Ambiguidade na política e ajuste fiscal
Tudo o que Levy representa foi promovido pelos políticos profissionais do PT liderados por Lula
Samuel Pessôa - FSP
A semana passada iniciou-se com fortes dúvidas sobre o real apoio ao
ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por parte da presidente e,
principalmente, do grupo político que lidera o Executivo nacional há 12
anos e meio.
Na sexta feira, 22 de maio, a divulgação do contingenciamento do gasto
não contou com a presença do ministro Levy, que alegou gripe.
Anteriormente, o ministro a- firmara que o contingenciamen- to deveria
ser entre R$ 70 bilhões e R$ 80 bilhões.
Nelson Barbosa, ministro do Planejamento, cravou R$ 69,9 bilhões.
Adicionalmente, apareceu sinal de fratura da base do PT no Congresso. O
senador Lindbergh Farias (PT-RJ) criticou pesadamente as medidas
provisórias que coíbem excessos de diversos programas sociais.
Essas fraturas foram graves em razão da proximidade de Nelson Barbosa e Lindbergh com o ex-presidente Lula.
Por que motivo Lula desejaria enfraquecer o ministro Levy? Tudo o que
Levy representa --o recuo no experimento de política econômica,
conhecido por nova matriz econômica, e o retorno ao regime mais liberal
que vigorou no período "Malocci" (Malan e Palocci)-- foi promovido pelos
políticos profissionais do PT liderados por Lula!
A coisa ficou mais complicada com a coluna de Claudia Safatle,
experiente e respeitada jornalista, no jornal "Valor Econômico" de
terça-feira, 26 de maio, alegando haver divergência fundamental entre
Barbosa e Levy: este deseja fazer o ajuste reduzindo a despesa, e
aquele, pela elevação da receita.
As medidas provisórias votadas e aprovadas na semana passada no Senado
--que ajustam os critérios de elegibilidade e o valor do be- nefício dos
programas de pensão por morte, seguro-desemprego, seguro-defeso e abono
salarial-- sempre tiveram total apoio do ministro do Planejamento e
foram, aliás, assinadas ainda no fim do ano passado, pelo ex-ministro
Guido Mantega.
O fim da primeira rodada do ajuste fiscal requer, além dessa aprovação
das duas MPs sociais, que ocorreu na semana passada, a aprovação do
projeto de lei que desfaz os excessos da desoneração da folha de
salários.
Esse é somente o começo. Há um buraco fiscal enorme e não está claro
como ele será fechado. De quanto é o buraco? No ano pas- sado, tivemos
deficit primário de 0,6% do PIB. É necessário termos um superavit de 2% a
2,5%. Ou seja, temos um buraco de 2,6% a 3,1% do PIB.
Nos 23 anos entre 1991 e 2014, o gasto não financeiro da União cresceu
9,1 pontos percentuais do PIB, ou 0,39 ponto percentual do PIB todo ano.
Somente as principais rubricas do gasto social cresceram 6,8 pontos
percentuais do PIB, ou 0,30 ponto percentual por ano.
Se nada for feito, o buraco de 2,6% a 3,1% do PIB será em 2018 de 4,2% a
4,7% do PIB. As MPs votadas na semana passada são um primeiro pequeno
passo na direção de ajustar esse desequilíbrio.
Tapar o buraco fiscal e evitar crise fiscal de grandes proporções nos
próximos anos requererá muito trabalho legislativo. Será necessário
refazer os critérios de elegibilidade e o valor do benefício de inúmeros
programas sociais, ou seja, teremos que repactuar o contrato social;
nova rodada de elevação de tributos; e nova desvinculação de receita da
União (DRU). Fico cansado só de teclar toda a pauta fiscal dos próximos
semestres.
Nelson, Lula e Lindbergh sabem disto. Difícil entender a ambiguidade ante o tamanho da empreitada.
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