Reinaldo Azevedo - VEJA
Não tem
jeito: a cada enxadada, uma minhoca. Raia o dia, e lá vem uma nova
informação sobre a compra da refinaria de Pasadena que empurra mais e
mais o caso para a esfera da polícia — embora, é evidente, ele seja
também um caso de política. Ora, se é assim que a Petrobras executa as
suas aquisições, e dado que um de seus mais importantes ex-diretores
está na cadeia, a gente imagina o padrão de governança da empresa.
Salvem a Petrobras antes que acabe! R$ 200 bilhões em valor de mercado
já foram para o ralo da irresponsabilidade petista. O que sobrou é menos
da metade do que havia há três anos. A Petrobras tem de ser devolvida a
seus legítimos donos: o povo brasileiro, representado pelo Estado, e os
acionistas minoritários, que estão sendo logrados.
Como já se
sabe, os próprios belgas da Astra, ao vender a primeira metade da
refinaria à Petrobras, saudaram o negócio excepcional e o ganho acima de
qualquer expectativa. Na Folha deste sábado, há uma reportagem sobre
os desentendimentos entre a Astra e a Petrobras. Reproduzo trecho (em
vermelho) do texto de Isabel Fleck, Raquel Landim e David Friedlander.
Volto em seguida.
Os executivos da Petrobras faziam muita “besteira”, eram “extravagantes” nos gastos e qualquer decisão levava “10 vezes mais tempo que o necessário”. Era assim que os belgas da Astra se referiam aos seus sócios brasileiros na refinaria de Pasadena, no Texas (EUA).
Os comentários pejorativos de Mike Winget, presidente da Astra, e seu diretor de operações, Terry Hammer, aparecem numa troca de e-mails com outras cinco pessoas da equipe, datada de 2 de novembro de 2007 e obtida pela Folha na Justiça do Texas.
Os executivos da Petrobras faziam muita “besteira”, eram “extravagantes” nos gastos e qualquer decisão levava “10 vezes mais tempo que o necessário”. Era assim que os belgas da Astra se referiam aos seus sócios brasileiros na refinaria de Pasadena, no Texas (EUA).
Os comentários pejorativos de Mike Winget, presidente da Astra, e seu diretor de operações, Terry Hammer, aparecem numa troca de e-mails com outras cinco pessoas da equipe, datada de 2 de novembro de 2007 e obtida pela Folha na Justiça do Texas.
Retomo
O clima era beligerante, havia
desentendimento entre os sócios, e os belgas decidiram, então, fazer
valer a cláusula que obrigava a Petrobras comprar a outra metade. Até
aí, bem. Num dos e-mails obtidos pela Folha, Winget escreve,
referindo-se aos negociadores com os quais dialogava, que “não
ficaria surpreso se a Petrobras já tiver se dado conta de que a
refinaria não vale os US$ 650 milhões que eles [os negociadores
brasileiros] sinalizaram”.
Entenderam?
Eles mesmos sabiam que a refinaria não valia aquilo tudo. Ao Congresso,
no entanto, Graça Foster afirmou que as condições do mercado à época
justificavam aquele preço. Nem os donos originais achavam isso!
Multa e passivo ambiental
Reportagem levada
ao ar na noite desta sexta pelo Jornal Nacional evidencia que Pasadena
ainda não parou de sangrar o cofre do Brasil. O Condado de Harrys
acionou a refinaria na Justiça para receber uma multa US$ 6 milhões,
soma de tudo o que ela deixou de recolher em impostos desde 2005, sem
contar que, em 2012, o condado fechou com a Petrobras um acordo para o
pagamento de uma multa de US$ 750 mil por causa da poluição do ar em
anos anteriores. Rock Owens, que é advogado da área ambiental de Harrys,
diz que o valor da venda da refinaria chamou a atenção na época. Ele
explica por quê: “Era a venda de
uma refinaria velha a um preço premium que não deveria ter sido pago. E
sem os reparos que recomendamos desde os anos 80, que não foram feitos”.
Os sócios
da Astra sabiam que a empresa não valia tudo aquilo; o advogado do
Condado de Harrys sabia que a refinaria não valia tudo. Intuo que os
diretores que realizaram a operação também soubessem, não é? O conselho,
no entanto, foi levado no bico — e Dilma decidiu ignorar o assunto
depois, como conselheira da Petrobras, como ministra e como presidente
da República.
Mas a Petrobras não contratou consultoria? Pois é. Aí é preciso lembrar a reportagem do
Globo que mostra que a avaliação foi feita às pressas, em apenas 20
dias. Os avaliadores contratados, da BDO Seidman, deixaram claro que não
tiveram tempo de fazer o trabalho adequado e se eximem de eventuais
problemas posteriores. Recomendam à Petrobras que faça, então, ela
própria a avaliação. E a Petrobras fez. Sabem quem a ajudou? A então
diretora financeira da Astra, Kari Burke. É do balacobaco!
Não por acaso, informa outra reportagem da Folha, “a análise [sobre o preço da refinaria]
contemplava três cenários, com cinco situações em cada, nas condições
em que se apresentava a refinaria na época. A mais conservadora
estabelecia que Pasadena inteira custava US$ 582 milhões. A mais
otimista atingia US$ 1,54 bilhão. Com o estudo na mão, Nestor Cerveró
decidiu oferecer US$ 700 milhões por 50% do ativo. O fato de a oferta
não corresponder à metade de nenhuma das cifras apresentadas no estudo
chamou atenção da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que questionou a
escolha de valores “aleatoriamente, sem comprovação, entre todos os
cenários possíveis”
Entenderam?
Foi Cerveró que ofereceu os US$ 700 milhões pela segunda metade — que
depois acabaram se transformando em R$ 820,5 milhões. Aí, sim, a
operação foi vetada pelo Conselho e teve início a disputa judicial.
Dilma pode até explicar como foi enganada na condição de membro do
conselho. A sua omissão posterior é que é inexplicável, com Cerveró
assumindo a direção financeira da poderosa BR Distribuidora.
Curiosamente, a presidente mandou demiti-lo antes de qualquer
investigação.
Dá para
entender por que o mercado se animou quando a oposição conseguiu o
número de assinaturas no Senado para fazer a CPI da Petrobras. É a
esperança de que uma comissão de inquérito contribua para botar ordem na
bagunça. Como se nota, mais de uma vez, os próprios belgas se mostraram
espantados — e até incrédulos — com a, por assim dizer, generosidade da
Petrobras.
Durante um bom tempo, como sabem, este blog foi o único veículo a manter Pasadena na pauta. No dia 17 de dezembro de 2012, informei aqui, o site Bahia Notícias publicava o seguinte (em vermelho):
O secretário de Planejamento e ex-presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, esclareceu por meio de nota as afirmações feitas pelo colunista da revista Veja, Reinaldo Azevedo. Por meio de nota, a assessoria do titular da Seplan informa que a pauta “é requentada”.
“Em novembro 2005, a Petrobras assinou um
Memorando de Entendimento com a Astra Oil Company (Astra). Em setembro
de 2006, a Companhia concluiu a aquisição através de sua subsidiária
Petrobras America Inc. (PAI). Desentendimentos entre os sócios levaram a Astra a requerer o direito de vender seus 50%”.
Segundo o documento, o valor foi acrescido de juros e outras atribuições durante o processo arbitral. “A
Petrobras empenhou seus melhores esforços e obteve uma redução
significativa no montante pleiteado pela Astra. Em junho de 2012, um
acordo extrajudicial totalizou US$ 820 milhões. Parte desse
montante, US$ 750 milhões, já vinha sendo provisionado, restando o
complemento de provisão de US$ 70 milhões”, diz a nota. “O acordo tornou
a refinaria [de Passadena] um ativo negociável, ainda que não haja uma
obrigatoriedade nem urgência em se desfazer da mesma”, finaliza o
comunicado.
Encerro
Até aquela data, Gabrielli achava que
bastava arrogância para matar o assunto. Vejam quanta notícia tem
rendido o “assunto requentado”. Mais: segundo sustentou então, a
Petrobras ainda havia conseguido uma “redução” (!!!) no valor da compra.
Um caso de política. Um caso de polícia.
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