sábado, 27 de junho de 2015

Congresso errático aprova medidas contraditórias
Continuam a pairar sobre o país a visão de que cabe ao Estado prover o sustento de grande parte da população e ainda a ideia de que o Tesouro é inesgotável
O Globo
Tomada por um furor legiferante, induzido pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a Câmara acaba de gerar mais um monstrengo, ao aproveitar a medida provisória da extensão da política do reajuste do salário mínimo até 2019 e contrabandear para ela o “jabuti” da extensão do reajuste do mínimo a todos os aposentados e pensionistas do INSS. Acendeu o rastilho da implosão definitiva das contas públicas. Não é a primeira vez nas últimas semanas. Também foi assim na derrubada do fator previdenciário, mecanismo de atenuação das aposentadorias precoces, desatino confirmado no Senado, mas vetado pela presidente Dilma.
O próprio sistema de cálculo do reajuste do mínimo não é o indicado, por não refletir com precisão os ganhos de produtividade da economia, essenciais para impedir efeitos inflacionários da elevação dos salários. Aplicar a fórmula que soma inflação com evolução do PIB no já deficitário e estruturalmente desequilibrado INSS é antecipar uma crise fiscal que está desenhada no horizonte. Apenas esta benevolência irresponsável da Câmara representaria, este ano, mais uma despesa de R$ 9,2 bilhões, caso vigorasse desde janeiro.
A Câmara cria o gasto adicional enquanto aprova medidas do ajuste fiscal. Corta de um lado, mas amplia despesas de outro. Mais um desvario a ser vetado pela presidente Dilma, se o Senado não abater antes o “jabuti”. Assemelha-se ao Titanic aportado na Ilha da Fantasia: não se tem ideia do risco à frente, dada a ausência de senso de realidade de tripulantes e passageiros. Inclusive da oposição, em que tucanos mais uma vez dão o troco a um governo petista no mesmo estilo inconsequente do PT no período de Planalto do PSDB.
O deputado Cunha tem tocado a Câmara de forma temerária, votando uma eclética e destrambelhada reforma política, como forma de se impor ao Planalto enquanto espera ser ou não denunciado pelo MP ao Supremo, no escândalo do petrolão. Mesmo ele rejeitou a manobra: “Chegou-se a um limite daquilo que não deve ser feito”. Pois, na prática, significa subtrair parcela importante do ajuste fiscal aprovado apenas em parte no Congresso, e mesmo assim a duras penas.
Confirma-se que continua a pairar sobre o país a visão míope de que cabe ao Estado prover o sustento direto de grande parte da população, a mesma ideologia que plasmou a Constituição de 88.
Os milhões de beneficiários de programas sociais, somados a uma previdência desestabilizada pelas aposentadoria, e ainda a folha de salários de servidores estáveis e dos “cargos de confiança” enrijeceram o Orçamento de tal forma que dificultam os cortes. Muito também por falta de vontade política.
Este estado de coisas fica ainda mais grave diante dos surtos de populismo do Congresso. E para piorar, existe a ideia de que a capacidade de provedor do Estado é infinita. Não entendem o que tem acontecido com a Grécia.

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