O Brasil, que buscou consolidar o modelo em diferentes momentos históricos, jamais porém o implementou com tanto afinco como nos anos Lula-Dilma
Os presidentes Hu Jintão, da China, e
Luis Inácio Lula da Silva, assinam documentos com o objetivo de
impulsionar a cooperação de comércio e energia entre os dois países,
durante a reunião de cúpula do Bric - grupo que reúne Brasil, Rússia,
Índia e China. (veja.com/AFP)
Ouvi há alguns dias de um
banqueiro britânico – que já trabalhara tanto no Brasil como na China –
que o malogro econômico brasileiro e o êxito chinês tinham a mesma
razão: a forte presença do Estado na economia.
A propósito, o principal ponto de
discussão do Fórum Econômico de Davos há cinco anos era o capitalismo de
Estado. E a tradicional revista The Economist trazia à época o tema numa de suas icônicas capas.
Naquele instante, as variantes de
capitalismo de Estado aplicadas nos Brics pareciam produzir muito mais
sucessos do que a dupla EUA-Europa, ainda abalada pelas crises dos
subprimes e das dívidas soberanas.
O fato é que tanto a própria noção de
capitalismo como a ideia de capitalismo de Estado representam conceitos
demasiado amplos. Comportam realidades tão diferentes como China ou
Cingapura, Brasil ou Rússia.
Cabe ressaltar que diferentes países
implementam sua interpretação de capitalismo de Estado sobre as bases de
ordens políticas diversas e diferentes abordagens sobre a relação
custo-benefício de integrar-se à economia global.
É possível, assim, vislumbrar dois
submodelos majoritários de aplicação de ferramentas Estado-capitalistas,
sobretudo em termos de estratégia econômica. Os dois países que
ofereceram os elementos mais facilmente identificáveis em tempos
recentes são justamente o Brasil e a China.
O Brasil, que buscou consolidar o modelo
em diferentes momentos históricos, jamais porém o implementou com tanto
afinco como nos anos Lula-Dilma. E o fez num contexto de pujante
sociedade civil, imprensa vigilante e livre, pleno direito à crítica e
sufrágio universal. O capitalismo de Estado brasileiro que disso
resultou foi consumista, orientado para dentro e curto-prazista.
Na China, o capitalismo de Estado se deu
sobre estruturas de imobilismo político e (forçada) coesão. O projeto
nacional chinês de poder, prosperidade e prestígio é mais importante do
que a livre movimentação e expressão política dos atores sociais. Disso
resultaram ênfase em poupança e investimentos, economia voltada para
fora e perspectiva de longo prazo.
O capitalismo de Estado chinês foi marcado
– por certo tempo – pela administração artificial do câmbio e da
remuneração do fator trabalho, acesso favorecido aos principais mercados
compradores do mundo, grande capacidade de acúmulo de poupança e
investimento nas mãos do Estado, parcerias público-privadas voltadas à
infraestrutura e logística de comércio exterior, e uma combativa
diplomacia empresarial.
O capitalismo de Estado no Brasil
desenhado no período Lula-Dilma foi erigido sobre protecionismo
comercial, fortalecimento das megacorporações de economia mista que
atuam em commodities agrícolas e minerais, política industrial defensiva
e, por último, remuneração do capital financeiro em níveis bem
superiores às taxas praticadas ao redor do mundo ─ de modo a compensar
os esquálidos níveis de poupança e investimento internos, ambos
inferiores a 20% do PIB.
Tanto o modelo chinês como o brasileiro
conferiram caráter sacrossanto à noção de conteúdo local. No caso
chinês, muito se especulou quanto ao conteúdo local como imperativo para
manter-se empregada – a baixos níveis de remuneração – a imensa
população de jovens que a cada ano chega ao mercado de trabalho.
Contudo, esse que foi o principal
estereótipo da competitividade chinesa – mão de obra abundante a baixo
custo – já está caduco. Economias como Índia, Paquistão, Vietnã ou mesmo
países africanos já oferecem mais atrativos neste particular do que a
China.
O que marca a ênfase que o capitalismo de
Estado na China contemporânea atribui ao conteúdo local se manifesta na
robusta capacidade de realizar compras governamentais ou celebrar
contratos internacionais exigindo, como contrapartida do parceiro
estrangeiro, a instalação de unidades produtivas em território chinês.
Neste sentido, aparentemente é grande a
coincidência com o modelo brasileiro de busca de conteúdo local, que
concentra o poder do Estado, suas autarquias e das grandes empresas de
economia mista e em favor da atração de investimentos estrangeiros
diretos.
No entanto, o capitalismo de Estado no
Brasil e sua filosofia “local-conteudista” promoveram tão somente
substituição de importações. Na China, tais ferramentas foram
instrumentalizadas à promoção de exportações.
A vertente chinesa promoveu
internacionalização e competitividade e, no limite, acabou por auxiliar
na emergência do país como principal nação-comerciante. Em contraste, o
modelo brasileiro tão somente serviu para isolar o país do mundo,
reforçando suas feições de atrasada autarquia.
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