terça-feira, 25 de novembro de 2014

Ali Khamenei ditará os rumos da aproximação entre Irã e EUA
Alain Frachon - Le Monde
Iranian Supreme Leader's Website/HO/AFP
Caberá ao aiatolá Ali Khamenei decidir os rumos da aproximação entre Irã e Estados Unidos Caberá ao aiatolá Ali Khamenei decidir os rumos da aproximação entre Irã e Estados Unidos
Não se sabe como Barack Obama começou sua carta. Que forma de tratamento teria usado? "Senhor Líder da Revolução", "Caro Líder Supremo" ou "Senhor grande aiatolá"? Tudo que se sabe, graças a uma revelação do "Wall Street Journal" que a Casa Branca não desmentiu, é que o presidente americano enviou, em meados de outubro, uma correspondência secreta ao iraniano Ali Khamenei, cujo assunto seria a questão nuclear e tudo que viria depois.
Na carta ele teria apontado a urgência da situação e a importância da questão. A negociação sobre o programa nuclear do Irã deve terminar no dia 24 de novembro. Ela é essencial para o futuro da proliferação atômica, e pode ser determinante para a do Oriente Médio. Após 35 anos de hostilidade entre seus dois países, Obama e Khamenei têm a chance de entrar para a História, assim como fizeram Nixon e Mao em 1972, quando normalizaram as relações sino-americanas.
A "comunidade internacional" quer impedir o Irã de produzir a arma nuclear. Khamenei, o verdadeiro chefe de Teerã, pretende sair do regime de sanções econômicas imposto a seu país – exatamente porque a ONU suspeita que ele queira "a" bomba. Os Estados Unidos e seus parceiros na negociação, os chineses, russos e europeus, fizeram diversas concessões. Eles não pedem mais pelo cancelamento puro e simples do programa de enriquecimento de urânio do Irã, ponto mais controverso do caso. Eles querem reduzi-lo, e depois contê-lo e monitorá-lo. Parece concebível um acordo, se não do ponto de vista político, pelo menos técnico.
Obama faz questão desse acordo por motivos que vão bem além do combate à proliferação nuclear. Seu prestígio pessoal está em jogo. Desde seus primeiros dias na Casa Branca ele emitiu o desejo de retomar relações com o Irã, rompidas em 1979. Ele vê ali uma das chaves para conciliar um Oriente Médio condicionado à guerra, a turbulências e desgraças. A condição prévia para isso seria que a negociação em andamento tivesse sucesso.

Linha divisória

A abordagem do presidente é apoiada por alguns dos maiores nomes da diplomacia americana, tanto republicanos quanto democratas – Brent Scowcroft, Zbigniew Brzezinski, Thomas Pickering, Ryan Crocker, Joseph Nye, entre outros. Citados por Roger Cohen no "New York Times", eles dizem: "Existe uma ligação muito forte entre um acerto da questão nuclear – com o Irã – e a capacidade dos Estados Unidos de exercerem um papel nesse Oriente Médio em rápida transformação."
E complementam: "Um acordo – sobre a questão nuclear – abriria as portas para outras opções" para os Estados Unidos. Uma normalização das relações entre Teerã e Washington permitiria transcender a linha que hoje divide a região: de um lado, o mundo árabe sunita por trás da Arábia Saudita e apoiado pelos Estados Unidos; de outro, os minoritários xiitas conduzidos por uma potência não-árabe, o Irã, e ainda defendidos pela Rússia.
A região já vem sofrendo com essa guerra religiosa de outros tempos, que divide a Síria e o Iraque, e talvez o Líbano amanhã. Ela alimenta a emergência do fanatismo sunita encarnado por um grupo como o Estado Islâmico. Este ameaça a própria existência de muitos Estados do Oriente Médio e Oriente Próximo. Uma aproximação entre os Estados Unidos e o Irã facilitaria ao mesmo tempo a luta contra seu inimigo em comum, o Estado Islâmico, que é o principal perigo, e a busca por uma solução para a Síria e o Iraque. Ela romperia a dinâmica sectária que está em andamento, e poderia permitir um certo relaxamento entre as duas teocracias que se enfrentam por procuração: a Arábia Saudita e o Irã.

Uma coalizão de opositores

Ela não é o remédio milagroso para todas as patologias locais, mas constitui uma das raras chances de conciliação regional. Obama fez de tudo para preservá-la – sobretudo ao se recusar a intervir diretamente contra o regime de Damasco, protegido do Irã. Mas ele tem contra si uma tremenda coalizão de opositores. Israelenses e sauditas se juntam em uma hostilidade radical ao Irã, que é acusado, não sem razão, de veleidades imperialistas regionais. Eles são apoiados em Washington por um Partido Republicano, maioritário no Congresso, que se pôs a serviço de Jerusalém, e que tem a adesão de alguns democratas nessa questão.
A situação é ainda mais difícil em Teerã, onde a questão aparece sob a forma de uma pergunta simples, mas radical: o regime seria sólido o suficiente para uma abertura ao Ocidente? Hassan Rohani, o atual presidente, quer isso, ainda que para tirar o país do marasmo econômico. Mas um complexo ideológico-militar-industrial não quer nem um acordo sobre a questão nuclear, nem uma aproximação com Washington.
Um homem decidirá: Ali Khamenei, o destinatário da carta do início de outubro. Teria ele respondido, o "Senhor Líder Supremo"?

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