Rafaela Burd Relvas - DN
Marwa, Sfigah e Fatema são turistas do Koweit e estiveram em Lisboa em setembro. A instabilidade política em países do Norte de África e Médio Oriente, como Tunísia, Turquia ou Egito, tem desviado turistas de outros mercados para o turismo nacional | Pedro Rocha/Global Imagens
Os hoteleiros culpam o IVA pela destruição de postos de trabalho
No ano de todos os recordes para o turismo, houve só um que não foi batido: o do emprego. Pelo contrário. O verão de 2015 foi aquele em que o setor registou maior número de hóspedes, de dormidas e de proveitos. Mas, ao contrário do que seria de esperar, o número de pessoas empregadas na restauração e no alojamento caiu para o valor mais baixo alguma vez registado num terceiro trimestre - ou a chamada época alta. A carga fiscal e os custos de contexto demasiado elevados, aliados à dificuldade de acesso ao crédito bancário, são as razões apontadas pelos operadores do setor.
Segundo o
Instituto Nacional de Estatística (INE), a hotelaria portuguesa recebeu,
no conjunto de julho, agosto e setembro deste ano, mais de 6 milhões de
hóspedes (um aumento de 8% face a igual período do ano passado), que
foram responsáveis por 18,8 milhões de dormidas (mais 4% do que há um
ano). Ao todo, a hotelaria faturou 999,6 milhões de euros só no verão,
uma subida homóloga de 11,6%. Comparando com o verão de 2008 - ano em
que, aliás, o setor estava em desaceleração -, as diferenças são
brutais: nessa altura, Portugal tinha recebido 4,5 milhões de hóspedes,
que totalizaram 14,3 milhões de dormidas e renderam 707 milhões de euros
à hotelaria.
O emprego não acompanhou,
porém, a evolução destes indicadores. Durante este verão, mostram os
dados do INE, os setores da restauração e do alojamento empregaram 272,7
mil pessoas, o que representava 5,9% do total da população empregada em
Portugal. No verão passado, o setor empregava 302 mil pessoas (6,6% da
população empregada); em 2008, eram 327,9 mil (6,3% da população
empregada).
Para a Associação da
Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), há uma
explicação clara para este desfasamento dos números. "Esta realidade não
pode ser dissociada do aumento do IVA dos serviços de alimentação e
bebidas, que, a 1 de janeiro de 2012 aumentou de 13% para 23%",
justifica ao DN/Dinheiro Vivo fonte oficial da associação. A medida,
sublinha, foi responsável pela "destruição de milhares de postos de
trabalho nos últimos quatro anos", além de ter tido efeitos negativos
"na estabilidade do emprego".
A verdade
é que, antes do aumento do IVA para a restauração, o número de pessoas
empregadas no setor rondava, durante todo o ano, a casa dos 300 mil, ou
próximo. Após o aumento para 23%, o turismo só conseguiu este nível de
emprego nas épocas altas, derrapando nas épocas baixas. O setor bateu no
fundo no primeiro trimestre deste ano, quando o número de pessoas
empregadas afundou para 249,1 mil, o valor mais baixo de sempre.
O
aumento do IVA para a restauração foi uma das primeiras medidas do
governo de Passos Coelho e mereceu, desde o início, a oposição dos
empresários, que salientam as falências e o aumento do desemprego no
setor desde que a medida foi implementada. Entretanto, o governo
socialista já deixou claro que quer repor o IVA nos 13%, o que deverá
acontecer já em 2016, depois de aprovado o Orçamento do Estado. Em
abril, quando o PS apresentou o cenário macroeconómico elaborado por 12
economistas, Mário Centeno, agora ministro das Finanças, reconhecia que a
redução do IVA implicará uma perda 300 milhões de euros em receitas
para o Estado em 2016. Mas a expectativa é de que haja um efeito de
estímulo à economia, criação de emprego e criação de riqueza, explicou
Centeno na altura.
Até que a reposição
do IVA seja concretizada, a AHRESP garante que a tendência de quebra do
emprego será para continuar. A própria Comissão Europeia, sublinha a
associação, reconhece o "efeito nocivo" de uma taxa tão elevada num
setor de peso em termos de emprego. "As empresas vivem no limite da
solvabilidade financeira e são obrigadas a tomar opções que permitam
garantir a sua sobrevivência, nomeadamente ao nível da utilização de
contratos temporários para períodos de maior procura, mas com efeitos ao
nível do emprego, que se tornou mais precário", salienta a mesma fonte.
Dados do Eurostat mostram isso mesmo. No final do ano passado, o
trabalho temporário representava 30% do total de empregos nas principais
atividades turísticas em Portugal, um valor acima da média de 21% que
se registava no conjunto da União Europeia. Nas restantes atividades não
financeiras, fora do turismo, o peso do trabalho não temporário é de
22% em Portugal e de 14% na União Europeia.
"Este
dado é indicador de que o setor se adaptou, passando a utilizar mais
vínculos de trabalho temporário nos picos de procura e dispensando-os em
períodos de baixa faturação", resume a AHRESP.
Por
outro lado, aponta Elidérico Viegas, presidente da Associação dos
Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, as empresas do setor
confrontam-se com a dificuldade de acesso ao crédito bancário e com
custos de contexto - como a energia e as taxas municipais - demasiado
elevado.
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