O legado de Barbosa
Zero Hora
O ministro que se despedirá do Supremo deixa um acervo de referências a todos os empenhados na efetividade da Justiça.
Ao antecipar sua aposentadoria do Supremo, o ministro Joaquim Barbosa abrevia também o balanço que começa a ser feito de sua trajetória na mais alta Corte do país. Despede-se do STF,
no final de junho, um magistrado que angariou respeito pelo mérito da
atuação, pela sólida formação jurídica e cultural e também por decisões
consideradas controversas. O ministro ganhou notoriedade como relator do chamado mensalão e, mais tarde, como presidente do STF na
fase final do julgamento da ação 470. Foi assim que construiu a imagem
de juiz que finalmente atendeu às expectativas da sociedade na reparação
de delitos cometidos por ocupantes de cargos públicos.
Barbosa contribuiu para aproximar o Supremo da população e para inspirar referências que o Judiciário tem
a missão de incorporar às suas rotinas, mesmo com as restrições já
conhecidas de colegas, de juristas e operadores do Direito. Ao assumir,
há 11 anos, o ministro já estava
construindo uma história pessoal única. De origem humilde, foi o
primeiro negro a chegar ao Supremo. Vinha do Ministério Público, com
aperfeiçoamento acadêmico no Exterior, e marcou sua atuação, desde o
início, pela forma categórica com que defende suas posições.
A relatoria do mensalão
foi a oportunidade para expor conhecimento e determinação na luta contra
a impunidade. Foi também por tal postura que passou a merecer
avaliações nem sempre favoráveis. Como principal protagonista do Judiciário no
mais rumoroso caso de corrupção do país, inspirou as críticas dos que
decidiram considerá-lo muito mais um acusador do que um magistrado.
Antes mesmo de assumir a presidência do Supremo, em novembro de 2012,
reagiu com naturalidade a esses questionamentos e, mais tarde, já no
comando da Corte, até mesmo a ataques públicos de inconformados com sua
atuação.
Também não desmerecem
sua trajetória os enfrentamentos que teve com outros ministros, em
vários ocasiões, por divergências que exacerbaram pontos de vista
jurídicos e pessoais e também as vaidades que frequentam o Supremo. A
marca de sua passagem é a da obstinação com que se dedicou ao processo
do mensalão, apesar de ter sido visto com certa desconfiança, do momento
em que assumiu o caso, em 2006, até o início da leitura de suas
conclusões, em agosto de 2012.
Não há exagero em dizer
que Barbosa contribuiu para o fortalecimento da reputação da Justiça e
para a compreensão de atos complexos, ao ser visto e ouvido ao vivo pela
TV e provocar as reações de especialistas e de leigos sobre
deliberações que permitiam as mais variadas interpretações.
O ministro que
obteve reconhecimento dentro e fora do Brasil não é, nem poderia ser,
uma unanimidade. O legado que deixa deve ser inspirador dos que, em
todas as instâncias, e não só nas altas cortes, trabalham pela
efetividade da Justiça.
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