terça-feira, 29 de setembro de 2015

CPMF serve para adiar reformas imprescindíveis
Dilma traça na ONU panorama róseo da economia, enquanto fica cada vez mais evidente que imposto serve para governo não fazer os devidos cortes nos gastos
O Globo
Como reza a tradição, a presidente do Brasil fez ontem o pronunciamento de abertura de mais uma Assembleia Geral nas Nações Unidas, a 70ª. Também, como de praxe, não faltaram menções otimistas ao momento que o Brasil passa e às perspectivas para o país.
O cenário econômico visto pela presidente Dilma Rousseff da tribuna da ONU guarda razoável distância da realidade. No diagnóstico da grave crise fiscal, a presidente insistiu em responsabilizar pelas turbulências a crise mundial iniciada em 2008. Trata-se de meia verdade, porque o governo não deixou de ser alertado para o risco de o seu programa voluntarista de aumento dos gastos públicos criar a crise que afinal gerou.
A crise externa não pode ser responsabilizada pelos problemas fiscais, mas sim a forma equivocada e desmedida com que ela foi enfrentada, por meio do tal “novo marco macroeconômico”, acompanhado de um arsenal de ilusionismo estatístico, a tal da “contabilidade criativa”.
Ainda da tribuna da ONU, Dilma se referiu a “uma forte redução de nossas despesas, do gasto de custeio e até de parte do investimento.” Informação incompleta: faltou dizer que, na verdade, a viga mestra do ajuste é a recriação da CPMF, o “imposto do cheque”, gravame criticado em uníssono, e por várias razões: proporcionalmente taxa mais as pessoas de renda baixa; propaga-se em cascata sobre todas as etapas da elaboração de bens e serviços, bem como de qualquer operação financeira. E assim contribui para um razoável acréscimo de custo no sistema produtivo do país — que já enfrenta problemas de competitividade no mundo.
O vice-presidente Michel Temer esteve sexta em São Paulo, num almoço com empresários do comércio, em que disse ser muito pequena a chance de o Congresso aprovar a volta da CPMF. Depois da saída de Temer, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, chegou para encontrar os mesmos empresários, quando repórteres disseram-lhe que Temer havia sido pessimista com relação ao imposto do cheque. Irônico, Levy emendou: “Ótimo, então ele quer a reforma da Previdência”.
Reveladora brincadeira, pois ficou explícito que o governo força a volta do imposto porque não se dispõe a fazer as reformas imprescindíveis para cortar o nó fiscal que asfixia o país. Mesmo só gerando efeitos a médio e longo prazos, a reforma da Previdência, com vistas a acabar com as aposentadorias precoces, mudaria de forma instantânea, para melhor, a percepção do futuro da economia, com reflexos positivos nos juros. Há outras mudanças a fazer, como o fim da indexação pelo salário mínimo de benefícios previdenciários e sociais de forma geral. O grande obstáculo para Dilma executar o que é preciso para acabar com o déficit estrutural nas contas públicas — que cresce sem parar devido a esta indexação — é sua base no PT. Os chamados “movimentos sociais” são bastante beneficiados pela gastança ilimitada, insana. Que não terá desfecho feliz, se nada for feito.

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