Ana Carbajosa - El País
Santi Palacios/AP
28.mai.2014
- Um imigrante africano sobe em poste para atravessar uma cerca
metálica que separa o Marrocos do enclave espanhol de Mililha, na
fronteira entre os países
Pouco depois das
quatro da manhã se tomou a decisão. A quarta-feira seria o dia do salto.
Os camaroneses assentados no monte Gurugu, no norte do Marrocos,
comandariam a expedição. Centenas de subsaarianos saltariam juntos o
emaranhado de cercas e lâminas que rodeia Melilha. O momento escolhido
seria por volta das 5 da manhã, hora da primeira reza muçulmana, motivo
pelo qual esperavam que os guardas marroquinos estivessem distraídos. Um
subsaariano iria como batedor e anunciaria a via livre aos demais.
"Hoje é o dia. À terra prometida! Yalaaaaa!", foi seu grito de guerra.
Quem reconstrói a odisseia que outros companheiros confirmam é Celestín,
um camaronês de 28 anos que, com o pé enfaixado, anda mancando pelos
arredores do Centro de Estada Temporária de Imigrantes (Ceti), cuja
capacidade está esgotada há meses.A chegada nesta terça-feira de mais cerca de 500 subsaarianos – dos 2.000 que tentaram – que conseguiram saltar as cercas tornou a situação insustentável nesse centro, com capacidade para 500 pessoas e no qual se empilham em macas cerca de 2.400. Nessa mesma terça-feira, dezenas de imigrantes foram transferidos de forma extraordinária à península para aliviar a superlotação em Melilha. Boa parte dos que ocupam o Ceti há meses são sírios que fogem da guerra que arrasa seu país. Um grupo de homens de Homs, no oeste da Síria, lamentava sua sorte às portas do centro.
Na última hora da tarde, efetivos do exército, ajudados pelos próprios imigrantes, instalaram imensas tendas de campanha militares com liteiras verde-cáqui nos arredores do centro, nas quais dormirão os recém-chegados. O recinto é uma mistura de jovens extenuados e desorientados, que carregam sacolas coloridas nas quais guardam seus novos pertences: talheres, escova de dentes, cuecas, sabonete, meias e roupa esportiva.
Celestín, afundado em um suéter azul que acaba de ganhar, continua seu relato: "Éramos um grupo misto. Havia gente da Guiné, da Costa do Marfim, de Camarões, de Mali e do Chade". Ao grito de "Yala" – vamos, em árabe –, começou a caminhada em silêncio e em fila indiana. Percorreram alguns quilômetros até chegarem à cerca. Ali começaram as corridas, os empurrões e o salve-se quem puder. Centenas cruzaram. Outros tantos não o conseguiram e tiveram que enfrentar os guardas marroquinos. "Atiravam-nos pedras, o que conseguissem. Logo chegou a Guarda Civil. Mais correrias", diz Celestín, que antes era estivador no porto de Duala. E informa: "É uma questão de força física e da graça de Deus".
Esse jovem passou três anos acampado no monte Gurugu, perto de Mel Melilha e onde os aspirantes a imigrantes vindos de toda a África esperam seu momento. Essa é sua sétima tentativa de chegar à Europa. Quatro vezes conseguiu saltar a cerca e três o devolveram.
Conseguimos porque temos o mesmo objetivo. Chegar à Europa, a Melilha. É o que nos mantém unidos." Agora não sabe o que será dele. "O que seja, menos voltar ao Marrocos. Ali se passa muito mal. Se você é negro e cristão, não o tratam bem." Ao seu lado, outros jovens feridos e cambaleantes, alguns com cruzes no pescoço, confirmam com a cabeça. "Estamos esgotados", diz um deles.
Alguns metros além, Nelson Ketzeke observa a mobilização logística. Também recém-chegado e prestes a completar 20 anos, diz estar feliz de pisar em terra europeia. Em Camarões gerenciava dirigia um pequeno restaurante e não ia mal. "Mas meu sonho era vir para a Europa. Aqui pagam melhor."
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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