A agonia de Temer
FSP
Se não acrescentou ao caso elementos essenciais que já não pertencessem
ao conhecimento público, a denúncia formulada contra o presidente Michel
Temer (PMDB) ampara-se em fatos graves o bastante para desacreditar o
governo.
A peça acusatória,
apresentada pela Procuradoria-Geral da República, descreve um roteiro
plausível para o crime de corrupção passiva no exercício do mandato.
Parte-se do fatídico encontro entre Temer e Joesley Batista, da JBS, em 7
de março. Em trecho truncado da gravação do diálogo, o presidente
indica ao empresário um auxiliar de confiança, Rodrigo Rocha Loures;
este, em 28 de abril, foi flagrado recebendo de um emissário da JBS mala
com R$ 500 mil.
Entre uma data e outra, Loures assumiu um mandato de deputado federal
(era suplente), manteve contatos com Batista e, conforme apuração
policial, procurou ao menos um órgão público para tratar de interesses
do frigorífico.
Embora não haja comprovação cabal de que Loures agia com conhecimento
—e, mais ainda, em benefício— do presidente, a desenvoltura do
ex-assessor do Planalto, registrada em conversas gravadas, em nada se
assemelha à de alguém com mero acesso formal ao chefe.
A despeito de pronunciamentos veementes, Temer até agora não ofereceu
explicações satisfatórias para os episódios. Nesta terça (27), voltou-se contra seu acusador, Rodrigo Janot, mencionando um procurador que deixou o posto para atuar em escritório de advocacia contratado pela JBS.
Na situação inédita de um presidente acusado formalmente de corrupção no
exercício do cargo, o país está mergulhado em impasse de desfecho
imprevisível.
Esta Folha já havia proposto a renúncia conjunta de Dilma Rousseff (PT) e
Temer, seguida de eleições diretas, como solução adequada para devolver
legitimidade ao governo. Mais recentemente, defendeu-se aqui a cassação
daquela chapa, diante das múltiplas evidências de abuso de poder
econômico no pleito de 2014.
As melhores oportunidades para a superação da crise, infelizmente,
ficaram para trás. Resta agora avaliar de maneira realista o panorama
que se descortina.
Há dúvidas políticas e jurídicas em torno de um eventual processo por
crime comum. Nem mesmo existe certeza se o prazo constitucional de seis
meses é suficiente para um julgamento pelo Supremo Tribunal Federal —em
caso contrário, ocorreria um retorno vexatório do acusado ao posto.
A aceitação da denúncia pela Câmara dos Deputados, de todo modo,
mostra-se a hipótese menos provável hoje. Ao presidente basta evitar que
se forme uma esmagadora maioria de dois terços da Casa legislativa
contra si.
O núcleo palaciano tentará demonstrar a capacidade de gerir a economia e
aprovar reformas mesmo sob denúncias, suspeitas e impopularidade
acachapante —cenário no qual se apresentaria como uma espécie de mal
menor.
Tal aposta, de fato a única restante a Temer, dificilmente evitará,
entretanto, que o governo se arraste como um morto-vivo pelos 18 longos
meses ainda pela frente.
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