Análise: Torquato, uma escolha meio Dilma, meio Lula
Novo ministro pode ajudar a salvar Temer da degola como fez Thomaz Bastos com ex-presidente do PT no mensalão
Pedro Dias Leite - O Globo
A decisão de Michel Temer de deslocar o advogado Torquato
Jardim para o Ministério da Justiça remete a nomeações feitas por Luiz
Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que foram essenciais em momentos
de crise.
No auge do mensalão, em 2005, Márcio Thomaz Bastos, no
comando da Justiça desde o início do primeiro mandato de Lula, foi
essencial para para traçar a estratégia jurídica que ajudou a livrar
Lula. O experiente advogado, chamado de "god" (Deus) por seus pares, foi
o principal artífice da tese de que os milhões de reais daquele
escândalo não passavam de "recursos não contabilizados", um eufemismo
para caixa dois, que por si só já era um eufemismo para os crimes de
corrupção do mensalão.
No ano passado, durante o impeachment, outro advogado no
Ministério da Justiça foi fundamental para a defesa de Dilma Rousseff.
Embora derrotado jurídica e politicamente, José Eduardo Cardozo foi o
responsável por martelar em entrevistas e artigos a tese de que aquele
era o julgamento de uma presidente honesta que não havia cometido crime
de responsabilidade.
Com desenvoltura diante dos microfones e das câmeras, não
conseguiu salvar a chefe da guilhotina, mas ajudou a sedimentar a tese
do "golpe" - e foi um dos poucos dilmistas que saíram do processo de
impeachment melhor do que entraram.
Ao nomear Torquato Jardim para a Justiça, Temer tenta construir uma saída mezzo Thomas Bastos, mezzo Cardozo.
O novo titular da pasta transita entre os gabinetes
jurídicos de Brasília há quarenta anos. Ainda no final dos anos 1970,
foi assessor do Supremo Tribunal Federal (onde foi instaurado um
inquérito contra o presidente); nos anos 1980 e 1990, foi ministro do
Tribunal Superior Eleitoral (onde Temer enfrenta um processo de
cassação). Ou seja, terá um papel privilegiado para os chamados
"embargos auriculares", as negociações de bastidor destinadas a
encontrar uma saída jurídica para salvar o mandato do presidente. Essa é
a faceta que remete a Thomaz Bastos.
Por outro lado, é tão loquaz quanto o antecessor dos anos
Dilma. Só nos últimos quatro dias, falou à GloboNews, à "Folha de
S.Paulo", e ao "Estado de S. Paulo". Se se recuar mais algumas semanas,
deu entrevista também ao GLOBO. Fez declarações inclusive ao "Diário do
Piauí", em maio do ano passado, em que minimizou a Lava-Jato. Nas
entrevistas mais recentes, um de seus principais objetivos foi
desqualificar o áudio da comprometedora conversa de Temer com o
empresário Joesley Batista.
As próximas semanas serão decisivas para definir se Torquato
Jardim vai entrar para a história como um ministro que ajudou a salvar
um presidente da degola, como Thomaz Bastos, ou como um auxiliar que
caminhou junto para o cadafalso até o final, como Cardozo.
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