Sabrina Tavernise e Robert Gebeloff - NYT
Quando o fumo varreu os Estados Unidos pela primeira vez nas primeiras décadas do século 20, ele pegou os mais abastados. Os cigarros eram símbolos de elegância e classe da alta sociedade, tragados por médicos e artistas de cinema. Nos anos 60, o tabagismo explodiu, facilitado pela distribuição de cigarros para os soldados na 2ª Guerra Mundial. Metade de todos os homens e um terço das mulheres fumavam.
Quando o fumo varreu os Estados Unidos pela primeira vez nas primeiras décadas do século 20, ele pegou os mais abastados. Os cigarros eram símbolos de elegância e classe da alta sociedade, tragados por médicos e artistas de cinema. Nos anos 60, o tabagismo explodiu, facilitado pela distribuição de cigarros para os soldados na 2ª Guerra Mundial. Metade de todos os homens e um terço das mulheres fumavam.
Mas à medida
que as provas das consequências fatais do cigarro se acumularam, os
padrões mais amplos de uso entre as classes mudaram: o fumo, a maior
causa de mortes capazes de ser prevenidas no país, está agora aumentando
entre os pobres e a classe trabalhadora.
Enquanto dados anteriores estabeleceram este padrão, uma nova análise de dados federais sobre o tabagismo divulgada na segunda-feira mostra que a disparidade está aumentando. A taxa nacional de fumantes vem caindo constantemente, mas há uma profunda divisão geográfica. Nos subúrbios ricos de Washington, D.C., só uma em cada dez pessoas fumam, de acordo com a análise do Instituto para Avaliação e Métricas de Saúde. Mas em lugares pobres como este - Clay County, no leste do Kentucky - quase quatro em cada dez pessoas fumam.
"É o que fazemos aqui", disse Ed Smith Jr., 51, segurando o cigarro numa mão calejada de seu trabalho podando árvores próximas aos cabos de energia. Vários de seus amigos morreram de câncer de pulmão, e ele tentou parar, mas até agora não conseguiu.
"Quero ver meu neto crescer", disse ele.
O novo estudo, que avaliou dados federais de 1996 a 2012 para revelar as taxas de tabagismo por condado, ofereceu um vislumbre raro sob a superfície dos dados estaduais. Ele descobriu que os condados mais ricos em todo o país tiveram as quedas mais rápidas e acentuadas nas taxas de fumantes, enquanto o progresso entre os condados mais pobres estagnou. As descobertas são particularmente duras para as mulheres: cerca de metade dos condados de alta renda mostraram quedas significativas na taxa de fumantes entre as mulheres, mas apenas 4% dos condados pobres tiveram redução, revelou a análise.
A diferença crescente no número de fumantes pobres e ricos está causando desigualdade nos resultados da saúde, dizem especialistas, uma vez que, por exemplo, as mulheres mais abaixo da escada econômica agora têm vidas mais curtas.
"O tabagismo está deixando os lugares ricos, as grandes áreas urbanas", disse Ali H. Mokdad, pesquisador do Instituto para Avaliação e Métricas de Saúde e autor do estudo. "Mas persiste nas áreas pobres e rurais. Elas estão ficando para trás."
Norte-americanos que cursaram até o segundo grau representam 40% da população, mas respondem por 55% dos 42 milhões de fumantes do país, de acordo com uma análise do New York Times sobre os dados da pesquisa de saúde obtida por meio do Minnesota Population Center, da Universidade de Minnesota. Desde 1997, a taxa de fumantes entre adultos caiu 27%, mas entre os pobres ela caiu apenas 15%, de acordo com a análise. E entre os adultos que vivem em situação de pobreza extrema no sul e centro-oeste, a taxa de fumantes não se alterou.
Especialistas em saúde dizem que esta compreensão de quem ainda fuma mostra que as autoridades de saúde precisam mudar o foco dos esforços anti-tabagismo para os pobres e a classe trabalhadora. Michael P. Eriksen, reitor da escola de saúde pública da Universidade Estadual da Geórgia, que administrou o Escritório de Tabagismo e Saúde do governo federal durante a presidência de Bill Clinton, disse que os programas públicos voltados para os norte-americanos com dificuldades eram irregulares, enquanto as companhias de tabaco os atingem com sucesso.
Os pesquisadores mostraram que as companhias de tabaco fazem contribuições para causas locais, focam campanhas de publicidade em áreas de baixa renda, e até vendem cigarros mais baratos nessas áreas.
Com a taxa nacional de fumantes se estabilizando nos anos mais recentes, os especialistas dizem que atingir os fumantes pobres e da classe trabalhadora, cujos problemas normalmente incluem abuso de álcool e drogas e doenças mentais, é crucial para novas reduções e para diminuir o pesado fardo financeiro que o tabagismo acarreta para o sistema de saúde.
"A conclusão real aqui é que precisamos descobrir formas inteligentes de atingir esses grupos", disse Eriksen. "O esforço tem sido lamentável até agora em comparação ao potencial benefício à sociedade de fazer com que essas pessoas parem de fumar."
Clay County, onde apenas 7% dos moradores têm diploma universitário e a taxa de pobreza é o dobro da do país, está tentando. Manchester, a sede do condado, um pequeno aglomerado de postos de gasolina, prédios municipais e restaurantes de fast-food, proibiu o fumo nos restaurantes, lojas e bares em 2012. O hospital tem um programa para parar de fumar que oferece adesivos e chiclés de nicotina gratuitos num esforço para atingir os fumantes de baixa renda.
Ainda assim, o progresso tem sido lento. Segundo a análise do Instituto para Avaliação e Métricas de Saúde, a taxa de fumantes de Clay em 2012, de 36,7%, era a mais alta de qualquer condado dos EUA, com uma população de pelo menos 15 mil pessoas, e não havia mudado muito desde 1996.
"Cessar o tabagismo é nossa maior batalha", disse Jeremy Hacker, coordenador de extensão comunitária do hospital. Enquanto fumar não [e mais normal em cidades grandes, disse ele, em Clay, "não é visto como um problema. Os fumantes não são vistos como a minoria."
Quando Mitzi Jackson, que trabalha numa companhia de empréstimos, foi viajar para Nova York recentemente, a única pessoa que ela viu fumando foi o amigo com quem ela viajava. Ele foi enxotado de calçadas e para longe das portas. "Eu achei que ele seria preso", disse ela.
Ao contrário, visitar Clay County é como viajar de volta no tempo. A
taxa de fumantes do condado foi vista pela última vez no país como um
todo em 1970. Um maço de cigarros custa cerca de US$ 5 aqui, quase
metade do custo em Nova York, onde os impostos estaduais e municipais
aumentam o preço. Poucas pessoas entrevistads disseram que estavam
felizes por fumar, mas muitas disseram que era um dos poucos prazeres
que podiam comprar.
"Eu adoraria parar mas não consigo, sou muito dependente", disse Becky Johson, 60, enquanto colocava a tampa do tanque de sua velha camionete do lado de fora da Bowling's Quick Stop, uma loja de conveniência cujas máquinas eletrônicas atraem uma multidão de fumantes quase todas as tardes. Questionada sobre o porquê ela fuma, ela respondeu: "tédio, acho".
Até meados dos anos 60, quando os perigos do cigarro ficaram claros, havia mais ou menos a mesma quantidade de estudantes de segundo e terceiro graus que fumavam. Mas desde então, a taxa caiu muito mais rápido entre aqueles formados na universidade. Nos últimos 15 anos, o declínio foi duas vezes maior entre adultos com diploma de terceiro grau, de acordo com a análise do Times. As diferenças também aumentaram entre os empregados e os desempregados, e entre aqueles que têm seguro de saúde e os que não têm.
Clay County tem alguns dos piores resultados de saúde do país, e muitos dizem que o fumo parece quase seguro em comparação com a epidemia de drogas na área.
"O fumo é uma das últimas coisas com as quais se preocupar neste condado", disse Barbara Bowling, dona da Mike's Discount Tobacco, que tem janelas de drive-through sob uma placa que diz: "Vamos falar de Deus". ela disse que ficou irritada quando descobriu que sua filha estava fumando, mas ao menos ela não estava usando drogas.
"Basta sentar e observar o estacionamento por um dia", disse Bowling. "Se fumar fosse a pior coisa que estivesse acontecendo, seria uma bênção."
Outros expressaram um fatalismo comum entre os norte-americanos pobres, que normalmente não têm muito controle sobre as circunstâncias de suas vidas.
"A atitude do meu pai era: 'bom, eu vou morrer de alguma coisa'", disse Lynn Bargo, 35, estudante de cosmetologia que trabalha no hotel Best Western. O pai dela, que era fumante, morreu de câncer no pulmão aos 71 anos. Ela disse que o fumo é superado pelo uso de drogas: no salão onde ela trabalha, alguns clientes chegam sob efeito de drogas e ocasionalmente perdem a consciência enquanto ela corta o cabelo.
Ainda assim, as intervenções do governo podem fazer uma diferença, dizem os pesquisadores. Embora a taxa de fumantes tenha permanecido igual entre os norte-americanos que vivem em pobreza extrema no sul, ela caiu significativamente entre este grupo de renda no nordeste, onde foram tomadas duras medidas anti-tabagismo como as promulgadas pelo ex-prefeito Michael R. Bloomberg em Nova York.
Mas mesmo em Clay County, a mudança pode estar chegando. Quando a proibição do fumo em áreas públicas em Manchester entrou em vigor, era difícil dizer quem no restaurante Huddle House odiou mais: a clientela ou os funcionários. Dois anos mais tarde, Mike Feltner, cozinheiro, estava fumando cautelosamente um cigarro eletrônico (sabor Marlboro) enquanto cozinhava ovos. Ele disse que todos os quatro fumantes da equipe agora usavam os cigarros eletrônicos, que segundo ele era consideravelmente mais baratos do que seu antigo hábito de dois maços por dia. Ele usou o dinheiro das economias para dar entrada numa casa.
"É uma nova fase nesta cidade" disse ele. "Tudo mundo está fazendo isso. Os jovens, os velhos, todo mundo."
Tradutor: Eloise De Vylder
Enquanto dados anteriores estabeleceram este padrão, uma nova análise de dados federais sobre o tabagismo divulgada na segunda-feira mostra que a disparidade está aumentando. A taxa nacional de fumantes vem caindo constantemente, mas há uma profunda divisão geográfica. Nos subúrbios ricos de Washington, D.C., só uma em cada dez pessoas fumam, de acordo com a análise do Instituto para Avaliação e Métricas de Saúde. Mas em lugares pobres como este - Clay County, no leste do Kentucky - quase quatro em cada dez pessoas fumam.
"É o que fazemos aqui", disse Ed Smith Jr., 51, segurando o cigarro numa mão calejada de seu trabalho podando árvores próximas aos cabos de energia. Vários de seus amigos morreram de câncer de pulmão, e ele tentou parar, mas até agora não conseguiu.
"Quero ver meu neto crescer", disse ele.
O novo estudo, que avaliou dados federais de 1996 a 2012 para revelar as taxas de tabagismo por condado, ofereceu um vislumbre raro sob a superfície dos dados estaduais. Ele descobriu que os condados mais ricos em todo o país tiveram as quedas mais rápidas e acentuadas nas taxas de fumantes, enquanto o progresso entre os condados mais pobres estagnou. As descobertas são particularmente duras para as mulheres: cerca de metade dos condados de alta renda mostraram quedas significativas na taxa de fumantes entre as mulheres, mas apenas 4% dos condados pobres tiveram redução, revelou a análise.
A diferença crescente no número de fumantes pobres e ricos está causando desigualdade nos resultados da saúde, dizem especialistas, uma vez que, por exemplo, as mulheres mais abaixo da escada econômica agora têm vidas mais curtas.
"O tabagismo está deixando os lugares ricos, as grandes áreas urbanas", disse Ali H. Mokdad, pesquisador do Instituto para Avaliação e Métricas de Saúde e autor do estudo. "Mas persiste nas áreas pobres e rurais. Elas estão ficando para trás."
Norte-americanos que cursaram até o segundo grau representam 40% da população, mas respondem por 55% dos 42 milhões de fumantes do país, de acordo com uma análise do New York Times sobre os dados da pesquisa de saúde obtida por meio do Minnesota Population Center, da Universidade de Minnesota. Desde 1997, a taxa de fumantes entre adultos caiu 27%, mas entre os pobres ela caiu apenas 15%, de acordo com a análise. E entre os adultos que vivem em situação de pobreza extrema no sul e centro-oeste, a taxa de fumantes não se alterou.
Especialistas em saúde dizem que esta compreensão de quem ainda fuma mostra que as autoridades de saúde precisam mudar o foco dos esforços anti-tabagismo para os pobres e a classe trabalhadora. Michael P. Eriksen, reitor da escola de saúde pública da Universidade Estadual da Geórgia, que administrou o Escritório de Tabagismo e Saúde do governo federal durante a presidência de Bill Clinton, disse que os programas públicos voltados para os norte-americanos com dificuldades eram irregulares, enquanto as companhias de tabaco os atingem com sucesso.
Os pesquisadores mostraram que as companhias de tabaco fazem contribuições para causas locais, focam campanhas de publicidade em áreas de baixa renda, e até vendem cigarros mais baratos nessas áreas.
Com a taxa nacional de fumantes se estabilizando nos anos mais recentes, os especialistas dizem que atingir os fumantes pobres e da classe trabalhadora, cujos problemas normalmente incluem abuso de álcool e drogas e doenças mentais, é crucial para novas reduções e para diminuir o pesado fardo financeiro que o tabagismo acarreta para o sistema de saúde.
"A conclusão real aqui é que precisamos descobrir formas inteligentes de atingir esses grupos", disse Eriksen. "O esforço tem sido lamentável até agora em comparação ao potencial benefício à sociedade de fazer com que essas pessoas parem de fumar."
Clay County, onde apenas 7% dos moradores têm diploma universitário e a taxa de pobreza é o dobro da do país, está tentando. Manchester, a sede do condado, um pequeno aglomerado de postos de gasolina, prédios municipais e restaurantes de fast-food, proibiu o fumo nos restaurantes, lojas e bares em 2012. O hospital tem um programa para parar de fumar que oferece adesivos e chiclés de nicotina gratuitos num esforço para atingir os fumantes de baixa renda.
Ainda assim, o progresso tem sido lento. Segundo a análise do Instituto para Avaliação e Métricas de Saúde, a taxa de fumantes de Clay em 2012, de 36,7%, era a mais alta de qualquer condado dos EUA, com uma população de pelo menos 15 mil pessoas, e não havia mudado muito desde 1996.
"Cessar o tabagismo é nossa maior batalha", disse Jeremy Hacker, coordenador de extensão comunitária do hospital. Enquanto fumar não [e mais normal em cidades grandes, disse ele, em Clay, "não é visto como um problema. Os fumantes não são vistos como a minoria."
Quando Mitzi Jackson, que trabalha numa companhia de empréstimos, foi viajar para Nova York recentemente, a única pessoa que ela viu fumando foi o amigo com quem ela viajava. Ele foi enxotado de calçadas e para longe das portas. "Eu achei que ele seria preso", disse ela.
"Eu adoraria parar mas não consigo, sou muito dependente", disse Becky Johson, 60, enquanto colocava a tampa do tanque de sua velha camionete do lado de fora da Bowling's Quick Stop, uma loja de conveniência cujas máquinas eletrônicas atraem uma multidão de fumantes quase todas as tardes. Questionada sobre o porquê ela fuma, ela respondeu: "tédio, acho".
Até meados dos anos 60, quando os perigos do cigarro ficaram claros, havia mais ou menos a mesma quantidade de estudantes de segundo e terceiro graus que fumavam. Mas desde então, a taxa caiu muito mais rápido entre aqueles formados na universidade. Nos últimos 15 anos, o declínio foi duas vezes maior entre adultos com diploma de terceiro grau, de acordo com a análise do Times. As diferenças também aumentaram entre os empregados e os desempregados, e entre aqueles que têm seguro de saúde e os que não têm.
Clay County tem alguns dos piores resultados de saúde do país, e muitos dizem que o fumo parece quase seguro em comparação com a epidemia de drogas na área.
"O fumo é uma das últimas coisas com as quais se preocupar neste condado", disse Barbara Bowling, dona da Mike's Discount Tobacco, que tem janelas de drive-through sob uma placa que diz: "Vamos falar de Deus". ela disse que ficou irritada quando descobriu que sua filha estava fumando, mas ao menos ela não estava usando drogas.
"Basta sentar e observar o estacionamento por um dia", disse Bowling. "Se fumar fosse a pior coisa que estivesse acontecendo, seria uma bênção."
Outros expressaram um fatalismo comum entre os norte-americanos pobres, que normalmente não têm muito controle sobre as circunstâncias de suas vidas.
"A atitude do meu pai era: 'bom, eu vou morrer de alguma coisa'", disse Lynn Bargo, 35, estudante de cosmetologia que trabalha no hotel Best Western. O pai dela, que era fumante, morreu de câncer no pulmão aos 71 anos. Ela disse que o fumo é superado pelo uso de drogas: no salão onde ela trabalha, alguns clientes chegam sob efeito de drogas e ocasionalmente perdem a consciência enquanto ela corta o cabelo.
Ainda assim, as intervenções do governo podem fazer uma diferença, dizem os pesquisadores. Embora a taxa de fumantes tenha permanecido igual entre os norte-americanos que vivem em pobreza extrema no sul, ela caiu significativamente entre este grupo de renda no nordeste, onde foram tomadas duras medidas anti-tabagismo como as promulgadas pelo ex-prefeito Michael R. Bloomberg em Nova York.
Mas mesmo em Clay County, a mudança pode estar chegando. Quando a proibição do fumo em áreas públicas em Manchester entrou em vigor, era difícil dizer quem no restaurante Huddle House odiou mais: a clientela ou os funcionários. Dois anos mais tarde, Mike Feltner, cozinheiro, estava fumando cautelosamente um cigarro eletrônico (sabor Marlboro) enquanto cozinhava ovos. Ele disse que todos os quatro fumantes da equipe agora usavam os cigarros eletrônicos, que segundo ele era consideravelmente mais baratos do que seu antigo hábito de dois maços por dia. Ele usou o dinheiro das economias para dar entrada numa casa.
"É uma nova fase nesta cidade" disse ele. "Tudo mundo está fazendo isso. Os jovens, os velhos, todo mundo."
Tradutor: Eloise De Vylder
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