Marie De Vergès - Le Monde
Reprodução
Março - O rio Zin voltou a ter água após anos de seca no deserto de Negev, em Israel, em 2014. Chuvas em montanhas distantes do deserto seriam responsáveis pelo renascimento do rio, que ocorre poucas vezes ao longo da história
Para quem está na bela praia de Palmachim, na costa israelense, é difícil imaginar o que está ocorrendo abaixo do chão. No entanto, todos os dias 624 mil metros cúbicos de água do mar são aspirados por dois enormes tubos subterrâneos, e encaminhados por dois quilômetros para dentro das terras, sendo transformados em água potável. Esta é Sorek, a maior usina de dessalinização por osmose reversa do mundo, técnica considerada hoje como a mais bem-sucedida. Inaugurado em 2013, 15 quilômetros ao sul de Tel Aviv, o complexo fornece 20% da água corrente de Israel, abastecendo 1,5 milhão de pessoas.
A instalação, uma joia tecnológica, se
tornou um local de peregrinação para especialistas do mundo inteiro. Em
meio a um barulho ensurdecedor, a água é projetada através de membranas
porosas que retêm seus cristais de sal. A salmoura é lançada de volta
para o mar, enquanto a água filtrada é recarregada de minerais. "No
final ela está totalmente própria para consumo, com toda a alcalinidade e
dureza necessárias", descreve o diretor técnico Micha Taub, enchendo um
copo a partir de uma torneira na extremidade da instalação.
A dessalinização foi uma das soluções que permitiram que Israel superasse o estresse hídrico ao qual seu clima semidesértico parecia condená-lo. Por iniciativa do governo, quatro usinas foram abertas ao longo da última década, e uma quinta deve entrar em funcionamento até o final de 2015. Juntas, elas produzirão 70% da água consumida pelos lares israelenses.
Os defensores do meio ambiente hesitam em elogiar um processo que gasta muita energia e tem uma pegada de carbono elevada. Há também quem se preocupe com o impacto, pouco conhecido, da água muito salgada que é jogada no ecossistema marinho. Os defensores da dessalinização fazem pouco desses temores, e ressaltam que as demandas em energia –-e o preço de custo-– diminuíram com a técnica da osmose reversa. A alternativa que consistia em não fazer nada teria um custo bem mais elevado, segundo eles.
"Esse programa mudou tudo", afirma Avshalom Felber, CEO da IDE, a operadora da Sorek. Normalmente as chuvas só atendem à metade das necessidades de Israel. "Há seis anos havia o risco de o país ficar sem água. Hoje ela sobra", diz o CEO, cujo grupo está construindo uma usina perto de San Diego, na Califórnia, que vem passando por uma seca histórica.
A "revolução da água" israelense vem despertando um grande interesse nas regiões que sofrem com a escassez. Em meados de junho, o país assinou um acordo com o Banco Mundial para dividir seu conhecimento nesse domínio onde ele sempre liderou na inovação: sua primeira usina de dessalinização foi inaugurada já em 1972 em Eilat (sul), e foi em um de seus kibutz que foi inventada, 50 anos atrás, a técnica do gotejamento, utilizada por 90% dos agricultores locais.
Campanhas contra o desperdício
"Não consideramos a água como um simples recurso natural, mas sim como uma matéria-prima tão importante quanto o petróleo. Fizemos dela um tema de segurança nacional e essa é a chave do sucesso", explica Eilon Adar, diretor do Instituto Zuckerberg para a Pesquisa em Água, da Universidade Ben Gurion de Neguev.
Mas Israel escapou por pouco. Entre 2005 e 2009, uma seca de rara intensidade prejudicou gravemente seus aquíferos e o lago de Tiberíades, suas principais fontes naturais. Para lidar melhor com o estado de emergência, em 2007 o Estado confiou a gestão do precioso recurso a uma nova agência interministerial, a poderosa Autoridade da Água.
"Nós pensamos como uma família que está gastando mais do que ganha: era preciso diminuir os gastos e aumentar a renda", conta seu porta-voz, Uri Shor. "A dessalinização é um aspecto central, mas não o único." Foram lançadas campanhas de conscientização contra o desperdício, os preços aumentaram e uma ampla operação de consolidação das tubulações teve início. Resultado: o consumo dos cidadãos caiu 20% entre 2008 e 2011.
Israel também enfatizou a reciclagem e a reutilização das águas residuais, uma prática da qual ele é o líder mundial inconteste: hoje, 86% de seu esgoto é tratado, contra 19% na Espanha, que ocupa o segundo lugar. A água que sai das estações de tratamento cobre dois terços das necessidades dos agricultores.
A poucos quilômetros de Sorek, uma visita à usina de tratamento de Shafdan, a maior do Oriente Médio, permite que se tenha uma ideia do tamanho dessa indústria. Suas imensas bacias recebem as águas residuais de toda a região central, ou seja, 2 milhões de pessoas e 7 mil fábricas e instalações industriais. O esgoto, com seu odor pestilento, é limpo de seus poluentes em menos de 24 horas graças à poderosa ação de microrganismos. Para concluir o processo, a água é injetada em reservatórios subterrâneos repletos de areias naturais que agem como filtros. "No final, é quase possível bebê-la", afirma Lior Paster, engenheiro da usina. Além disso, as fazendas que a recebem a usam para irrigar todo tipo de plantação, inclusive frutas e legumes mais delicados.
No kibutz Ramat Rachel, perto de Jerusalém, o agrônomo Shaul Ben Dov comemora essa trajetória. Na ocasião do último episódio de seca, os agricultores de sua comunidade decidiram arrancar as antigas macieiras, que consomem muita água, para substituí-las por cerejeiras. "Tivemos medo de que alguma hora as torneiras fossem secar", ele lembra. Enfileirados do outro lado da estrada, os pomares do kibutz, que produzem uma variedade de cereja muito apreciada no país, não carecem de mais nada hoje em dia. "Podemos regar à vontade, mesmo quando os invernos são secos", afirma Ben Dov. "O preço é alto, mas ficar subitamente sem água custaria bem mais caro."
Há quem acredite que o avanço israelense será realmente um sucesso caso permita mudar a configuração geoestratégica em um Oriente Médio minado pela falta de água. A divisão do recurso é um grande ponto de tensões com os territórios palestinos ocupados, mas "Israel agora tem todas as cartas na mão para propor um acordo mais justo", afirma Gidon Bromberg, da associação ambiental regional EcoPeace Middle East.
A dessalinização foi uma das soluções que permitiram que Israel superasse o estresse hídrico ao qual seu clima semidesértico parecia condená-lo. Por iniciativa do governo, quatro usinas foram abertas ao longo da última década, e uma quinta deve entrar em funcionamento até o final de 2015. Juntas, elas produzirão 70% da água consumida pelos lares israelenses.
Os defensores do meio ambiente hesitam em elogiar um processo que gasta muita energia e tem uma pegada de carbono elevada. Há também quem se preocupe com o impacto, pouco conhecido, da água muito salgada que é jogada no ecossistema marinho. Os defensores da dessalinização fazem pouco desses temores, e ressaltam que as demandas em energia –-e o preço de custo-– diminuíram com a técnica da osmose reversa. A alternativa que consistia em não fazer nada teria um custo bem mais elevado, segundo eles.
"Esse programa mudou tudo", afirma Avshalom Felber, CEO da IDE, a operadora da Sorek. Normalmente as chuvas só atendem à metade das necessidades de Israel. "Há seis anos havia o risco de o país ficar sem água. Hoje ela sobra", diz o CEO, cujo grupo está construindo uma usina perto de San Diego, na Califórnia, que vem passando por uma seca histórica.
A "revolução da água" israelense vem despertando um grande interesse nas regiões que sofrem com a escassez. Em meados de junho, o país assinou um acordo com o Banco Mundial para dividir seu conhecimento nesse domínio onde ele sempre liderou na inovação: sua primeira usina de dessalinização foi inaugurada já em 1972 em Eilat (sul), e foi em um de seus kibutz que foi inventada, 50 anos atrás, a técnica do gotejamento, utilizada por 90% dos agricultores locais.
Campanhas contra o desperdício
"Não consideramos a água como um simples recurso natural, mas sim como uma matéria-prima tão importante quanto o petróleo. Fizemos dela um tema de segurança nacional e essa é a chave do sucesso", explica Eilon Adar, diretor do Instituto Zuckerberg para a Pesquisa em Água, da Universidade Ben Gurion de Neguev.
Mas Israel escapou por pouco. Entre 2005 e 2009, uma seca de rara intensidade prejudicou gravemente seus aquíferos e o lago de Tiberíades, suas principais fontes naturais. Para lidar melhor com o estado de emergência, em 2007 o Estado confiou a gestão do precioso recurso a uma nova agência interministerial, a poderosa Autoridade da Água.
"Nós pensamos como uma família que está gastando mais do que ganha: era preciso diminuir os gastos e aumentar a renda", conta seu porta-voz, Uri Shor. "A dessalinização é um aspecto central, mas não o único." Foram lançadas campanhas de conscientização contra o desperdício, os preços aumentaram e uma ampla operação de consolidação das tubulações teve início. Resultado: o consumo dos cidadãos caiu 20% entre 2008 e 2011.
Israel também enfatizou a reciclagem e a reutilização das águas residuais, uma prática da qual ele é o líder mundial inconteste: hoje, 86% de seu esgoto é tratado, contra 19% na Espanha, que ocupa o segundo lugar. A água que sai das estações de tratamento cobre dois terços das necessidades dos agricultores.
A poucos quilômetros de Sorek, uma visita à usina de tratamento de Shafdan, a maior do Oriente Médio, permite que se tenha uma ideia do tamanho dessa indústria. Suas imensas bacias recebem as águas residuais de toda a região central, ou seja, 2 milhões de pessoas e 7 mil fábricas e instalações industriais. O esgoto, com seu odor pestilento, é limpo de seus poluentes em menos de 24 horas graças à poderosa ação de microrganismos. Para concluir o processo, a água é injetada em reservatórios subterrâneos repletos de areias naturais que agem como filtros. "No final, é quase possível bebê-la", afirma Lior Paster, engenheiro da usina. Além disso, as fazendas que a recebem a usam para irrigar todo tipo de plantação, inclusive frutas e legumes mais delicados.
No kibutz Ramat Rachel, perto de Jerusalém, o agrônomo Shaul Ben Dov comemora essa trajetória. Na ocasião do último episódio de seca, os agricultores de sua comunidade decidiram arrancar as antigas macieiras, que consomem muita água, para substituí-las por cerejeiras. "Tivemos medo de que alguma hora as torneiras fossem secar", ele lembra. Enfileirados do outro lado da estrada, os pomares do kibutz, que produzem uma variedade de cereja muito apreciada no país, não carecem de mais nada hoje em dia. "Podemos regar à vontade, mesmo quando os invernos são secos", afirma Ben Dov. "O preço é alto, mas ficar subitamente sem água custaria bem mais caro."
Há quem acredite que o avanço israelense será realmente um sucesso caso permita mudar a configuração geoestratégica em um Oriente Médio minado pela falta de água. A divisão do recurso é um grande ponto de tensões com os territórios palestinos ocupados, mas "Israel agora tem todas as cartas na mão para propor um acordo mais justo", afirma Gidon Bromberg, da associação ambiental regional EcoPeace Middle East.
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