A reação à militarização
Discurso de Obama sobre a orientação da política externa dos EUA divide os críticos
PETER BAKER - THE NEW YORK TIMES/O Estado de S.Paulo
As opiniões que o presidente Barack Obama tem ouvido
sobre sua política externa deixam-no profundamente frustrado. Síria?
Ucrânia? Afeganistão? O que mais os críticos querem que ele faça? Ir a
uma nova guerra? Continuar combatendo naquela que já se tornou a mais
longa da história dos EUA? Obama, há mais de cinco anos na presidência,
está cada vez mais convencido de que os EUA, embora desempenhem um papel
vital além de suas fronteiras, não deveriam se deixar arrastar para o
terreno movediço das crises internacionais que enredaram alguns dos
predecessores do democrata.
Para os críticos, principalmente os da direita, mas também alguns da
esquerda, essa é uma receita para a passividade, o fim de décadas de
liderança. Obama aproveitou o discurso que pronunciou na formatura dos
cadetes de West Point, na quarta-feira, para definir uma estratégia de
política externa que julga adequada e espera que dure além do seu
mandato.
"É uma tentativa de Obama de elaborar uma doutrina que leva em conta o
que pensamos a respeito do mundo depois que vencemos o Taleban e seus
aliados", disse Peter Bergen, especialista em segurança nacional da New
America Foundation. "Uma política de prudente moderação não desperta
grande entusiasmo e não se presta a uma retórica contundente, mas talvez
seja a estratégia mais sábia e com certeza é a que mais agrada ao
público americano."
Obama até jogou dos dois lados, usando as expressões "nação
indispensável", favorita dos democratas durante o governo Clinton, e
"excepcionalismo americano", cara aos republicanos desde então. Mas o
presidente, que em seu primeiro mandato fez uma campanha implacável com
drones contra os terroristas e autorizou a operação que matou Osama bin
Laden, pareceu preocupado em estabelecer um novo grau de exigência para o
emprego da força.
Com a retirada das tropas do Afeganistão até o final de 2016, como já
fez no Iraque, ele destacou que chegará ao fim o envolvimento dos EUA
em duas guerras. Limitando-se a treinar e a equipar os aliados
regionais, Obama transfere mais para eles a responsabilidade da guerra
contra os terroristas.
De certo modo, o seu foi um argumento falacioso, porque até seus
adversários mais ferozes não são a favor do emprego das forças
terrestres americanas para conter a intervenção russa na Ucrânia ou para
deter a guerra civil na Síria. "Eu trairia o meu dever com vocês e com o
país que amamos", acrescentou, "se os enviasse para pôr em risco sua
vida apenas por detectar um problema em alguma parte do mundo precisando
ser solucionado, ou por estar preocupado com os críticos segundo os
quais uma intervenção militar é a única maneira de os EUA evitarem
mostrar-se um país fraco", disse.
Peter Feaver, ex-assessor do presidente George W. Bush e professor de
ciências políticas da Duke University, disse que o discurso teve "um
tom extremamente partidário e defensivo". Richard Haass, que também
trabalhou para o governo Bush e rompeu com ele em razão da guerra do
Iraque, disse que o discurso tentou estabelecer a diferença exata entre
os que acham que os EUA estão fazendo demais e os que acham que estão
fazendo de menos. "Mas não apresentou uma justificativa lógica para o
que deveríamos estar fazendo", disse Haass, hoje presidente do Conselho
de Relações Exteriores.
O discurso permitiu que o presidente expressasse aborrecimento. Às
vezes, Obama pareceu responder diretamente a um crítico, Robert Kagan,
cujo longo artigo de primeira página da revista The New Republic,
intitulado Superpowers Don't Get to Retire (Superpotências não têm a
opção de se aposentar), argumentava contra o recuo da liderança dos EUA
depois da 2.ª Guerra.
Obama disse que os defensores do intervencionismo da esquerda e da
direita afirmam "que a disposição dos EUA para aplicar a força em todo o
mundo é a última salvaguarda contra o caos e o fato de os EUA não
agirem diante da brutalidade síria ou das provocações russas não só
viola nossa consciência como convida a uma escalada da agressão no
futuro". Mas, acrescentou, "desde a 2.ª Guerra, alguns dos nossos erros
mais dispendiosos não foram o resultado da nossa moderação e sim da
nossa decisão de nos atirarmos em aventuras militares sem pensar nas
consequências".
A resposta foi interessante porque, no passado, Obama apoiou coisas
que Kagan escreveu. Embora Kagan tenha sido um destacado defensor da
guerra no Iraque, Obama gostou dos seus escritos que acabavam com o mito
do declínio americano. A mulher de Kagan, Victoria Nuland, trabalha
para Obama e ocupa o cargo de secretária de Estado assistente.
Na quarta-feira, Kagan disse que a "última linha de salvaguarda" de
Obama é uma justa e correta representação do que seu ensaio afirma. E
disse que o que o presidente afirmou a respeito do seu ponto de vista
foi "a declaração mais clara dessa posição jamais feita por Obama".
Para Kagan, trata-se de "uma definição mais limitada do interesse
nacional do que a tradição que se seguiu à 2.ª Guerra". Ele acrescentou
que Obama aparentemente chegou à conclusão de que ela se coaduna com o
espírito americano. "Ele estabeleceu uma espécie de diálogo com o povo
americano", disse Kagan, "e acho que concluiu que ele ficaria feliz se
jamais tivesse de usar a força".
TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
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