Delegados temem intervenção política na PF para esvaziar Lava-Jato
Aécio e Serra foram flagrados articulando mudança no Ministério da Justiça, lembra associação
Jailton de Carvalho - O Globo
O presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal
(ADPF), Carlos Sobral, criticou a decisão do presidente Michel Temer de
trocar o ministro Osmar Serraglio pelo ministro Torquato Jardim no
comando do Ministério da Justiça. Para Sobral, a mudança pode ser a
senha para uma eventual intervenção política na Polícia Federal com o
objetivo de esvaziar a Lava-Jato e outras investigações sobre corrupção.
O delegado lembra que, em recentes diálogos captados a partir da
delação de executivos da JBS, os senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e José
Serra (PSDB-SP), dois investigados na Lava-Jato, foram flagrados
articulando a saída de Serraglio.
— Essa troca nos traz muitas preocupações sobretudo pelo contexto. Em
dois diálogos publicizados recentemente, dois investigados (Aécio e
Serra) falam sobre a necessidade de trocar o ministro da Justiça por um
outro mais forte. Mais forte no sentido de interferir na PF — afirmou
Sobral.
Os diálogos de Aécio e Serra foram gravados na Operação Patmos, que
já resultou na abertura de inquérito contra Temer, Aécio e outros por
corrupção, obstrução de Justiça e organização criminosa. Numa conversa
com o empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS, Aécio critica uma
suposta falta de pulso de Serraglio, defende a aprovação do projeto
sobre abuso de autoridade e defende a indicação de delegados amigos para
presidir inquéritos contra ele e outros aliados.
"O ministro é um bosta de um caralho, que não dá um alô, peba, está
passando mal de saúde pede pra sair. Michel tá doido. Veio só eu e ele
ontem de São Paulo, mandou um cara lá no Osmar Serraglio, porque ele
errou de novo de nomear essa porra desse (...). Porque aí mexia na PF. O
que que vai acontecer agora? Vai vim um inquérito de uma porrada de
gente, caralho, eles são tão bunda mole que eles não (têm) o cara que
vai distribuir os inquéritos para o delegado. Você tem lá cem, sei lá,
2.000 delegados da Polícia Federal. Você tem que escolher dez caras,
né?, do Moreira, que interessa a ele vai pro João", disse o senador.
Numa outra conversa, Aécio trata do mesmo assunto com Serra. Logo
depois que as delações da Odebrecht foram tornadas públicas, Serra liga
para o colega e também defende a saída de Serraglio.
"Deixa eu te falar uma coisa, cara. Eu tô preocupado. Olhando do
ponto de vista macro, né... da política. Eu acho que precisa ter um
ministro da Justiça forte, viu Aécio". Do outro lado da linha, veio o
reforço. "Eu também acho. Sempre achei", responde Aécio. "E realmente
forte. Não precisa ser da área, porque vai ficar da área... vai ficar
aquele problema todo " acrescenta Serra. A partir daí, os dois decidem
tratar no assunto numa conversa pessoal.
Segundo Sobra, um ministro da Justiça pode interferir de várias
maneiras para enfraquecer a atuação da polícia. Uma delas é o corte de
verbas para grandes operações. Uma outra é a indicação política para
cargos estratégicos da instituição.
— Sem autonomia, a Polícia Federal é muito dependente do ministro da Justiça — afirma o delegado.
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