Esquerda e Direita
David Coimbra - Zero Hora
Entre esquerda e
direita, prefiro a esquerda. A esquerda faz uma ideia generosa da vida,
de defesa do fraco contra o forte. Mas as pessoas de esquerda têm um
defeito irritante: o hábito de julgar os outros por suas ideias. Para
muitas pessoas de esquerda, quem não pensa como elas é desprezível.
Ideias
têm alguma importância. Não muita. Conheço supremos canalhas que são
esquerdistas perfeitos. O que torna um ser humano melhor não são suas
ideias; são os seus sentimentos e o seu comportamento, sobretudo a forma
como trata os outros seres humanos.
O Brasil é governado há meia
geração por um partido de esquerda. O PT seria a nêmesis da ditadura
militar, a direita mais renhida. Mas, olhando para um e outra, me
espanto: como são parecidos! Hoje encontro gente agradecida ao PT pelos
ótimos Bolsa Família, Minha Casa eProUni, e lembro que só cursei minha
faculdade graças ao Crédito Educativo e que minha mãe só comprou nosso
apartamento graças ao BNH. Deveríamos ser agradecidos à ditadura? Os
dois, PT e ditadura, tentaram diminuir as diferenças sociais por meio de
programas, não com mudanças de sistema.
Ambos, PT e ditadura,
são desenvolvimentistas, o PAC é o PND. A ditadura fez a ponte
Rio-Niterói, a Transamazônica, a Freeway, o Pólo Petroquímico, a Usina
de Itaipu. O PT quer fazer Belos Montes, compra usinas no Exterior,
duplica a BR-101, planeja a segunda ponte do Guaíba, pretende terminar a
transposição do São Francisco. Em Porto Alegre, a esquerda tem feroz
apreço pelo 1 milhão e 400 mil árvores da cidade. Destas, 1 milhão e 100
mil foram plantadas na gestão de Socias Villela, prefeito nomeado pela
ditadura. Na ditadura, a imprensa era censurada. O PT sonha com a
censura disfarçada pelo "controle social da mídia". O PT e a ditadura
são estatizantes, os dois apostaram na indústria automobilística como
pilar de desenvolvimento e tiveram seus empresários-modelo, seja os
financiadores da Oban nos anos 70, seja Eike e seus R$ 10 bilhões
captados junto ao BNDES nos 2000.
Lula aproveitou o bom momento
econômico internacional e fez o Brasil crescer até 7,5%. Semelhante a
Médici, que levou o país a 10%. Depois de Médici, assim como depois de
Lula, a economia virou. Seus sucessores, Geisel e Dilma, tiveram de
enfrentar momentos delicados e um país em princípio de ruptura social.
Sarney e Maluf, velhos próceres do PDS, o partido da ditadura, são
eleitores entusiasmados do PT, embora Maluf reclame que o PT esteja à
sua direita.
Mas nem a esquerda nem a direita aproveitaram seus
bons momentos para fazer reformas estruturais. Quanto mais rico fica o
Brasil, mais degenerado se torna como nação. Na ditadura e na gestão do
PT, o Brasil melhorou para milhões de indivíduos; piorou como país.
Foram medidas analgésicas, não curativas. Não por má intenção, diga-se.
Houve, sim, vontade de fazer o melhor. Por isso, não me agradam petistas
que não enxergam decência fora do PT e não me agrada quem chama os
petistas de petralhas. Melhor seria se compreendessem que tanto à
esquerda quanto à direita há gente, muita gente, que quer o bem do
Brasil. É este o sentimento mais importante. Porque na prática, como se
vê, não faz muita diferença.
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