Discurso de Obama na Europa deveria ter evitado clichês
Roger Cohen As democracias ocidentais não têm apelo quando falham com seus próprios cidadãos.
Tendo deslocado a atenção para a Ásia e feito o mínimo necessário ao
longo de vários anos para manter a aliança transatlântica fora do
suporte à vida, Barack Obama despertou repentinamente para a Europa
nesta semana e, em sua primeira visita a Bruxelas como presidente, falou
de "aliados inseparáveis" com uma missão compartilhada de demonstrar
que a Rússia não pode "passar por cima de seus vizinhos".
Abalado pela visão da Europa como sendo uma espécie de bocejo do século 20, Obama falou de liberdade e das ideias que unem Estados Unidos e Europa, ainda em uma "disputa de ideias" contra a autocracia e a "força bruta". Ele rejeitou acertadamente a noção de esta ser "outra Guerra Fria em que estamos entrando", notando que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, não representa uma ideologia global.
Ele falou oportunamente sobre "nosso dever segundo o Artigo 5º" do Tratado do Atlântico Norte de responder com força a qualquer ataque a um país da Otan, uma importante reafirmação para os Estados bálticos, entre outros. Esse compromisso militar foi apoiado pela referência à necessidade de "planos de contingência reais" para a proteção dos países da Otan no centro e leste da Europa.
Esses planos, até o momento, são inadequados. No geral, a combinação de sanções contra a Rússia, apoio econômico à Ucrânia e o envio de forças militares adicionais para o leste enviaram uma mensagem clara para Putin, que não reverterá a anexação da Crimeia pela Rússia, mas que pode impedi-lo de ir além.
Antes tarde do que nunca: o presidente russo se beneficiou da percepção dos Estados Unidos em retirada rápida, cansados de guerra; das linhas vermelhas americanas que se tornam âmbar e depois verdes; de uma União Europeia dividida; de uma Otan oca vivendo mais do passado do que de alguma visão de um futuro no século 21. Obama está tentando recuperar o terreno perdido.
Mesmo assim, seu discurso em Bruxelas, apresentado como pedra angular de sua visita e um daqueles especiais de Obama que buscam compensar com eloquência um deficit de realizações, teve um desempenho fraco no geral, uma coleção desinteressante de panaceias sobre valores que unem as sociedades ocidentais de livre mercado e seu apelo aos corações (e bolsos) de pessoas por todo o mundo, não menos na Ucrânia.
O problema não é o que foi dito não ser verdade. Os Estados Unidos e a União Europeia ainda são ímãs para os pobres e destituídos da Terra. O problema não é nem mesmo o argumento de que a Guerra no Iraque (com sua grande quantidade de mortos) é de algum modo mais defensável do que a Crimeia é impossível de vencer. O problema é que Obama precisava ser mais honesto.
O fato é que as democracias ocidentais que ele estava exaltando têm fracassado em atender seus cidadãos, e os autocratas do mundo, incluindo Putin, têm se beneficiado com o desencanto resultante.
Não é apenas o desemprego elevado na Europa (que provavelmente levará a um aumento dos partidos direitistas anti-imigrantes no Parlamento Europeu nas eleições deste ano). Não é apenas a crise do euro (contida por ora) e a questão não resolvida de como será conseguida a integração europeia necessária para o apoio à moeda.
Não é apenas a desilusão disseminada com uma União Europeia voltada para o umbigo, vista como excessivamente burocrática e pouco democrática. Não é apenas a crescente desigualdade de renda tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, e a distopia crescente da classe média, e a sensação nas democracias em ambos os lados do Atlântico de que o dinheiro interfere na justiça e nos próprios processos eleitorais. Não é apenas a sensação de que algo está seriamente errado na polarizada democracia americana, onde republicanos derrotados dedicam sua política à obstrução e o governo pode até mesmo ser paralisado, como ocorreu no ano passado, e um presidente-executivo pode ganhar US$ 80 milhões em poucas semanas de trabalho, enquanto a renda da maioria dos americanos está estagnada.
Não é apenas a revelação de grampos e coleta de dados pela Agência de Segurança Nacional. Não é apenas a perda do senso de possibilidade para muitos jovens.
É tudo isso. A menos que as sociedades ocidentais encontrem uma forma de se livrarem de sua morosidade, igualarem o campo de jogo e redescobrirem, como colocou Obama, a "verdade simples de que todos os homens e mulheres são criados iguais", elas terão muita dificuldade em vencer "a disputa de ideias".
Em vez de um discurso cansado de merecimento, Obama deveria ter falado sobre como uma aliança negligenciada durante grande parte de sua presidência pode ser ressuscitada; e como as democracias europeias e a americana, apesar de todas as suas falhas, podem se endireitar, porque essa é a maior característica que distingue as sociedades abertas –sua capacidade de renovação.
"Agora não é hora de barulho", disse Obama. "A situação na Ucrânia, como crises em muitas partes do mundo, não tem uma resposta fácil e nem uma solução militar."
É verdade. Mas não é hora de clichês sobre as maravilhas da democracia, liberdade e economias de livre mercado, estado de direito e outros alicerces do Ocidente. Não quando as democracias parecem bloqueadas, a liberdade às vezes seletiva, os mercados abertos cruéis e a lei mais dura contra aqueles que têm menos.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
Abalado pela visão da Europa como sendo uma espécie de bocejo do século 20, Obama falou de liberdade e das ideias que unem Estados Unidos e Europa, ainda em uma "disputa de ideias" contra a autocracia e a "força bruta". Ele rejeitou acertadamente a noção de esta ser "outra Guerra Fria em que estamos entrando", notando que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, não representa uma ideologia global.
Ele falou oportunamente sobre "nosso dever segundo o Artigo 5º" do Tratado do Atlântico Norte de responder com força a qualquer ataque a um país da Otan, uma importante reafirmação para os Estados bálticos, entre outros. Esse compromisso militar foi apoiado pela referência à necessidade de "planos de contingência reais" para a proteção dos países da Otan no centro e leste da Europa.
Esses planos, até o momento, são inadequados. No geral, a combinação de sanções contra a Rússia, apoio econômico à Ucrânia e o envio de forças militares adicionais para o leste enviaram uma mensagem clara para Putin, que não reverterá a anexação da Crimeia pela Rússia, mas que pode impedi-lo de ir além.
Antes tarde do que nunca: o presidente russo se beneficiou da percepção dos Estados Unidos em retirada rápida, cansados de guerra; das linhas vermelhas americanas que se tornam âmbar e depois verdes; de uma União Europeia dividida; de uma Otan oca vivendo mais do passado do que de alguma visão de um futuro no século 21. Obama está tentando recuperar o terreno perdido.
Mesmo assim, seu discurso em Bruxelas, apresentado como pedra angular de sua visita e um daqueles especiais de Obama que buscam compensar com eloquência um deficit de realizações, teve um desempenho fraco no geral, uma coleção desinteressante de panaceias sobre valores que unem as sociedades ocidentais de livre mercado e seu apelo aos corações (e bolsos) de pessoas por todo o mundo, não menos na Ucrânia.
O problema não é o que foi dito não ser verdade. Os Estados Unidos e a União Europeia ainda são ímãs para os pobres e destituídos da Terra. O problema não é nem mesmo o argumento de que a Guerra no Iraque (com sua grande quantidade de mortos) é de algum modo mais defensável do que a Crimeia é impossível de vencer. O problema é que Obama precisava ser mais honesto.
O fato é que as democracias ocidentais que ele estava exaltando têm fracassado em atender seus cidadãos, e os autocratas do mundo, incluindo Putin, têm se beneficiado com o desencanto resultante.
Não é apenas o desemprego elevado na Europa (que provavelmente levará a um aumento dos partidos direitistas anti-imigrantes no Parlamento Europeu nas eleições deste ano). Não é apenas a crise do euro (contida por ora) e a questão não resolvida de como será conseguida a integração europeia necessária para o apoio à moeda.
Não é apenas a desilusão disseminada com uma União Europeia voltada para o umbigo, vista como excessivamente burocrática e pouco democrática. Não é apenas a crescente desigualdade de renda tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, e a distopia crescente da classe média, e a sensação nas democracias em ambos os lados do Atlântico de que o dinheiro interfere na justiça e nos próprios processos eleitorais. Não é apenas a sensação de que algo está seriamente errado na polarizada democracia americana, onde republicanos derrotados dedicam sua política à obstrução e o governo pode até mesmo ser paralisado, como ocorreu no ano passado, e um presidente-executivo pode ganhar US$ 80 milhões em poucas semanas de trabalho, enquanto a renda da maioria dos americanos está estagnada.
Não é apenas a revelação de grampos e coleta de dados pela Agência de Segurança Nacional. Não é apenas a perda do senso de possibilidade para muitos jovens.
É tudo isso. A menos que as sociedades ocidentais encontrem uma forma de se livrarem de sua morosidade, igualarem o campo de jogo e redescobrirem, como colocou Obama, a "verdade simples de que todos os homens e mulheres são criados iguais", elas terão muita dificuldade em vencer "a disputa de ideias".
Em vez de um discurso cansado de merecimento, Obama deveria ter falado sobre como uma aliança negligenciada durante grande parte de sua presidência pode ser ressuscitada; e como as democracias europeias e a americana, apesar de todas as suas falhas, podem se endireitar, porque essa é a maior característica que distingue as sociedades abertas –sua capacidade de renovação.
"Agora não é hora de barulho", disse Obama. "A situação na Ucrânia, como crises em muitas partes do mundo, não tem uma resposta fácil e nem uma solução militar."
É verdade. Mas não é hora de clichês sobre as maravilhas da democracia, liberdade e economias de livre mercado, estado de direito e outros alicerces do Ocidente. Não quando as democracias parecem bloqueadas, a liberdade às vezes seletiva, os mercados abertos cruéis e a lei mais dura contra aqueles que têm menos.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
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