'Cadeia Velha': PF cumpre mandado de prisão
contra filho de Picciani e empresários de ônibus; procuradores pedem que
presidente da Alerj seja detido
Ação tem como objetivo desbaratar esquema de
propina destinada a comprar decisões na Assembleia Legislativa para o
setor de transportes
Chico Otavio e Daniel Biasetto - O Globo
Na mais importante ofensiva contra a corrupção no Rio de Janeiro desde a prisão do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), em novembro do ano passado, a Procuradoria Regional da República da 2ª Região (PRR-2), em parceria com a Polícia Federal (PF), desencadeou na manhã desta terça-feira a operação "Cadeia Velha". A PF está nas ruas para cumprir mandados de prisão contra Felipe Picciani, filho do presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani,
e também gerente da Agrobilara, a empresa que conduz os negócios da
família. Há ainda mandados de busca e apreensão nos gabinetes da
presidência da Alerj e de Picciani, e dos deputados Paulo Melo e Edson Albertassi,
todos do PMDB. Os procuradores também pediram a prisão dos
parlamentares, que serão conduzidos coercitivamente a depor neste
primeiro momento.
Os mandados de prisão se estendem ainda a Jorge Luiz Ribeiro, braço direito do presidente da Alerj; Andréia Cardoso do Nascimento, chefe de gabinete do deputado Paulo Melo; e do irmão dela, Fábio, também assessor de Melo. E também contra empresários ligados a Fetranspor, Lélis Teixeira, José Carlos Lavouras e Jacob Barata Filho.
Jorge Picciani, Melo e Albertassi só não serão presos neste momento
porque a Constituição estadual, no Artigo 120, estabelece como única
possibilidade de prisão provisória o flagrante de crime inafiançável, à
exceção de casos com licença prévia da Alerj. Mas as três prisões não
estão descartadas. No mesmo instante em que operação ocorre, os
procuradores regionais da República responsáveis vão pedir ao Tribunal
Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), fórum competente para o caso, que
considere flagrantes os crimes atribuídos a Picciani, Melo e
Albertassi.
O presidente da Alerj, Jorge Picciani, e o ex-vice-presidente da Casa, deputado Paulo Melo, ambos do PMDB - Divulgação/Alerj
A
PRR-2 vai pedir as prisões preventivas e em flagrante dos
parlamentares. No mesmo pedido enviado ao TRF-2 foi solicitado também o
afastamento imediato dos alvos de suas funções políticas na Assembleia.
Os procuradores sustentam que o flagrante existe porque o trio de
parlamentares comete até hoje crime continuado de lavagem de dinheiro,
já que o esquema não cessou, de acordo com a investigação. Este pedido
será submetido pelo relator do caso, desembargador Abel Gomes, ao
colegiado da Seção Criminal do TRF-2, formada pelos seis desembargadores
das turmas de Direito Penal, em sessão especial provavelmente nesta
quinta-feira.Jorge Picciani e Felipe Picciani - Divulgação/Grupo Monte Verde
Deputados
estaduais, empresários e intermediários são acusados de manter uma
caixinha de propina destinada à compra de decisões na Assembleia
Legislativa do Rio (Alerj) para o setor de transportes. O esquema,
concluíram os investigadores, teria começado nos anos 1990, por Cabral, e
hoje seria comandado pelo presidente da Casa, deputado Jorge Picciani,
por seu antecessor, deputado Paulo Melo, e pelo líder do governo Edson
Albertassi, caciques do PMDB fluminense.
Construído nos idos da década de 1630 para ser um parlamento
imperial, o prédio que dá lugar ao Palácio Tiradentes possuía em seu
piso inferior um lugar batizado popularmente de "Cadeia Velha", para
onde eram mandados criminosos, prostitutas e escravos que se rebelavam
contra as leis da Coroa.
Jacob Barata Filho deixa o presídio de Benfica, no Rio de Janeiro
- Ana Branco/Agência O Globo/19-08-2017
Estão
ainda na lista de presos os principais nomes da cúpula da Federação das
Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio (Fetranspor),
Lélis Teixeira (presidente), José Carlos Lavouras e Jacob Barata Filho,
todos alvos da primeira fase da Operação "Ponto Final", deflagrada em julho, e que haviam sido libertados por liminar do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Alvos de condução coercitiva:
Os deputados Jorge Picciani, presidente da Alerj, Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do PMDB.
Alvos de prisão temporária:
Felipe Picciani, Ana Cláudia Jaccoub, Márcia Rocha Schalcher de Almeida e Fábio Cardoso Nascimento
Alvos de prisão preventiva:
Jorge Luiz
Ribeiro, Carlos Cesar da Costa Pereira, Andreia Cardosso do Nascimento,
Lélis Teixeira, Jacob Barata Filho e José Carlos Lavouras.
CAIXINHA E E-EMAILS INTERCEPTADOSO deputado Edson Albertassi (PMDB), indicado para o TCE-RJ - Daniel Marenco / Agência O Globo / 25-6-15
As
principais provas contra Picciani, Melo e Albertassi foram extraídas
das delações premiadas do doleiro Álvaro José Novis, dono da corretora
Hoya, do empresário Marcelo Traça Gonçalves, ex-presidente do Sindicato
das Empresas de Transporte Rodoviários do Estado do Rio (Setrerj), cujo
depoimento foi homologado pelo desembargador Abel Gomes, e do
ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Jonas Lopes de
Carvalho. Os investigadores se valeram também da colaboração de um dos
funcionários de Novis na Hoya, Edimar Moreira Dantas, que auxiliou e
detalhou à força-tarefa a identificação de pagamentos por meio de
planilhas do esquema.
As investigações mostraram e detalharam o funcionamento da "caixinha
da Fetranspor", como ficou conhecido o esquema de propina bancado pelos
empresários de ônibus. Os pagamentos efetuados pelo sistema Fetranspor
serviam para garantir benefícios relacionados a linhas de ônibus,
aumento de tarifas, isenções fiscais e outros interesses do setor que
passavam pela Alerj, sustentam os investigadores.
Cerca de 8 mil e-mails interceptados nas quebras de sigilos
telemáticos dos envolvidos ajudaram a revelar a rede de relações entre
empresários, parlamentares e assessores, incluindo até nomeações de
juízes.
A "caixinha da Fetranspor", como demonstraram as investigações,
começou no início dos anos 1990, com a Alerj sob o comando de Cabral,
sendo herdada por seus dois sucessores, Picciani (2003-2010 e 2015 em
diante) e Melo (2011-2015).
Dois argumentos serviram de base para estabelecer a competência
originária do TRF-2 no caso: a existência de um banco paralelo
patrocinado pela Fetranspor em transportadora de valores, por onde
circulou a propina da Alerj, crime previsto na Lei nº 7.492 (define os
crimes contra o sistema financeiro nacional) e a tese de que há uma
organização criminosa abrigada dentro do PMDB fluminense, tese de várias
outras operações e desdobramentos da Lava-Jato no Rio.
INDICAÇÃO DE ALBERTASSI VIRA POLÊMICA
A
indicação do deputado estadual Edson Albertassi (PMDB) para a vaga de
conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) está no
centro da polêmica. Líder do governo, o parlamentar foi apontado pelo governador Luiz Fernando Pezão para ocupar a cadeira deixada pelo delator Jonas Lopes, ex-presidente do tribunal, agora aposentado.
O procurador-geral do Estado, Leonardo Espíndola, foi demitido por Pezão após se recusar a preparar a defesa do governador contra a ação popular movida ação popular movida pelos deputados estaduais Marcelo Freixo e Eliomar Coelho — ambos do PSOL.
A ação sustou o processo de nomeação de Albertassi para a vaga. A
exoneração do chefe dos procuradores fluminenses será publicada no
Diário Oficial desta terça-feira.
A
polêmica surgiu depois que três conselheiros substitutos — os auditores
Rodrigo Melo do Nascimento, Marcelo Verdini Maia e Andrea Siqueira
Martins — que, inicialmente, integravam uma lista tríplice para a vaga
de Jonas renunciaram conjuntamente à candidatura. Autor da ação popular, o deputado Marcelo Freixo classificou a decisão da renúncia como "misteriosa".
Em nota divulgada somente dois dias depois, explicaram, entre outros
argumentos, que não havia insegurança quanto à aprovação de um dos seus
nomes pela Assembleia. Esta lista tinha sido enviada em setembro, ao
governador Pezão, pela presidente interina do TCE, Marianna Montebello.
A indicação aconteceu na última terça-feira, dia 7, depois que os
três conselheiros-substitutos desistiram de concorrer ao posto. Na
quinta-feira, o escolhido pelo governador foi sabatinado e aprovado por
uma comissão da Alerj. Na sabatina, o deputado disse que vai "purificar" a cadeira do TCE.
No mesmo dia da sabatina, os deputados do PSOL protocolaram a ação na
qual pediam que a indicação de Albertassi fosse sustada e requeriam a
formação de uma nova lista tríplice composta "exclusivamente" por
auditores do TCE ou por membros do MP junto ao Tribunal.
Na sexta-feira, o Ministério Público do estado (MP-RJ) emitiu parecer favorável à ação popular.
No entanto, o Marcello Alvarenga Leite, da 9ª Vara da Fazenda Pública
do Rio, negou o pedio. Os deputados recorreram. Nesta segunda-feira, a indicação de Albertassi foi suspensa em caráter liminar.
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