiões para barganhas, negociatas, propinas.
Depois de anos enviesando o funcionamento do Estado e das estatais nesse
triste rumo, não é fácil de restituir às relações institucionais o seu
sentido original. Para voltar a aprumá-las é necessário um sério empenho
e, por essa razão, seria um equívoco desperdiçar as possíveis medidas
disponíveis para moralizar o ambiente político, entre elas - e de fácil
acesso - está a proibição do financiamento político pelas pessoas
jurídicas.
O fim desse tipo de financiamento não
significará, como às vezes erroneamente se repete, um estímulo ao
financiamento ilegal. Sarmento considera que "vai se reduzir
significativamente o valor oficial das campanhas. Então, isso vai tornar
muito mais perceptível o abuso. A política brasileira funcionará
perfeitamente bem sem ter de aumentar os gastos públicos com ela. Com os
recursos que já são gastos com Fundo Partidário, verbas públicas, o
direito de antena que os partidos têm, mais a doação de pessoas
físicas". Não há fantasmas a serem temidos.
"Um dos ninhos
de onde provém boa parte dos escândalos é o financiamento de campanha",
afirmou Sarmento. Não é pouca coisa descobrir onde se originam os males.
Agora cabe ao STF aproveitar essa oportunidade para, cumprindo o seu
papel institucional, pôr fim a esse ninho de escândalos.
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