Processo de cassação do deputado paranaense André Vargas, ex-PT, poderá ser julgado em plenário na quarta-feira. Ou 2014 terminará sem que nenhum deputado envolvido em maracutaias e esquemas de corrupção seja punido
Marcela Mattos - VEJA
Deputado André Vargas terá processo de cassação julgado na próxima quarta-feira
(Joel Rodrigues/Folhapress)
O processo de Vargas se arrasta a passos lentos há quase oito meses e, se não for concluído na próxima quarta-feira, atenderá ao apelo do deputado: deixar a Câmara impune. Mais do que não ter a imagem manchada, escapar da cassação é vital para o parlamentar. Se perder o mandato, ele será enquadrado na Lei da Ficha Limpa, o que o deixará inelegível por oito anos. Pior: sem o broche de deputado, Vargas perde o foro privilegiado e o caso deixa o Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda não tomou providências, e segue para a Justiça do Paraná, responsável pelas prisões de grandes executivos brasileiros. A aliados, Vargas externa o temor de ser o próximo da fila a conhecer a cadeia. Em uma última cartada para protelar a ação, a defesa de Vargas apresentou ao STF na semana passada pedido de liminar para anular sessão que rejeitou recurso na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e enviou o caso ao plenário, última instância do processo. A expectativa do advogado Michel Saliba é que o ministro Luís Roberto Barroso se manifeste antes da sessão de quarta-feira.
Ex-vice-presidente da Câmara e influente entre aliados, Vargas tem colocado em prática uma de suas maiores habilidades: o poder de articulação e de recorrer a diversas manobras para alterar prazos regimentais. Ao longo dos oito meses de processo, Vargas chegou a “desaparecer” da Casa e teve de ser notificado via Diário Oficial para a ação continuar em andamento. Também recorreu ao STF alegando ter tido o direito de defesa cerceado, embora tenha sido reiteradas vezes convidado a depor no Conselho de Ética, e, há três semanas, informou a Mesa Diretora de que havia feito uma cirurgia na boca e precisaria se ausentar. Até a última sexta-feira, o deputado não havia apresentado atestado que comprovasse a situação.
Nos bastidores, a ação é ainda mais contundente. Vargas ameaçou apresentar provas do envolvimento de notáveis petistas no esquema de corrupção, como a senadora Gleisi Hoffmann, o seu marido e ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e o ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha. O silêncio prosperou, e o deputado tem contado com a blindagem de seus aliados para barrar o processo de cassação. Em constante conversa com colegas, ele diz que foi já punido ao ter ficado fora das urnas, já que se desfiliou do PT e não pôde disputar as eleições deste ano, e que não precisaria sofrer novo desgaste perdendo o mandato.
Além de esperar posicionamento do Supremo, que poderia adiar a sessão em plenário, Vargas conta com o baixo quórum nessa reta final de legislatura e também com a falta de ânimo entre os deputados que não foram reeleitos para cassar o seu mandato. “Seria muito ruim um trabalho desse não ter o seu epílogo, que é a votação final. É uma imagem ruim para o Legislativo no ano em que estourou talvez o maior escândalo de corrupção da República. Se for levado a plenário, espero que tenha alguma definição”, disse o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), relator do processo no Conselho de Ética. Para ser cassado, são necessários pelo menos 257 votos.
Impunidade – Um desfecho do caso Vargas, se ocorrer, estará na contramão do sentimento de coleguismo que impera no Congresso Nacional. O Conselho de Ética do Senado está parado desde abril de 2013, apesar da lista de senadores citados em esquemas de corrupção – entre eles o próprio presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Sua última sessão foi realizada apenas para definir os integrantes do colegiado. Já o Conselho de Ética da Câmara recebeu sete representações neste ano, mas apenas pediu a cassação de dois parlamentares: Vargas e Luiz Argôlo (SD-BA), alvo de dois processos no colegiado. Os outros casos foram arquivados sem qualquer punição, que poderia ser mais branda do que a cassação, como um afastamento ou uma advertência.
Também flagrado em estreita relação com o doleiro Alberto Youssef, o deputado Luiz Argôlo teve o pedido de cassação aprovado pelo colegiado no final de outubro, mas seguiu o roteiro protelatório de Vargas e está em situação ainda mais confortável: às vésperas do recesso legislativo e com a ausência de membros da CCJ para julgar seu recurso, ele não deve ter o caso julgado em plenário. Mais: com 63.649 votos neste ano, o deputado baiano não conseguiu se reeleger, mas ficou na primeira suplência e pode votar à Câmara já em 2015. A Casa terá de julgar, em situação inédita, se arquiva o processo ao fim da legislatura ou dá prosseguimento à ação em um eventual retorno de Argôlo.
“Para trabalhar com relatoria no Conselho de Ética tem de ser desapegado, fazer o seu trabalho e não criar expectativas para o andamento dele. Isso é frustrante enquanto parlamentar, porque a sociedade olha para o Congresso e o coloca numa posição menor. Aqui tem pessoas sérias, só que em função de expedientes menores, a Casa acaba sendo colocada como tolerante com o erro e benevolente com quem comete irregularidades”, diz o deputado Marcos Rogério (PDT-RO), relator do processo contra Argôlo.
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