CPMF serve para adiar reformas imprescindíveis
Dilma traça na ONU panorama róseo da
economia, enquanto fica cada vez mais evidente que imposto serve para
governo não fazer os devidos cortes nos gastos
O Globo
Como reza a tradição, a presidente do Brasil fez ontem o
pronunciamento de abertura de mais uma Assembleia Geral nas Nações
Unidas, a 70ª. Também, como de praxe, não faltaram menções otimistas ao
momento que o Brasil passa e às perspectivas para o país.
O cenário econômico visto pela presidente Dilma Rousseff da tribuna
da ONU guarda razoável distância da realidade. No diagnóstico da grave
crise fiscal, a presidente insistiu em responsabilizar pelas
turbulências a crise mundial iniciada em 2008. Trata-se de meia verdade,
porque o governo não deixou de ser alertado para o risco de o seu
programa voluntarista de aumento dos gastos públicos criar a crise que
afinal gerou.
A
crise externa não pode ser responsabilizada pelos problemas fiscais,
mas sim a forma equivocada e desmedida com que ela foi enfrentada, por
meio do tal “novo marco macroeconômico”, acompanhado de um arsenal de
ilusionismo estatístico, a tal da “contabilidade criativa”.
Ainda da tribuna da ONU, Dilma se referiu a “uma forte redução de
nossas despesas, do gasto de custeio e até de parte do investimento.”
Informação incompleta: faltou dizer que, na verdade, a viga mestra do
ajuste é a recriação da CPMF, o “imposto do cheque”, gravame criticado
em uníssono, e por várias razões: proporcionalmente taxa mais as pessoas
de renda baixa; propaga-se em cascata sobre todas as etapas da
elaboração de bens e serviços, bem como de qualquer operação financeira.
E assim contribui para um razoável acréscimo de custo no sistema
produtivo do país — que já enfrenta problemas de competitividade no
mundo.
O vice-presidente Michel Temer esteve sexta em São Paulo, num almoço
com empresários do comércio, em que disse ser muito pequena a chance de o
Congresso aprovar a volta da CPMF. Depois da saída de Temer, o ministro
da Fazenda, Joaquim Levy, chegou para encontrar os mesmos empresários,
quando repórteres disseram-lhe que Temer havia sido pessimista com
relação ao imposto do cheque. Irônico, Levy emendou: “Ótimo, então ele
quer a reforma da Previdência”.
Reveladora brincadeira, pois ficou explícito que o governo força a
volta do imposto porque não se dispõe a fazer as reformas
imprescindíveis para cortar o nó fiscal que asfixia o país. Mesmo só
gerando efeitos a médio e longo prazos, a reforma da Previdência, com
vistas a acabar com as aposentadorias precoces, mudaria de forma
instantânea, para melhor, a percepção do futuro da economia, com
reflexos positivos nos juros. Há outras mudanças a fazer, como o fim da
indexação pelo salário mínimo de benefícios previdenciários e sociais de
forma geral. O grande obstáculo para Dilma executar o que é preciso
para acabar com o déficit estrutural nas contas públicas — que cresce
sem parar devido a esta indexação — é sua base no PT. Os chamados
“movimentos sociais” são bastante beneficiados pela gastança ilimitada,
insana. Que não terá desfecho feliz, se nada for feito.
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