O colapso financeiro da USP
O Estado de S.Paulo
Depois de ter suspendido a contratação de docentes,
congelado verbas para viagens e melhorias em faculdades e laboratórios e
adiado o início da construção de novos prédios para o Museu de Arte
Contemporânea, o Instituto de Estudos Avançados e o Núcleo de Estudos da
Violência, poupando somente os restaurantes universitários, a política
de apoio e permanência estudantil e os serviços de utilidade pública, o
novo reitor da Universidade de São Paulo, Marco Antonio Zago, tomou uma
iniciativa inédita.
Em carta dirigida a professores, serventuários e alunos, ele expôs a
gravidade da situação financeira da instituição, que atualmente gasta
105,14% de seu orçamento somente com a folha de pagamento. Há três anos,
as despesas com pessoal eram de 80%, sendo os 20% restantes destinados a
investimentos e despesas de custeio.
O reitor também criticou o excesso de centralização e a falta de
transparência da gestão de seu antecessor, João Grandino Rodas,
acusando-o de não compartilhar dados financeiros com os pró-reitores e
de não os chamar para as reuniões de planejamento financeiro (na última
administração, Zago foi pró-reitor de Pesquisa). E ainda pediu apoio
político para adotar um programa de contenção de gastos e redefinir as
prioridades da maior e mais importante universidade do País.
"A primeira condição para superar essa difícil conjuntura é
compartilhar as informações com a comunidade. Novas construções tiveram
de ser suspensas, sem consideração de prioridade ou interesse acadêmico,
simplesmente porque não há recursos", disse Zago, depois de lembrar
que, desde 2012, a USP já gastou R$ 1,3 bilhão do total de R$ 3 bilhões
que possuía como reserva técnica. Esses recursos são utilizados pela
instituição - que recebe mensalmente uma parcela fixa do ICMS - para
manter as contas em dia e pagar gastos eventuais que excedam o
orçamento. Em 2013, o repasse do governo do Estado para a USP totalizou
R$ 4,35 bilhões.
A crise, segundo Zago, começou quando seu antecessor passou a usar as
reservas para financiar a construção de novos prédios, aumentar os
salários dos servidores técnicos, abrir escritórios nos Estados Unidos,
na Inglaterra e em Cingapura e criar núcleos de apoio à pesquisa.
Tradicionalmente, as atividades de pesquisa são financiadas por agências
de fomento, como a Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo, o
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, a
Financiadora de Projetos para Inovação e Pesquisa e a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior. Se os gastos continuassem
no ritmo da gestão de Grandino Rodas e não houvesse "uma política
responsável de austeridade", a reserva técnica se esgotaria em um ano e
meio, afirma Zago.
"Isso já poderia acontecer no início do próximo ano, deixando a USP
sem um fundo para contingência", diz o presidente da Comissão de
Orçamento e Patrimônio da USP, professor Sigismundo Bialoskorski Neto,
que está no cargo desde fevereiro. Na gestão de Grandino Rodas, o
Conselho Universitário - órgão máximo da instituição - acompanhava
apenas a aprovação do orçamento e não sua execução, observa Bialoskorski
Neto, que também é diretor da Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade do câmpus de Ribeirão Preto.
Surpreendidos com a carta enviada por Zago, professores da USP
lembraram que, se a política de cortes de investimentos e suspensão de
contratação de servidores e docentes for mantida por longo prazo, as
atividades de ensino e pesquisa ficarão comprometidas. Também lembraram
que o destino da instituição - que há alguns anos vem despencando nos
rankings internacionais de qualidade acadêmica e científica - será
incerto. Em entrevista à imprensa, o reitor Marco Antonio Zago afirmou
estar consciente desse risco, prometeu atender às situações de
emergência e maior gravidade e reconheceu que não tinha outro caminho a
tomar. Ele está certo. Sem equilíbrio orçamentário, a USP não tem
condição de cumprir as funções que lhe foram atribuídas por seus
fundadores.
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