Afeganistão e EUA assinam acordo sobre permanência de tropas
Soldados americanos
poderão ficar no país até o fim de 2016; outro acordo foi assinado entre
Cabul e a Otan, também sobre segurança
O Estado de S. Paulo O
assessor de segurança nacional do Afeganistão, Hanif Atmar (direita)
cumprimenta o embaixador dos EUA em Cabul, James Cunningham (esquerda)
CABUL
- Autoridades do Afeganistão e dos Estados Unidos assinaram nesta
terça-feira, 30, o aguardado Acordo Bilateral de Segurança (BSA, sigla
em inglês) para permitir a permanência de tropas americanas no país após
o fim deste ano. Essa era uma promessa de campanha do novo presidente
afegão, Ashraf Ghani, que tomou posse na segunda.
O novo assessor de segurança nacional do Afeganistão, Hanif
Atmar, e o embaixador dos EUA em Cabul, James Cunningham, assinaram o
acordo bilateral por volta das 15h15 (7h45 pelo horário de Brasília) no
palácio presidencial afegão, em uma cerimônia transmitida pela
televisão.
O antecessor de Ghani, Hamid Karzai, recusou-se durante muito
tempo a assinar o acordo, o que afetou as relações do Afeganistão com os
EUA.
Sob os termos do acordo, cerca de 12 mil soldados estrangeiros
(sendo 9,8 mil americanos) devem ficar no Afeganistão para treinar e
ajudar as forças de segurança afegãs após o encerramento formal da
missão militar liderada pelos EUA e de sua missão de combate e a
retirada da Otan, no fim de 2014.
O número de militares americanos será reduzido
progressivamente até o mínimo necessário para operações de segurança e
trabalhos diplomáticos até dezembro de 2016. Países como Alemanha e
Itália também terão efetivos em solo afegão junto com os americanos.
Um novo acordo de segurança com a Otan também foi assinado,
entre Atmar e o embaixador da organização no Afeganistão, Maurits R.
Jochems. O acordo com os EUA era uma precondição para o acordo com a
Otan, que estabelece a estrutura de uma missão focada em treinamento,
consultoria e no equipamento das tropas afegãs.
Atualmente, 48 países participam da missão da Isaf com 41.124
soldados, dos quais 28.970 são dos EUA, segundo os últimos dados da
Otan.
Gani afirmou, em um discurso feito após as assinaturas,
agradecendo Karzai por ter estipulado todos os detalhes dos tratados e
afirmou que a Loya Jirga, a assembleia tradicional afegã, "aprovou" os
dois acordos. "Garanto à nação que os acordos foram feitos com base em
nosso interesse nacional", acrescentando que se for necessário, os
tratados podem ser modificados com o respaldo da outra parte signatária.
Injeção de recursos dos EUA já supera Plano Marshall
Desde o início da guerra, em 2002, tentativas de estabilizar o Afeganistão já consumiram cerca de US$ 109 bilhões
O Estado de S.Paulo
Nos 13 anos desde a invasão do Afeganistão,
em 2001, os Estados Unidos gastaram no país mais do que destinaram à
reconstrução da Europa depois do fim da 2.ª Guerra com o Plano Marshall.
Mais da metade dos recursos foi usada na criação e armamento das forças
de segurança, que desde o ano passado são responsáveis pelo comando das
operações de combate no território afegão.
O
restante foi canalizado a diferentes programas de ajuda, que incluíram a
criação de um arcabouço institucional nos moldes ocidentais, construção
de escolas e hospitais e realização de obras de infraestrutura.
Apesar
da enorme injeção de recursos, o Afeganistão tem o mais elevado índice
de mortalidade infantil do mundo e um dos maiores de mortalidade
materna. Trinta e seis por cento da população vive abaixo da linha da
pobreza e apenas 30% do país está conectado a fontes permanentes de
eletricidade.
Outro ranking explica, em parte, os números:
segundo a Transparência Internacional, o Afeganistão é o terceiro país
mais corrupto do mundo, atrás de Somália e Coreia do Norte.
No
período de 2002 a junho de 2014, os Estados Unidos gastaram US$ 104
bilhões no esforço de reconstrução e ajuda ao Afeganistão, mostram as
estatísticas da entidade governamental responsável por supervisionar os
recursos, conhecida pela sigla Sigar. Atualizada, a cifra chega a US$
109 bilhões.
Em relatório enviado ao Congresso americano no
mês de julho, a instituição estimou que a quantia supera o que os EUA
destinaram ao Plano Marshall. Em valores corrigidos pela inflação, o
esforço de reconstrução de 16 países europeus no período de 1948 a 1952
custou aos americanos US$ 103,4 bilhões.
A diferença é que
os gastos no Afeganistão contemplaram não apenas a reconstrução do país,
mas também a criação de Exército, Força Aérea e polícia com um
contingente total de 340 mil pessoas, esforço que consumiu US$ 62
bilhões dos US$ 104 bilhões. Mas os restantes US$ 42 bilhões representam
quase o dobro do que os EUA gastaram na reconstrução da Grã-Bretanha no
pós-guerra: US$ 24,7 bilhões em valores atualizados, de acordo com
cálculos da Sigar.
Os principais avanços na área social
ocorreram na educação, com a matrícula em escolas de milhões de
crianças, especialmente meninas. Durante os seis anos do governo do
Taleban, mulheres foram proibidas de estudar e só podiam trabalhar em
situações especiais. Apesar de o Afeganistão continuar a ter o maior
índice de mortalidade infantil do mundo, o indicador melhorou nos
últimos 13 anos, quando também houve aumento da expectativa de vida da
população.
A mobilização de recursos também não criou uma
economia local capaz de prover receita suficiente para a manutenção do
Estado afegão. De acordo com a Sigar, a receita tributária do país em
2013 foi de US$ 2 bilhões, para gastos orçados em US$ 5,4 bilhões. A
diferença foi coberta pela ajuda internacional, que tem acompanhado o
movimento de retirada de tropas do país e está em retração.
Estimativa
do Banco Mundial citada no relatório indica que as receitas do governo
afegão permanecerão aquém das despesas pelo menos até 2025, em um valor
equivalente a 20% do PIB do país, que soma US$ 21 bilhões - o PIB
brasileiro é de US$ 2,25 trilhões.
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