Coral Davenport e Steven Erlanger - NYT
AP - 4.mar.2014
AP - 4.mar.2014
Presidente Vladimir Putin dá entrevista coletiva sobre a atual situação na Ucrânia
A crise da Crimeia está anunciando o surgimento de uma nova era de
diplomacia energética dos EUA, enquanto o governo Obama tenta implantar o
novo fornecimento de gás natural nos Estados Unidos como uma arma para
minar a influência do presidente russo, Vladimir Putin, sobre a Ucrânia e
a Europa.A crise intensificou uma iniciativa do Departamento de Estado para usar o recente crescimento no abastecimento de gás natural dos EUA como uma alavanca contra a Rússia, que fornece 60% do gás natural da Ucrânia e costuma cortar o fornecimento durante em momentos de conflito.
Nesta semana, a Gazprom, companhia estatal de gás natural da Rússia, disse que não ia mais fornecer o gás com desconto para a Ucrânia, em uma medida que lembrou os mais graves cortes russos de gás natural para a Ucrânia e outros pontos na Europa em 2006, 2008 e 2009.
A estratégia do governo é avançar agressivamente para usar as vantagens de seus novos recursos para minar as vendas de gás natural da Rússia para a Ucrânia e a Europa, enfraquecendo esse tipo de medida de Putin no futuro. Embora a Rússia ainda seja a maior exportadora de gás natural, os EUA recentemente se tornaram os maiores produtores de gás natural do mundo, em grande parte por causa de avanços tecnológicos no fraturamento hidráulico, conhecido como "fracking".
"Estamos em uma posição diferente porque somos muito maiores na produção de energia", disse Jason Bordoff, ex-diretor de energia e mudança climática do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca.
Na semana passada, os republicanos do Congresso se uniram aos grandes produtores de petróleo e gás, como a ExxonMobil, exortando o governo a acelerar as exportações de petróleo e gás natural. Embora ambientalistas, alguns democratas e empresas de manufatura dos EUA que dependem da vantagem competitiva do gás natural barato terem feito oposição ao esforço, eles ficaram à margem.
Para a Rússia, o fornecimento de energia é tão importante em seu domínio sobre a Ucrânia e outros -integrantes da União Soviética quanto o próprio exército russo. A Ucrânia congelaria sem o gás russo, e seu fluxo tem sido uma fonte considerável de riqueza e corrupção nos dois países.
Mas a Rússia também está obrigada por contrato a fornecer gás natural para a Europa Ocidental e, para tanto, Moscou continua altamente dependente dos oleodutos ucranianos.
David Dalton, editor da "Economist Intelligence Unit", disse: "A Rússia sempre usou o gás como instrumento de influência. Quanto mais você deve à Gazprom, mais eles acham que podem dar as cartas".
Mas, desta vez, há uma grande diferença. Em 2007, o abastecimento de gás natural dos EUA parecia estar caindo, e o governo de George W. Bush estava pensando em importar gás natural da Rússia. Desde então, a técnica de "fracking", que os ambientalistas dizem que pode contaminar o abastecimento de água, tem transformado o cenário estratégico.
Os EUA ainda não exportam o seu gás natural. Mas o Departamento de Energia começou a emitir licenças para empresas norte-americanas exportarem gás natural a partir de 2015.
Empresas norte-americanas apresentaram 21 pedidos de licença para a construção de instalações portuárias nos Estados Unidos para exportar gás natural liquefeito por navios-tanque. A agência aprovou seis dos pedidos.
No entanto, mesmo que o Departamento de Energia aprove todas as autorizações pendentes de empresas que pretendem exportar gás natural, o combustível só poderia começar a fluir para além-mar daqui a alguns anos. A maioria dos terminais de exportação de gás natural dos EUA está nos estágios iniciais de construção. Um deles, em Sabine Pass, Louisiana, tem data de inauguração marcada para o final de 2015, mas a maioria não vai começar a operar antes de 2017 ou além.
À frente do novo esforço diplomático de energia está Carlos Pascual, que foi embaixador dos EUA na Ucrânia e dirige o Escritório de Recursos Energéticos do Departamento de Estado. O escritório, que conta com uma equipe de 85 funcionários, foi criado no final de 2011 por Hillary Rodham Clinton, secretária de Estado na época, com a finalidade de tornar o boom de energia doméstica em uma ferramenta geopolítica para avançar os interesses dos EUA em todo o mundo.
Em entrevista, Pascual afirmou que os esforços de sua equipe já haviam enfraquecido a mão de Putin, ajudando a reduzir a dependência da Ucrânia do fornecimento de gás natural russo de 90% para 60%.
Segundo Pascual, sua equipe vem trabalhando para ajudar a Ucrânia e outros países europeus a romperem com a dependência do gás russo encontrando outras fontes, inclusive na África. Além disso, o escritório vem ajudando os europeus a reforçarem sua capacidade de armazenamento de gás natural. A equipe, segundo ele, vem trabalhando com a Ucrânia e a União Europeia para terminar um mapa de energia europeu, que já permite que o gás natural flua mais rapidamente pela Europa e permite que os países obtenham preços menores com a Gazprom.
Além disso, segundo ele, a equipe está ajudando os países a desenvolverem seus próprios recursos de gás natural, inclusive em parceria com gigantes de energia norte-americanas. A Halliburton começou o fraturamento de gás natural na Polônia, enquanto a Shell no ano passado assinou um contrato para a exploração de gás natural na Ucrânia.
Pascual disse que, embora as exportações dos EUA não vão resolver imediatamente os problemas na Europa, "elas enviam um sinal claro de que o mercado de gás está mudando e que existe uma perspectiva de maior suprimento vindo de outras partes do mundo".
"Este é um mercado totalmente transformado", acrescentou. "Nosso desafio é olhar para a produção dos EUA no contexto global e entender como podemos influenciar os acontecimentos".
Nos próximos anos, a influência da Gazprom será ainda mais enfraquecida quando o suprimento dos EUA entrar no mercado mundial, disse Pascual.
Na terça-feira (4), o presidente da Câmara, John A. Boehner, Republicano de Ohio, pediu ao presidente Barack Obama que "acelerasse dramaticamente" o processo de aprovação das exportações.
"Os Estados Unidos têm grandes reservas de gás natural", disse Boehner. "O processo de aprovação do Departamento de Energia dos EUA, dolorosamente lento, equivale a uma proibição de fato sobre as exportações de gás natural norte-americanas, que Vladimir Putin explora alegremente para financiar seus objetivos geopolíticos. Não devemos forçar nossos aliados a permanecerem dependentes de Putin para as suas necessidades energéticas".
Os esforços desta semana não foram a primeira vez que o Departamento de Estado usou os recursos energéticos recém-descobertos para ganhar vantagem geopolítica.
Em 2012, em resposta ao programa nuclear do Irã, os EUA exortaram os europeus a imporem sanções financeiras que muito limitariam capacidade do Irã de vender petróleo no mercado mundial. Alguns países ficaram temerosos que a medida forçasse um aumento dos preços, mas as autoridades norte-americanas asseguraram que o aumento da produção de petróleo dos EUA manteria os preços estáveis.
No início deste ano, os EUA procuraram intermediar a venda de gás natural de Israel para a Jordânia, em um esforço para estabilizar as relações no Oriente Médio.
"Na Segunda Guerra Mundial, fomos o arsenal da democracia", disse Robert McNally, que foi diretor de questões energéticas internacionais do Conselho de Segurança Nacional durante o governo Bush. "Eu acho que vamos nos tornar o arsenal de energia".
Tradutor: Deborah Weinberg
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