Justiça quer criar 5,5 mil cargos com gasto de R$ 600 milhões
Apesar da crise, tribunais pressionam para CNJ pôr pedidos em votação
Carolina Brígido e André de Souza - O Globo
Ainda que os tempos sejam de aperto nas contas públicas, órgãos do Poder Judiciário se mobilizam para aumentar a quantidade de cargos — e, por consequência, seu impacto nos cofres públicos. O Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) tem hoje sobre a mesa 15 pedidos para a criação de 5.516 novos
cargos ou gratificações. As solicitações se acumulam desde 2013. São
cargos efetivos, que incluem 36 juízes, com salários iniciais de R$ 27,5
mil, e também de livre nomeação, aqueles em que o funcionário não
precisa ser aprovado em concurso público, com vencimentos que variam de
R$ 6 mil a R$ 14,6 mil. Se os pedidos forem aprovados, o impacto no
orçamento pode chegar a R$ 606 milhões por ano.
Recentemente, presidentes de tribunais e de órgãos do Judiciário
procuraram a ministra Cármen Lúcia, que preside do CNJ e o Supremo
Tribunal Federal (STF), para pedir que os temas sejam postos em votação
logo. A presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra
Laurita Vaz, é uma delas. Apesar da pressão constante, Cármen Lúcia já
disse a interlocutores que sequer levará os pedidos para discussão no
plenário no conselho. Além de ser contrária ao aumento da estrutura do
Judiciário, a ministra alega falta de dinheiro nos cofres públicos para
atender às demandas.
O STJ fez três pedidos ao CNJ, em 2014, em 2016 e neste ano. Até
agora, nenhum foi atendido. Um deles é para a criação de 225 cargos para
as escolas federais de magistratura ao custo de R$ 26,6 milhões anuais.
O outro é para 117 cargos para o Conselho da Justiça Federal (CJF), ao
custo de R$ 25,83 milhões. O terceiro é para a criação de 1.146 cargos,
todos na área de informática, também para o CJF e para órgãos da Justiça
Federal de primeiro e segundo graus. O impacto é de R$ 145,78 milhões.
Os pedidos não detalham quais setores teriam o financiamento cortado
para compensar o aumento dos gastos com salários. Essa equação seria
solucionada depois que os pedidos fossem aprovados. No entanto, na
prática, esse problema não será resolvido porque Cármen Lúcia não deve
levar os processos para julgamento no CNJ, justamente por conta da falta
de recursos.
Esta não é a primeira ofensiva de magistrados para inflar o orçamento
do Judiciário. Em agosto, o STF resistiu ao pedido de reajuste salarial
de juízes e aprovou o orçamento da Corte para 2018 sem essa previsão. A
maioria alegou que a situação financeira do país não comportaria o
aumento na folha de pagamento. O ministro Ricardo Lewandowski chegou a
defender reajuste de 16,38% para ele e os colegas, como forma de
recompor perdas inflacionárias sofridas pela magistratura nos últimos
anos. A ideia não conseguiu apoio suficiente para ser aprovada.
CONTA ALTA DA JUSTIÇA MILITAR
Um dos pedidos
mais caros é do Superior Tribunal Militar (STM), que quer a criação de
240 cargos, sendo 149 analistas e 91 técnicos, além de 500
gratificações. Os novos funcionários da Justiça Militar representariam
um gasto extra de R$ 49,5 milhões por ano. O pedido chegou ao CNJ em
março de 2016 e, como os outros, não há previsão de quando será julgado
em plenário.
A Justiça Militar já é proporcionalmente a mais cara do país. Segundo
o relatório “Justiça em Números”, divulgado pelo CNJ neste ano, o custo
mensal por magistrado brasileiro em 2016 foi de R$ 47,7 mil, em média.
Na Justiça do Trabalho, a mais em conta, o gasto foi de R$ 38,8 mil. Na
Justiça Militar, o custo foi de R$ 53,78 mil.
Por
ser órgão especializado, a Justiça Militar costuma ser a menos
produtiva do país. O relatório do CNJ revelou que, no ano passado, um
ministro do STJ — a Corte superior mais abarrotada de trabalho —
“baixou” em média 10.247 processos. No STM, foram apenas 72 por
ministro, menos que qualquer outro tribunal superior. São considerados
processos “baixados” aqueles em que houve decisão ou arquivamento, ou
que foram remetidos a outros órgãos.
CONSELHO DA JUSTIÇA DO TRABALHO, RECORDISTA
O
Tribunal Superior do Trabalho (TST) fez quatro pedidos ao CNJ em 2015 e
2016. Somam 1.387 novos cargos e gratificações, com impacto de R$ 186,08
milhões anuais. Também foram pedidas 25 novas varas do trabalho no
Paraná, no Piauí e em Pernambuco.
O Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) é o recordista de
pedidos ao CNJ: cinco entre 2013 e 2016. Ao todo, foram solicitados
1.117 cargos e gratificações, sendo 15 de juiz. O custo anual da
proposta é de R$ 118,7 milhões. O órgão também pediu a criação de 15
varas do trabalho na Bahia e no Maranhão.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) solicitou 683 vagas a serem
distribuídas pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), com impacto
anual de R$ 51,71 milhões. Por fim, há um pedido do Tribunal de Justiça
do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que quer mais 11 cargos
comissionados, com custo de R$ 1,67 milhão por ano.
Dos pedidos que aguardam o CNJ, o salário mais caro é o de juiz de
tribunal da segunda instância, que tem vencimentos iniciais de R$ 27,5
mil. Os cargos em comissão têm salários que variam de R$ 6 mil a R$ 14,6
mil e podem ser exercidos por pessoas que não foram aprovadas em
concurso público.
O projeto da lei orçamentária de 2018 enviado pelo governo prevê R$
41,5 bilhões para o Judiciário da União, o que inclui os tribunais
superiores, a Justiça Federal, a Justiça Eleitoral, a Justiça do
Trabalho e o TJDFT. Os R$ 606 milhões dos pedidos feitos ao CNJ
representam 1,5% disso.
O STM explicou que os cargos e funções com gratificação são
reivindicação antiga, de 2012, para suprir necessidades da Justiça
Militar. Nas auditorias militares, por exemplo, há 300 militares das
Forças Armadas para suprir a falta de funcionários.
As razões do CFJ foram apresentadas em documentos referendados pelo
STJ e enviados ao CNJ. O órgão argumentou que são necessários mais
cargos porque “atualmente não consegue atender às necessidades de
atuação como órgão de supervisão orçamentária e administrativa da
Justiça Federal”. O documento relata todas as atribuições do órgão, que
incluem a fiscalização e a gestão da Justiça Federal, o que demandaria o
“aparelhamento de recursos humanos para uma atuação mais efetiva”.
Os cargos em informática foram pedidos para “assegurar as ações da
Justiça Federal na entrega de uma efetiva e célere prestação
jurisdicional ao cidadão”. Sobre as escolas de magistratura, o CNJ diz
que “o planejamento dos cursos para a formação e aperfeiçoamento de
magistrados exige das escolas judiciais uma estruturação física,
material, de pessoal e de gestão, de modo a criar um ‘modus operandi’
que possa consolidar o modelo pedagógico”.
O CSJT informou que a criação de cargos segue o que é estipulado por
uma resolução do próprio conselho e por outra do CNJ. Para isso, são
levados em conta, por exemplo, o número de processos sob
responsabilidade de uma vara e a quantidade de trabalhadores atendida
por ela. O CJST comunicou também que seus pedidos vão até 2016, antes da
aprovação do chamado “teto dos gastos”, segundo o qual as despesas não
podem crescer acima da inflação oficial do ano anterior. Procurados pelo
GLOBO para explicar as razões dos pedidos e as fontes de recursos para
custeá-los, TST, TSE e TJDFT não responderam.
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