Rodrigo Constantino
Geração mimimi, ou geração “Metholate que não arde”. O fenômeno parece evidente: os millennials não
parecem preparados para a vida, pois vivem em bolhas protegidos de
tudo, até de ofensas e “microagressões”, em “locais seguros” inclusive
nas universidades.
Crianças “brincam” em locais cada vez mais controlados, sem “riscos”, e com os pais no comando. Policiais são chamados para prender crianças
que cortam galhos de árvore, rolam na grama ou tentam vender suco na
esquina, sem licença estatal. A paranoia salta aos olhos: perigo, perigo
por toda parte! É preciso fechar os pimpolhos numa redoma.
Os efeitos dessa postura superprotetora
podem ser observados facilmente. Os jovens de hoje estão hipersensíveis,
despreparados para o mundo real, confundindo seus desejos com direitos
inalienáveis. Eles estão mimados, em suma.
Jonathan Haidt, autor do excelente The Righteous Mind, que resenhei aqui, escreveu um importante ensaio
sobre a “geração frágil” com Lenore Skenazy, para a reason.com. Os
autores procuram mostrar como o excesso de zelo com a segurança dos
filhos acabou tendo um efeito bumerangue, e hoje eles se encontram mais
fragilizados e incapazes de vencer as batalhas da vida. Eles escrevem:
Tivemos
as melhores intenções, é claro. Mas os esforços para proteger nossos
filhos podem ter ricocheteado. Quando criamos crianças que não estão
acostumadas a enfrentar qualquer coisa por conta própria, incluindo
riscos, falhas e sentimentos feridos, nossa sociedade e até nossa
economia estão ameaçadas. No entanto, as práticas e leis modernas de
criação de filhos parecem quase todas concebidas para cultivar essa
falta de preparação. Há o medo de que tudo o que as crianças vejam,
façam, comam, ouçam e lambam possa machucá-las. E há uma crença mais
nova que tem se espalhado através da educação superior de que palavras e
ideias podem traumatizar.
O que pode ter levado a isso? Os autores apresentam algumas possibilidades:
A
partir da década de 1980, a infância americana mudou. Por uma variedade
de razões – incluindo mudanças nas normas parentais, novas expectativas
acadêmicas, aumento da regulamentação, avanços tecnológicos e,
especialmente, um maior medo do sequestro (as crianças desaparecidas em
desenhos fizeram sentir como se esse crime extremamente raro fosse
desenfreado) – os filhos em grande parte perderam a experiência de ter
grandes intervalos de tempo sem supervisão para jogar, explorar e
resolver conflitos por conta própria. Isso os deixou mais frágeis, mais
facilmente ofendidos e mais dependentes de outros. Eles foram ensinados a
buscar figuras de autoridade para resolver seus problemas e protegê-los
de desconforto, uma condição que os sociólogos chamam de “dependência
moral”.
E como essa situação pode prejudicar os próprios jovens?
Isso
representa uma ameaça para o tipo de abertura e flexibilidade que os
jovens precisam para prosperar na faculdade e além. Se eles chegam na
escola ou começam carreiras desacostumados a frustração e
mal-entendidos, podemos esperar que eles sejam hipersensíveis. E se eles
não desenvolvem os recursos para trabalhar através de obstáculos, os
montinhos parecem ser montanhas.
Esta
ampliação do perigo e da dor é prevalente no campus hoje. Já não
importa o que uma pessoa pretendia dizer, ou como um ouvinte razoável
interpretaria uma declaração – o que importa é se alguém se sente
ofendido por isso. Em caso afirmativo, o falante cometeu uma
“microagressão”, e a reação puramente subjetiva da parte ofendida é uma
base suficiente para enviar um email ao reitor ou abrir uma queixa à
“equipe de resposta de viés” da universidade. O efeito líquido é que
tanto professores como estudantes hoje relatam que estão caminhando em
cascas de ovos. Isso interfere no processo de indagação gratuita e
debate aberto – os ingredientes ativos em uma educação universitária.
A
nova geração tem valorizado cada vez menos a Primeira Emenda, que
garante a liberdade de expressão, e cada vez mais a “polícia do
pensamento”, que controla o que cada um pensa e diz para não “ofender”
ninguém (a menos, claro, que seja um homem branco heterossexual cristão
ou judeu). Os autores resumem o ponto:
Pais
e professores estão falando sobre a crescente fragilidade que eles
vêem. É difícil evitar a conclusão de que a superproteção das crianças e
a hipersensibilidade dos estudantes universitários podem ser dois lados
da mesma moeda. Ao tentar tanto proteger nossos filhos, estamos fazendo
com que eles fiquem muito seguros para ter sucesso.
Vejam aqui a entrevista de Lenore para a reason.com:
Crianças aprendem fazendo,
acima de tudo. Como diz o velho ditado, “prepare seu filho para o
caminho, não o caminho para seu filho”. Os pais de hoje têm ignorado
essa importante lição. Os autores depositam suas esperanças nas
brincadeiras, mais soltas e livres. É como os demais mamíferos aprendem
coisas importantes para eles. Eles dizem:
No
jogo livre, idealmente com crianças de idades misturadas, as crianças
decidem o que fazer e como fazê-lo. Isso é trabalho em equipe,
literalmente. As crianças pequenas querem desesperadamente ser como as
crianças maiores […]. Esta é a base da maturidade.
Um
conhecido brincou outro dia: “No meu tempo, perdia aquele que chorasse
primeiro diante das provocações; hoje ganha o que chora primeiro!”
Ninguém precisa negar os perigos do bullying sistemático e agressivo
para reconhecer que a paranoia com qualquer bullying foi longe demais,
impedindo os garotos e garotas de criar cascas mais grossas e
resistentes para a vida lá fora. Eles concluem:
Ao
tentar manter as crianças a salvo de todos os riscos, obstáculos,
sentimentos doloridos e medos, nossa cultura tirou as oportunidades que
eles precisam para se tornarem adultos bem-sucedidos. Ao tratá-los como
uma frágeis – emocional, social e fisicamente, a sociedade realmente os
faz assim.
É
hora de “tocar a real” para a garotada, permitir que vivam um pouco
mais a vida, de forma mais solta e, sim “arriscada”, pois a alternativa
é, além de sufocante, mais perigosa ainda, e vai acabar matando a coisa
que mais importa: a liberdade.
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