Terror exige ação de líderes religiosos e governos islâmicos
Mais do que ação militar e vigilância, o
extremismo de grupos muçulmanos precisa ser combatido no campo
ideológico e por meio da garantia de cidadania
O Globo
Três atentados quase simultâneos perpetrados por radicais muçulmanos
voltaram a chocar a comunidade internacional ontem. Na praia de Sousse,
um dos balneários turísticos mais populares da Tunísia, pelo menos 37
pessoas morreram e outras 36 ficaram feridas depois que homens abriram
fogo contra turistas. Segundo o governo, entre os mortos estão
britânicos, alemães e belgas. Na capital do Kuwait, o ataque de um
homem-bomba à mesquita xiita al-Iman al-Sadeq, uma das maiores do país,
deixou 25 mortos e mais de 200 feridos. A ação foi reivindicada por uma
facção do Estado Islâmico (EI), grupo sunita. Na França, um homem foi
decapitado e outras duas pessoas ficaram feridas em um ataque a uma
usina química próxima a Lyon.
Os atentados mostram que a guerra santa no Oriente Médio não é apenas
contra o Ocidente e seus valores seculares, mas igualmente entre
facções muçulmanas. No mesmo dia dos ataques, um porta-voz do EI
exortava os fieis a transformarem o Ramadã — o período sagrado de
orações entre muçulmanos — numa “época de calamidade para os infiéis”,
visando cristãos, xiitas e até mesmo sunitas que não compartilham a
ideologia do Levante, defendida pelo grupo.
Chama a atenção, além da carnificina óbvia, a ressonância crescente
da retórica jihadista de grupos como EI, especialmente sobre corações e
mentes de jovens muçulmanos em todo o mundo. Os extremistas conseguem
convencer inclusive segmentos de classe média bem estabelecidos em
países europeus e nos EUA, que abandonam seus lares e familiares para se
unir à frente de batalha ou praticar ações terroristas como os
atentados da Maratona de Boston.
Como chamou a atenção o jornalista Rasheed Abou-Alsamh, em artigo no
GLOBO, o canto da sereia do EI, disseminada de forma inteligente por
redes sociais da internet, se baseia na promessa de criação um califado
no Oriente Médio. Trata-se de uma espécie de utopia islâmica, com
sociedades governadas por líderes devotados capazes de garantir
segurança e acesso a serviços básicos, ao mesmo tempo em que se empenham
em aniquilar os infiéis. No Iraque, por exemplo, o grupo cresceu no
vazio deixado pelo governo. Em todas as cidades conquistadas em sua
ofensiva militar, implementou infraestrutura de eletricidade e
saneamento básico, antes inexistente ou precária.
Vigilância,
ações militares e bombardeios têm se mostrado ineficazes para conter o
radicalismo islâmico, quer sua expansão no Oriente Médio, quer a
realização de atentados como os de ontem. Isto porque a batalha
principal da guerra santa ocorre na esfera ideológica. Por isso, cabe
ressaltar a imensa responsabilidade dos líderes religiosos muçulmanos na
desconstrução da versão distorcida do Islã dos extremistas; bem como
dos governos dos países islâmicos, para oferecer um mínimo de dignidade
às suas populações.
Nenhum comentário:
Postar um comentário