A Operação Carne Fraca levantou muitas dúvidas. Nós checamos
O Globo
A Operação Carne Fraca, deflagrada na sexta-feira pela Polícia
Federal após dois anos de investigação, atingiu grandes empresas do
setor de carnes e levantou dúvidas sobre a qualidade dos produtos.
Reunimos aqui as informações sobre alguns dos questionamentos.
Todos os frigoríficos citados na Operação Carne Fraca fizeram irregularidades na produção de alimentos?
A Polícia Federal não detalhou as irregularidades praticadas por cada frigorífico na Operação Carne Fraca.
Citou mais genericamente alguns exemplos de fraudes na produção de
alimentos, como uso de carne estragada em embutidos, "maquiagem" de
carne estragada com substâncias químicas, carne com salmonela, injeção
de água no frango e uso de cabeça de porco em embutidos.
Entre os frigoríficos citados pela Operação Carne Fraca, estão JBS,
Big Frango, BRF, Peccin, Dagranja, Frango a Gosto, E.H. Constantino,
Frigobeto, Frigomax, Frigorífero 3D, Frigorífero Argus, Frigorífero
Larissa, Frigorífero Oregon, Frigorífero Rainha da Paz, Frigorífero
Souza Ramos, Mastercarnes, Novilho Nobre, Primor Beef, Central de Carnes
Paraense, Fábrica de Farinha de Carnes Castro, Artacho Casings,
Smartmeal. A JBS é dona das marcas Friboi e Seara. A BRF é dona das
marcas Sadia e Perdigão.
Pedaços de papelão foram usados nas carnes?
A Polícia Federal afirmou que carnes eram misturadas com papelão.
Mas, de acordo com nota da BRF, houve um equívoco na interpretação do
áudio capturado pelos investigadores. A empresa sustenta que o
funcionário gravado, ao mencionar o papelão, estava se referindo às
embalagens do produto e não ao seu conteúdo. A BRF afirma ainda que esse
produto é normalmente embalado em plástico e que, na frase seguinte, o
empregado “deixa claro que, caso não obtenha a aprovação para a mudança
de embalagem, terá de condenar o produto, ou seja, descartá-lo”. O
ministro da Agricultura, Blairo Maggi, também afirmou que a narrativa da
PF foi mal interpretada. Segundo ele, é uma “idiotice” imaginar que as
empresas misturassem papelão à carne.
Ácido ascórbido é cancerígeno?
Segundo apurou a BBC, a OMS diz que o ácido ascórbico pode contribuir
com distúrbios gastrointestinais, cálculos renais e outros problemas de
saúde se for consumido em excesso e por longos períodos de tempo, mas
não há evidência de relação direta com o câncer. No despacho do juiz que
autorizou as prisões na Operação Carne Fraca, há relatos de fiscais
sobre uso de ácido ascórbico pelo frigorífico Peccin, para maquiar carne
em mau estado.
Mas vale ressaltar que, na reprodução de um diálogo dessa empresa,
que consta do mesmo documento, o interlocutor cita outra substância: o
ácido sórbico, que também é usado como conservante.
Em entrevista ao "Fantástico", o fiscal sanitário Daniel Gouvêa
Teixeira, que denunciou o esquema à Polícia Federal, afirmou que o
frigorífico Peccin usava ácido sórbico para enganar o consumidor. Ele
explicou que o ácido sórbico é um descontaminante misturado na massa dos
produtos para poder diminuir a contaminação bacteriana e mascarar os
odores e as características da carne.
Há recomendação oficial para parar de comer carne?
Não há recomendação oficial para suspender o consumo de carne.
Especialistas avaliam que as irregularidades são pontuais e que a carne
produzida no Brasil é de alta qualidade. Mas o consumidor deve olhar a
qualidade dos produtos. A carne imprópria para consumo, seja bovina,
suína ou de frango, apresenta normalmente cor, odor e textura alterados.
Na dúvida sobre a adequação do produto, recomenda-se entrar em contato
com o supermercado ou com o fabricante. Se o cheiro, a cor ou a
aparência estiverem estranhos, não consuma. Em última análise, deve-se
recorrer aos órgãos de defesa do consumidor e à Vigilância Sanitária.
Se o consumidor está com receio de consumir ou tem alguma dúvida
sobre a procedência ou a qualidade do produto que tem em casa, pode
ligar para a Vigilância Sanitária pelo 1746 e solicitar o recolhimento
da peça para que seja feita análise da mercadoria.
Devo descartar os produtos que tenho em casa?
Não. Em primeiro lugar, porque ainda não se sabe precisamente quais
produtos estão, de fato, impróprios para o consumo. Além disso, em caso
de recall é preciso ter o produto para fazer jus à indenização.
Será feito um recall das carnes?
Segundo o secretário-executivo do Ministério da Agricultura, os
códigos de barra dos produtos dos três frigoríferos em que as fraudes
foram confirmadas começarão a ser rastreados dia 20 de março. Mas não
esclareceu se será feito um recall nem como ele seria realizado. A
Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), do Ministério da Justiça,
também notificou as empresas e pediu esclarecimentos para verificar se
seria o caso de um recall.
Cabeça de porco em embutidos é uma fraude?
A PF afirma que, nas gravações, sócios de um frigorífico falam sobre o
uso de carne de cabeça de porco na produção de embutidos, o que,
segundo a polícia, é proibido. O ministro da Agricultura, Blairo Maggi,
afirmou que o uso de carne de cabeça de porco, em determinados
percentuais e em alguns produtos, é permitido por lei.
E a salmonela encontrada na carne da BRF, era fraude?
Segundo a Polícia Federal, a partir de áudios da investigação, havia
carnes contaminadas com salmonela em sete contêineres da companhia que
seriam exportados para a Europa. No entanto, a BRF (dona das marcas
Sadia e Perdigão, entre outras) sustenta que o tipo de bactéria
(Salmonella Saint Paul) é tolerado pela legislação europeia para carnes
in natura, e, portanto, não impediria a entrada do produto no
continente.
O governo sabe para onde foi a carne investigada?
As investigações foram conduzidas por dois anos e não é possível
saber exatamente o destino da carne. Porém, segundo o governo, será
possível identificar o que foi destinado para exportação. Segundo o
Ministério da Agricultura, os códigos de barra dos produtos dos três
frigoríficos que foram fechados começarão a ser rastreados esta semana.
Países importadores já estão suspendendo a compra de carne brasileira?
A carne brasileira já sofre barreiras no exterior.
A China determinou a suspensão temporária de importação de carne
brasileira. A Coreia do Sul anunciou que vai banir temporariamente as
importações de frango brasileiro do grupo BRF. O Chile também decidiu
pelo encerramento temporário de suas importações de carne do Brasil,
informou o ministério da Agricultura.
Já a Comissão Europeia pediu ao Brasil que não permita a exportação
de carnes para a Europa de frigoríficos envolvidos no escândalo da Carne
Fraca, segundo o jornal "Valor Econômico". Segundo o porta-voz para
Saúde e Segurança Alimentar, Enrico Brivio, a região não está
suspendendo a entrada da carne brasileira. "O que pedimos foi para o
Brasil não continuar a exportação dos frigoríficos investigados”. Ao
mesmo tempo, os países europeus vão dobrar a vigilância na checagem da
carne que está chegando nos portos.
O funcionário da JBS detido trabalhava para o governo?
As explicações são conflitantes.
Flavio Cassou, funcionário da Seara (uma das marcas do JBS) detido na
Operação Carne Fraca, foi apresentado pela Polícia Federal como
executivo do grupo. Mas Cassou trabalharia, segundo uma nota da empresa
divulgada na sexta-feira, como “médico veterinário, funcionário da
companhia, cedido ao Ministério da Agricultura”. O ministro da
Agricultura, em entrevista ao GLOBO, afirmou: “Não existe isso, toda a
fiscalização é feita por técnicos públicos, não há possibilidade de
termos pessoas privadas cedidas por empresas para fazer esse controle,
sempre são servidores públicos”. A JBS, por sua vez, enviou nova nota,
na qual afirma que o funcionário estaria “a serviço do governo”. O
sistema de fiscalização sanitária brasileiro prevê que a verificação de
qualidade das carnes é de responsabilidade da empresa. Ela realiza os
testes e repassa os resultados aos servidores do Ministério da
Agricultura, que são responsáveis por verificar a veracidade dos dados e
se aquele produto, com aqueles índices, pode ir para as prateleiras dos
supermercados.
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