domingo, 23 de novembro de 2014

Levy no governo Dilma
SUELY CALDAS - OESP
Dilma Rousseff passou a campanha eleitoral inteira demonizando Armínio Fraga, apresentado por Aécio Neves como seu futuro ministro da Fazenda. Entre profecias e caneladas, ela disse aos eleitores que Armínio seria uma ameaça aos programas sociais e ao Bolsa Família e que sua gestão seria pautada pelos interesses dos bancos e do mercado financeiro. Reeleita, a própria Dilma reconhece agora ter chegado "a hora da verdade" e partiu para buscar no mercado financeiro um banqueiro para comandar a economia e assumir o poderoso Ministério da Fazenda. Presidente do Bradesco, maior banco privado do País, Luiz Trabuco recusou o convite e sugeriu o nome do economista Joaquim Levy, ex-secretário do Tesouro no primeiro governo Lula e hoje diretor-gestor de fundos do Bradesco.
A vida dá voltas, ensina lições, e aprendem os dotados de sabedoria e humildade. Se Dilma hoje tem em Joaquim Levy uma referência para ajudá-la nos dificílimos quatro anos à frente, deve isso justamente ao demonizado Armínio Fraga, que apresentou e recomendou Levy a Antonio Palocci no final de 2002, quando o ex-ministro da Fazenda de Lula buscava quadros para compor sua equipe. Outra indicação de Armínio foi o economista Marcos Lisboa, que Palocci pôs na Secretaria de Política Econômica da Fazenda e se tornou responsável pelo arcabouço legal que dinamizou o crédito popular no governo Lula.Armínio havia trabalhado com Levy no governo FHC e avaliou que ele se encaixava como luva na função que Palocci tanto precisava naquele momento: conceber e comandar o aperto fiscal aplicado em 2003. Na Secretaria do Tesouro, Levy ganhou a experiência em gestão pública que hoje o credencia na avaliação de Dilma. Mas no comando do Tesouro ele foi execrado pelo PT, que nele enxergava uma rocha irremovível contra demandas por aumento dos gastos públicos. Palocci o apoiava com entusiasmo, até porque, ao colocar Levy na linha de frente, ele se desviava das pedradas do PT.
No período em que ocupou a Secretaria do Tesouro, Levy foi o anti-Arno Augustin, o amigo gaúcho da presidente que vai deixar o cargo. Fortalecido por Palocci, ele negava com firmeza e sem recuos propostas de aumento de gastos do PT. Uma delas - a capitalização do BNDES, que receberia injeção de dinheiro público - teve resistência implacável de Levy e não saiu enquanto ele ocupou a função. Augustin não só liberou verbas bilionárias, como usou o BNDES em operações triangulares para falsear as contas públicas.
O currículo de Levy é recheado de experiências variadas. Hoje com 53 anos, graduou-se engenheiro naval, mas tornou-se mestre em Economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e doutor pela Universidade de Chicago (foco da ideologia liberal), abandonando a engenharia. Exerceu funções no Fundo Monetário Internacional (FMI) e no Banco Central Europeu. De volta ao Brasil, ocupou cargos relevantes nos Ministérios da Fazenda e do Planejamento na gestão FHC. Em 2003, tornou-se o primeiro secretário do Tesouro do governo Lula, de onde saiu em 2006, com a demissão de Antonio Palocci, que na época andava às turras com a ministra Dilma Rousseff em razão de um plano de corte de gastos rechaçado por ela. Indicado por Palocci, Levy voltou a Washington, para ocupar a vice-presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), retornando em seguida ao Brasil para organizar as finanças do governo Sérgio Cabral, no Rio de Janeiro. Desde 2010, ocupa a direção de gestão de fundos de investimentos do Bradesco.
O primeiro desafio de Levy será restabelecer a confiança no governo. O segundo é sair-se bem-sucedido na relação com uma presidente e um ministro da Casa Civil que parecem hostis à ideia de corrigir erros e cortar despesas - essenciais para recuperar a confiança, estimular investimentos privados e para o País voltar a crescer. Mas no meio disso tudo há uma agenda dificílima e uma crise econômica que não recomendam cortes radicais nas contas públicas. Levy sabe disso. O sucesso (ou fracasso) se dará na dosagem do remédio.

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