Acordos de delação podem ser rescindidos se descobertas ilegalidades, diz STF
Também entendeu que delator pode perder benefícios caso descumpra as cláusulas
André de Souza e Tatyane Mendes - O Globo
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira
que ilegalidades descobertas depois da homologação de um acordo de
delação podem levar à sua rescisão. A regra estabelecida é que as
cláusulas devem ser mantidas pelo Judiciário depois de homologadas, mas
abriu essa exceção. Além disso, caso o delator descumpra os termos do
acordo, também poderá perder seu benefício.
O relator do caso em julgamento é o ministro Edson Fachin.
Seu voto inicial causou resistência pelo uso da palavra "vinculação", o
que foi interpretado por alguns ministros como uma forma de tolher os
poderes do plenário do STF, que não poderia mudar o estabelecido por um
de seus integrantes. Isso porque o tribunal também decidiu que a
homologação do acordo é uma tarefa apenas do relator do caso, e não do
plenário.
- Acordo homologado como regular, voluntário e legal gera
vinculação condicionada ao cumprimento dos deveres assumidos pela
colaboração, salvo ilegalidades superveniente apta para justificar
anulação do negócio jurídico - propôs Fachin.
Alexandre
de Moraes discordou dos termos.- O controle dessa legalidade,
regularidade e voluntariedade deve ser feito pelo relator na
homologação. Ele vai homologar, mas isso não impede que, no momento do
julgamento, o colegiado, seja turma, seja o plenário, analise os fatos
supervenientes ou os fatos de conhecimento posterior - disse Moraes.
Assim, Luís Roberto Barroso perguntou qual seria a sugestão dele. Moraes propôs:
- Acordo homologado como voluntário, regular e legal deverá
em regra produzir seus efeitos face ao cumprimento dos deveres assumidos
na colaboração possibilitando ao colegiado a análise do parágrafo 4º do
artigo 966.É uma referência ao artigo do Código de Processo Civil (CPC)
que permite rescindir decisões quando verificadas algumas hipóteses de
ilegalidades. Fachin concordou com a redação proposta por Moraes e a
incorporou a seu voto.Depois, seguiram o mesmo entendimento os ministros
Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Celso de
Mello e Cármen Lúcia.
Ausente, o ministro Ricardo Lewandowski não votou nesta
quinta-feira. Mas em sessões anteriores ele já tinha expressado sua
posição: o plenário do STF pode fazer uma análise ampla ao fim das
apurações, podendo revogar não apenas benefícios específicos, mas toda a
delação, se considerar que o acordo feriu a Constituição ou alguma lei.
Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello tiveram uma posição que
dá mais poder ainda ao plenário. Para eles, cabe ao colegiado, e não ao
relator, homologar o acordo de delação.
- A vinculatividade é algo caricato porque o ato do relator
que fez a caneta cair sobre o papel agora vincula o plenário. É uma
bobagem, ninguém vai seguir isso - criticou Gilmar.
Marco Aurélio entendia inicialmente que não cabia ao
plenário fazer a homologação, mas ao relator. Diante das divergências
sobre a extensão dos poderes do plenário para rever um acordo, ele mudou
o voto.
- Vou reajustar para dizer que não cabe ao relator homologar, mas ao plenário.
A sessão começou com a discussão de uma questão de ordem
proposta por Marco Aurélio. Ele era contra a discussão dos poderes do
plenário e preferia que o julgamento ficasse restrito aos pontos
suscitados originalmente: se a homologação é tarefa do relator ou do
plenário; e se o caso em julgamento, a delação dos executivos da JBS,
deveria continuar com Fachin ou ir para outro ministro.
O STF entendeu, por unanimidade, que Fachin é de fato o
relator. E, por dez nove votos a dois, o STF decidiu que cabe apenas a
ele fazer a homologação. Mas, durante as quatro sessões que o julgamento
tomou, alguns ministros avançaram para a discussão da extensão dos
poderes do plenário depois que houver a homologação. Por oito votos a
dois, o STF entendeu que cabia analisar esse tema também. Apenas Marco
Aurélio e Gilmar Mendes foram contra.
Dos 11 ministros, dez já tinham se manifestado parcial ou
totalmente nas sessões anteriores. Faltava o voto da presidente do
tribunal, Cármen Lúcia.- É um instituto essencial, muito bem vindo à
legislação penal - disse Cármen Lúcia nesta quinta-feira.
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