Lava-Jato no Rio investiga políticos que recebiam propina da Delta
Justiça manda prender Cavendish, acusado de pagar propina a políticos
Chico Otavio e Juliana Castro - O Globo
RIO — A recém-criada força-tarefa da Lava-Jato no Rio está investigando quais agentes políticos recebiam propinas do esquema da empreiteira Delta Construções por desvio de verba de obras públicas. Na quinta-feira, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal deflagraram a Operação Saqueador. A ação levou à prisão dos empresários Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e Adir Assad, já condenado a nove anos e dez meses na Lava-Jato e que estava em prisão domiciliar. Há um mandado de prisão contra o ex-dono da Delta Fernando Cavendish, mas ele está no exterior.
A investigação constatou que os envolvidos, “associados em quadrilha", usaram empresas fantasmas para transferir cerca de R$ 370 milhões em propina para agentes públicos. Após as quantias serem repassadas às empresas de fachada, por meio de contratos fictícios, os valores eram sacados em espécie para impedir o rastreamento dos destinatários da propina.
É esse caminho do dinheiro vivo que o Ministério Público Federal tenta elucidar para chegar a políticos e servidores públicos. O GLOBO apurou que possíveis alvos são políticos, entre eles alguns prefeitos, do estado do Rio e da região Centro-Oeste.
Entre as obras da Delta está a reforma do Maracanã. De acordo com os ex-executivos da Andrade Gutierrez Clóvis Primo e Rogério Nora Sá, que fecharam acordo de delação premiada com a Lava-Jato, o então governador do Rio Sergio Cabral (PMDB) cobrou 5% do valor do contrato para permitir que a empresa se associasse à Odebrecht e à Delta (que saiu antes do fim da obra) no Consórcio Maracanã Rio 2014. Cabral nega.
Recentemente, o STF autorizou o uso, nas investigações no Rio, de trechos da delação premiada dos ex-executivos da Andrade Gutierrez. Os depoimentos estão sob sigilo, mas, segundo o MPF, demonstram que a Delta era voltada a esquemas de corrupção em obras públicas, especialmente, no Rio.
Cavendish e Cabral tiveram uma relação estreita, evidenciada pelo acidente de helicóptero que vitimou familiares e pessoas ligadas aos dois, em junho de 2011. Naquela altura, a Delta tinha contratos com o governo do estado.
CAVENDISH SAIU DO PAÍS EM 22 DE JUNHO
O Ministério Público Federal ofereceu esta semana denúncia contra Cavendish, Cachoeira, Adir Assad e mais 20 pessoas por envolvimento no esquema de lavagem de verbas públicas. Segundo o órgão, 96,3% do faturamento da Delta entre 2007 a 2012 era oriundo de verbas públicas, totalizando um montante de quase R$ 11 bilhões, a maior parte vindo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit).
De acordo com o MPF, desse montante cerca de R$ 370 milhões foram desviados e lavados por meio de 18 empresas de fachada. A investigação apontou que os pagamentos da Delta às empresas fantasmas aumentaram significativamente em anos eleitorais.
Os responsáveis pela criação dessas empresas foram Cachoeira, Assad e Marcelo Abbud, que se entregou à PF em São Paulo na noite de quinta-feira. Também foi preso Cláudio Dias Abreu, ex-diretor regional da Delta no Centro-Oeste e Distrito Federal. Os presos ficarão no Rio.
Cavendish foi para a Europa em 22 de junho. Suspeita-se que esteja na Grécia. Tácio Muzzi, chefe da Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros, disse na quinta-feira que não considerava Cavendish foragido porque aguardava contato da defesa do empresário para saber se ele se entregaria. Mas, segundo o delegado, a Interpol será acionada, se necessário. Na casa de Cavendish, um cofre foi apreendido.
A relação entre Cachoeira e Cavendish veio à tona com a Operação Monte Carlo e a CPI do Cachoeira, em 2012. Após o escândalo, a Delta pediu recuperação judicial.
EMPRESAS DE FACHADA NO ESQUEMA
A lista de denunciados pelo procurador da República Leandro Mitidieri por lavagem de dinheiro e associação criminosa inclui executivos, diretores e conselheiros da Delta, proprietários e contadores de empresas fantasmas. Para o MPF, Cavendish liderava a organização criminosa. O caso foi distribuído ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio.
Segundo o MPF, as empresas de Assad e Marcelo Abbud emitiam notas frias não só para a Delta, uma vez que serviam ao esquema de desvios na Petrobras, investigado na Lava-Jato.
— Você tem uma série de elementos para chegar à conclusão de que eram empresas de fachada. Primeiro, pelas informações da Receita Federal. Segundo a ausência de empregados e, por fim, a verificação in loco da PF, que chegava nos endereços da sede e não a encontravam — disse o procurador.
DEFESA SE DIZ “ESTARRECIDA”
A defesa do ex-dono da Delta, em nota, se disse “estarrecida com a decretação de sua prisão” e afirmou que “tomará as providências judiciais para reverter esta insuportável ilegalidade”.
Advogado de Adir Assad e Marcelo Abbud, Miguel Pereira Neto disse ao G1 que pedirá na Justiça que os dois respondam em liberdade. Os advogados de Cachoeira e de Cláudio Abreu disseram que se pronunciarão após terem mais detalhes sobre as denúncias.
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