Fuga para frente
O presidente Michel Temer está sinalizando com uma
expectativa de poder, que hoje ele tem bastante limitada, com o anúncio
da nomeação da Procuradora Raquel Dodge para substituir Rodrigo Janot a
partir de setembro na Procuradoria-Geral da República.
Ele fez a mesma coisa com os dois ministros do Tribunal Superior
Eleitoral que substituiu antes do julgamento final da chapa Dilma/Temer.
Nomeou-os antes mesmo que os antigos ministros encerrassem seus
mandatos, mas garantiu uma decisão favorável a ele e Dilma quando
anteriormente havia uma possibilidade de derrota.
Com a nomeação da nova Procuradora-Geral da República, segunda
colocada na lista tríplice que lhe foi entregue ontem mesmo, Temer tenta
enfraquece Janot e dá um sinal à sua base parlamentar de que tudo vai
mudar a partir de setembro.
Os políticos já se sentirão mais seguros para votar contra o pedido
de processo no Supremo Tribunal Federal feito pelo atual (ex?)
Procurador-Geral, uma figura de resto odiada pelos parlamentares,
especialmente por aqueles que estão na lista de acusados da Operação
Lava Jato.
Do ponto de vista jurídico, essa escolha não tem efeito, pois o
mandato de Janot vai até setembro. Mas politicamente ela é uma vigorosa
mensagem de que ele continua tendo a caneta e está disposto a tudo para
continuar no Palácio do Planalto até o final do mandato, em 2018.
Também internamente na Procuradoria-Geral da República, entre os
procuradores e demais membros do Ministério Público, poderá ser reduzida
a força de comando de Janot. Quem entender o recado poderá ser
recompensado mais adiante. Mas há quem pense que a antecipação pode ter
sido um tiro no pé, expondo a Procuradora Raquel Dodge à fúria da
corporação.
A nomeação antecipada foi também um contragolpe no ministro Luis
Edson Fachin, que enviou ontem mesmo para o Congresso o pedido de
processo contra o presidente da República, sem ouvi-lo antes, definindo
que a posição política deve ser tomada antes da jurídica, que será de
responsabilidade do Supremo só se a Câmara aprovar o processo.
Foi uma decisão muito rápida que mostra a vontade de tocar o processo
sem delongas, passando a bola para os políticos. Nomeando a Procuradora
Raquel Dodge no mesmo dia em que seu processo chegou ao Congresso, o
presidente Michel Temer manda uma mensagem aos políticos, mas também
corre o risco de irritar a corporação dos Procuradores, deixando muito
explícito que está usando a nomeação para tentar manipular a
Procuradoria a seu favor.
Como nunca houve esse tipo de nomeação antecipada no Ministério
Público, ainda mais da segunda da lista, quando a tradição dos últimos
anos era de que o primeiro sempre foi o indicado, a manobra palaciana
pode provocar uma reação da Associação Nacional dos Procuradores da
República (ANPR), órgão corporativo muito atuante e influente entre os
procuradores.
Certamente os operadores da Operação Lava Jato se sentirão acuados e
cobrarão, talvez até mesmo em público, uma posição da futura
Procuradora-Geral, que também ficará sob o escrutínio da imprensa e da
opinião pública nesses próximos 90 dias.
Como tudo na vida do presidente Michel Temer a partir da divulgação
do fatídico áudio com suas conversas secretas no porão do Palácio do
Jaburu, a decisão foi uma fuga para frente, que pode trazer dissabores
ou vantagens políticas, mas sempre arriscada.
O presidente confirma as desconfianças de que trabalhará abertamente
contra a Lava Jato, o que agrada sua base aliada, mas pode provocar
reações contrárias muito significativas. Nesse ambiente tumultuado por
si só, e que medidas intempestivas do Palácio do Planalto só fazem
complicar, dificilmente Temer terá condições de aprovar as reformas, tal
o assédio por benesses que receberá.
As emendas dos parlamentares, por exemplo, estão sendo ampliadas à
medida que a pressão política por apoio no Congresso aumenta. Mais do
que nunca Temer está nas mãos do Centrão, e isso significa mais e mais
concessões que descaracterizam o controle de gastos e inviabilizam
reformas realmente estruturantes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário