Supremo pode prejudicar combate à corrupção
Além dos riscos no Congresso, a Lava-Jato e
outras operações do tipo passam a enfrentar o perigo da revisão pela
Corte de decisão sobre cumprimento de pena
O Globo
Enquanto o cenário político é tomado pela crise em torno do presidente Michel
Temer, desfechada pela delação de Joesley Batista, do JBS, ressurgem
ameaças à Lava-Jato, e a qualquer outra operação contra a corrupção. Não
são assuntos desconexos — as ameaças e Temer —, porque o novo ataque ao
trabalho da força-tarefa de Curitiba pode tirar força do Ministério
Público e da Justiça para que levem denunciados a fechar acordos de
delação —, sem os quais não se saberia hoje a que ponto chegou a
associação de partidos políticos e empresários para desviar dinheiro
público de estatais.
O novo risco vem da defesa feita pelo ministro do Supremo Gilmar
Mendes para que a Corte reexamine decisão reafirmada em outubro do ano
passado, segundo a qual sentença confirmada em segunda instância pode
começar a ser cumprida, enquanto recorre-se a instâncias superiores.
Este voto vencedor — por seis a cinco — teve efeito vinculante, ou seja,
precisa ser seguido por todos os tribunais.
Naquela ocasião, o ministro Dias Toffoli sugeriu que o réu ainda
pudesse recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) em liberdade, no
caso de prisão. Ao ter rejeitado o recurso, em terceira instância, aí,
sim, passaria a cumprir a pena.
Gilmar Mendes se diz agora convertido à proposta de Toffoli. Isso
significa que, colocado o assunto novamente em votação, a tese de
permitir mais um recurso aos condenados nas duas primeiras instâncias
tem grandes chances de ser vencedora. Confirma-se, infelizmente, que as
maquinações contra a Lava-Jato não estão apenas no Congresso, mas se
infiltraram no Supremo. Consta, não se deve esquecer, que a
possibilidade de prisão na rejeição de recurso na segunda instância
teria convencido a cúpula da Odebrecht a fechar o acordo de delação
premiada.
Um aspecto grave é que isso ocorre depois dos testemunhos de Joesley
Batista que envolvem Michel Temer, a cúpula do PMDB, o presidente do
PSDB, Aécio Neves, além de Lula e Dilma Rousseff. As delações da JBS e
da Odebrecht atingem o núcleo do poder político, e, por isso, dão rara
chance de haver de fato uma limpeza histórica na vida pública — se forem
conjugadas a uma reforma política sensata. O Supremo precisa ser firme,
ainda mais nesta hora, e não desarmar as primeiras instâncias do
Judiciário e o MP nesta luta contra a corrupção, justo quando se
aproximam julgamentos-chave na Lava-Jato. Para completar o
estrangulamento da Lava-Jato, faltará apenas o relaxamento de prisões
preventivas.
Cabe relembrar que um dos objetivos prioritários dos interessados em
esvaziar a Lava-Jato tem sido afastar ao máximo a possibilidade de
acusados de corrupção serem presos. O assunto foi levantado na conversa
gravada pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado com
peemedebistas de primeira linha — Renan, Jucá, Eunício, Sarney — sobre
como parar com as delações. Com o Congresso paralisado pela crise,
restou o Supremo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário