terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Reação à austeridade muda os ventos políticos no sul da Europa
Raphael Minder - NYT
Jose Jordan/AFP
Líderes e economistas europeus ainda estão envolvidos em um debate acalorado sobre se as políticas de austeridade contribuíram mais para ajudar ou prejudicar as pessoas na região, particularmente no altamente endividado sul da Europa.
Mas como mostrou a eleição de domingo na Espanha, os eleitores parecem já ter se decidido. Uma reação contra a austeridade agora claramente quebrou o clube de partidos responsáveis pelas políticas e lançou uma nova geração de opositores.
O resultado na Espanha foi difícil e pode exigir semanas de negociações entre os partidos para descobrir quem será capaz de governar. Mas de forma parecida com o resultado eleitoral de outubro em Portugal, a maioria dos espanhóis votou contra aquele que era um governo focado na austeridade. Esses resultados se seguem ao repúdio neste ano ao governo que adotou a austeridade na Grécia.
"O senso de crise política na Espanha e em alguns outros países europeus é claramente fruto da crise econômica", disse Jaime Pastor, um professor de política da Universidade Nacional de Educação a Distância, em Madri.
A crise financeira, ele argumentou, primeiro colocou em dúvida a viabilidade do modelo econômico da região e do Estado de bem-estar social, mas acabou se transformando em "um debate sobre se o custo da crise foi dividido de forma justa, ao qual muitos eleitores responderam negativamente e estão exigindo a remoção do capitalismo de compadrio dos grandes partidos".
Ainda assim, o primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy, espera permanecer no cargo, no comando de uma coalizão de governo, depois que seu Partido Popular conservador obteve a maioria dos votos no domingo, mas perdeu sua maioria parlamentar.
Mesmo se Rajoy tiver sucesso, alguns analistas dizem que a sacudida na política espanhola é irreversível após dois partidos emergentes, o Podemos e o Cidadãos, terem conseguido ganhos suficientes no domingo para reduzir a fatia combinada dos dois partidos tradicionais, o Popular e o Socialista, para apenas pouco mais de 50% dos votos.
"As crises ocorrem com um certo atraso, de modo que está claro que o sistema dos partidos políticos espanhóis entrou em uma transição, mas não está claro quanto tempo levará essa transição", disse Antonio Barroso, um analista político espanhol da Teneo Intelligence, um centro de estudos em Londres.
O resultados também ressaltam uma mudança de geração na política regional. Rajoy, 60 anos, tentou contrastar suas três décadas na política com a liderança não testada de seus três rivais bem mais jovens, todos os quais na faixa dos 30 e 40 anos. Isso não lhe ajudou nem um pouco.
Na segunda-feira, o primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, parabenizou o Podemos e seu líder, Pablo Iglesias, 37, por se tornar o terceiro maior partido na Espanha, assim como a principal força antiestablishment do país. "A austeridade agora também foi derrotada politicamente na Espanha", disse Tsipras, 41, um exemplo para o restante da esquerda antiestablishment da Europa.
No sul da Europa, talvez apenas a Itália foi poupada da instabilidade de um colapso de seu principal sistema de partidos.
Mas mesmo lá, não está claro que a tempestade passou e os analistas notam que a popularidade do primeiro-ministro Matteo Renzi caiu desde que tomou posse no ano passado, já que a pressão pública por mudanças não diminuiu.
Em Portugal, o líder socialista António Costa, 54, sobreviveu a um resultado eleitoral ruim e depois conseguiu no mês passado uma vitória inesperada, após acertar uma aliança improvável com os partidos antiestablishment de extrema-esquerda, visando derrotar a coalizão de centro-direita que obteve a maioria dos votos na eleição nacional de outubro.
Mas mesmo com mais eleitores rejeitando a austeridade, para onde isso levará a região é incerto. Como mostrou o resultado na Grécia, até mesmo os partidos antiausteridade têm que responder aos mercados financeiros e a orçamentos nacionais equilibrados, e os números ainda permanecem profundamente contrários às políticas da velha esquerda e seus gastos pesados em Estados de bem-estar social.
Rajoy disse em uma coletiva de imprensa na segunda-feira que "a fragmentação das forças políticas não pode ser um elemento de paralisia, bloqueio e inação", o que poderia também colocar em risco a economia da Espanha.
Entre os vários cenários para um possível governo de coalizão, o único que garantiria uma maioria parlamentar seria uma aliança entre o Partido Popular de Rajoy e o Partido Socialista de oposição, liderado por Pedro Sánchez.
Essa "grande coalizão" seria sem precedentes na Espanha e também exigiria uma solução para um relacionamento muito difícil, dado o amargor entre os líderes sitiados dos dois partidos durante a campanha.
"O que saiu das urnas é uma confusão monumental", disse Bieito Rubido, editor-chefe do jornal conservador "ABC", para a televisão nacional espanhola na segunda-feira. "Quase todos perderam."
Tradutor: George El Khouri Andolfato

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