Ariel Palacios -OESP
O ano, 1616. O protagonista, o capitão Simón de Valdéz, tesoureiro da Real Fazenda no vilarejo de Santa Maria del Buen Ayre, futura cidade de Buenos Aires. A atividade extraoficial de Valdéz: ser o dono de uma casa ilegal de jogos. Por esse delito o funcionário público foi detido pelo governador espanhol da época. No entanto, foi solto pouco depois, recuperando seu cargo de tesoureiro. Considerando-se impune, Valdéz reabriu sua casa clandestina de apostas. Mas seu retorno foi mais ousado: ele instalou a casa de apostas num imóvel vizinho ao Cabildo, o edifício que albergava a administração colonial espanhola. Um ano depois, Valdéz decidiu economizar com o aluguel e levou seu “negócio” para dentro da própria sede do governo.
O casal Kirchner, cuja fortuna oficial cresceu 4.567% entre 1995 (época na qual Nestor Kirchner era governador de Santa Cruz) e 2010, foi indiciado em dezenas de ocasiões nos tribunais. Mas a maioria dos casos de corrupção que protagonizavam foi arquivada. Alguns dos processos, na Província de Santa Cruz, feudo político dos Kirchners, estavam a cargo da promotora federal Natalia Mercado. Coincidentemente, sobrinha direta de Néstor e Cristina Kirchner, filha da ministra da Ação Social, Alicia Kirchner.
Manuel Garrido, ex-promotor federal e ex-diretor do Departamento Anticorrupção, disse ao [BOLD]Estado[/BOLD] que o recente relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE) “questiona a Argentina pela conivência entre o poder e a Justiça no país. E esse é um dos fatores que explicam a impunidade”. Garrido foi diretor da Promotoria de Investigações Administrativas em 2003. Mas renunciou poucos meses depois, quando o procurador-geral da república, Esteban Righi, restringiu suas investigações, que começavam a dar pistas sobre os primeiros escândalos do governo Kirchner.
A deputada de oposição Elisa Carrió, ex-candidata presidencial, famosa pelas investigações de corrupção que realiza desde os anos 90, afirma que o casal Kirchner “roubou
Nos últimos dois anos o governo foi abalado pelo crescimento dos escândalos de corrupção que envolvem o vice-presidente Amado Boudou. O vice foi convocado na sexta-feira para inquérito nos tribunais no dia 15 de julho por irregularidades com a gráfica Ciccone, terceirizada pelo governo para imprimir notas de pesos. A situação de Boudou, que também é suspeito de enriquecimento ilícito, agrava-se a cada dia. Diversos setores do kirchnerismo indicam que o vice, caso seja processado, deveria tomar uma licença do cargo, para não afetar a imagem do governo. Coincidentemente, Boudou ficou de fora do novo Conselho do Partido Justicialista (Peronista).
Na semana passada, José Guillermo Capdevilla, uma das testemunhas do caso Ciccone, ex-assessor de Boudou quando este era ministro da Economia, abandonou o país às pressas, alegando que foi ameaçado de morte. Poucos dias depois, a oposição denunciou pressões para afastar o juiz Ariel Lijo do caso.
Enquanto isso, o governo conseguiu levar a julgamento por suposto mau desempenho de suas funções o promotor José Luis Campagnoli, que averiguava os nexos entre o casal Kirchner e o empresário Lázaro Báez, processado por suposta lavagem de dinheiro. O julgamento de Campagnoli, famoso por sua honestidade e vida austera, será durante os dias da Copa do Mundo.
Além dos próprios Kirchners, do vice Boudou, os escândalos de corrupção atingem ministros poderosos como Julio De Vido, do Planejamento Federal, alvo de uma reabertura de um processo sobre enriquecimento ilícito na semana passada.
Diversas pesquisas indicam que os argentinos consideram que a corrupção está enraizada no país entre políticos, empresários, integrante das polícia, entre outros setores. Um levantamento elaborado pela consultoria Raúl G.Aragón & Associados sustentou em abril que 67,3% dos entrevistados acreditam que a corrupção é “inevitável” na Argentina. A pesquisa também indicou que apenas 1,4% não acreditam na existência de corrupção no governo Kirchner.
A imagem sobre os líderes da oposição também é negativa (mas favorecidos por exígua margem), pois apenas 2,5% dos entrevistados acreditam na ausência de corrupção nos grupos contrários à presidente Cristina.
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