Reinaldo Azevedo - VEJA
Lembro de um trecho de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, de Machado de Assis: “Deus te livre, leitor, de uma ideia fixa; antes um argueiro, antes uma trave no olho”. É isto: melhor uma farpa nos olhos do que ser refém de saídas de manual que ignoram a realidade. É claro que eu sabia, e que todos sabiam, que o Copom elevaria a taxa básica de juros: a dúvida era se a elevação seria 0,25 ponto ou de 0,5 ponto. Deu meio ponto: agora está em 14,25%.
Eu sou
contra ou sou a favor a elevações de juros? A pergunta, se fosse feita,
seria imbecil. E a resposta, tautológica: sou a favor quando são
necessárias e contra quando são desnecessárias. E o mesmo vale para a
redução da taxa. A boa pergunta é outra: vai adiantar para conter a
inflação? Digamos que, em algum momento, sim. Mas a que custo?
Repito aqui
as indagações que fiz anteontem e ontem no programa “Os Pingos nos Is”,
que ancoro na Jovem Pan: a demanda está aquecida e, por isso, os preços
dispararam? Há alguma condição estrutural que a elevação possa corrigir?
Não que se saiba.
Assim, essa
elevação — e talvez ainda haja outra — só acarretará um aumento brutal
nas despesas do governo e terá pouca ou nenhuma influência na inflação,
derivada dos preços administrados, que não baixarão.
“Ah, mas
reduzindo a atividade, em algum momento, a inflação baixa…” Em que
momento? Não há resposta para isso, e noto que o pensamento mágico está
na base de algumas análises disfarçadas da mais fria racionalidade. Leio
coisas como: “Ah, na próxima reunião, o Copom pode elevar ainda em mais
meio ponto, e aí fica estável até o fim do ano”. Sei. Está escrito em
algum lugar que a inflação cai quando os juros são de 14,75% ou de
14,5%? E se não cair? Administra-se mais do mesmo remédio?
Reitero: eu
não tenho nada contra a elevação dos juros em si, como não tinha nada
contra a redução. Eu só me oponho quando objetivos alheios à natureza
das medidas entram em pauta. Agora ou antes.
Por que digo
isso? O governo não tem credibilidade. O prestígio de Joaquim Levy
ficou abalado depois da trapalhada protagonizada no caso do superávit
primário. O BC precisa, assim, posar de talibã dos juros para demonstrar
que ninguém por ali perdeu a fé na palavra — embora este governo se
mostre incapaz de cortar gastos para valer. O que ele faz é cortar a
previsão orçamentária, o que é coisa distinta.
A elevação
dos juros quer dizer apenas o seguinte: “Ó, não estamos flertando mais
com inflação, tá?”. Tá! Mas ela vai contribuir para baixar essa inflação
que está aí? A resposta: até pode. De tal sorte se dá um tombo na
economia que, em algum momento, cai…
Então tá!
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