terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Antes criticada, postura da Hungria contra refugiados começa a ganhar aceitação
Andrew Higgins - NYT
Leonhard Foeger/Reuters
Como a maioria dos membros da elite intelectual liberal da Hungria, George Konrad, um notável romancista, detesta o primeiro-ministro rudemente não liberal de seu país, Viktor Orban. "Ele não é um bom democrata e não acredito que seja uma boa pessoa", disse Konrad, um veterano das lutas da era comunista contra a ditadura.
Ao mesmo tempo, ele acha que Orban, o autodeclarado flagelo das elites por toda a Europa, estava certo e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, estava errada em relação à resposta ao fluxo caótico de imigrantes à procura de refúgio da guerra e da pobreza –talvez a crise mais séria da Europa desde a Segunda Guerra Mundial.
"Dói admitir, mas nesse assunto Orban estava certo", disse Konrad, 82 anos, lamentando que na ausência de um esforço conjunto europeu para controlar o fluxo, a Hungria foi sábia em fechar suas fronteiras e soar o alarme sobre os riscos de permitir a entrada a esmo de centenas de milhares de imigrantes, a maioria muçulmanos.
Discretamente, e com frequência com dúvidas semelhantes, um crescente número de pessoas na Hungria e além estão se perguntando se, apesar de sua mensagem estridente e com frequência intolerante, Orban tinha uma visão mais clara da escala da crise da imigração e seus riscos potenciais do que os tecnocratas em Bruxelas e os líderes em Berlim e outras capitais europeias.
Na verdade, as prescrições de Orban –notavelmente a necessidade de proteger a costa porosa da Grécia e fechar as fronteiras externas da Europa– estão sendo lentamente abraçadas por outros líderes da União Europeia, que prometeram na quinta-feira, em seu encontro de cúpula final de 2015, "retomar o controle" das fronteiras do continente.
Falando em Bruxelas ao final da cúpula na sexta-feira, Orban disse que "demoramos muito", mas agora há "um consenso absoluto entre os primeiros-ministros em torno da questão da proteção e controle das fronteiras externas". Com um grande sorriso, ele acrescentou: "Na verdade, esse era o ponto de vista da Hungria desde o início".
Apesar de repelidos por grande parte da fomentação de ódio que acompanha as posições de Orban, ainda assim os líderes europeus começaram a repetir muitos de seus pontos de vista, mas sem seus rosnados detestáveis. Isso revela o quanto mudou o debate em torno dos imigrantes e requerentes de asilo, particularmente desde as revelações de que alguns poucos dos terroristas que mataram 130 pessoas em Paris, em 13 de novembro, entraram na Europa junto com a maré de refugiados.
Em uma entrevista recente para os jornais europeus, Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, o órgão que preside as reuniões de cúpula da União Europeia, descreveu a abordagem receptiva de Merkel aos imigrantes como "perigosa" e endossou a posição há muito defendida por Orban –de que a maioria dos requerentes de asilo que entram na Europa não é de sírios fugindo da guerra, mas imigrantes econômicos à procura de empregos.
Enfatizando a necessidade de proteger as fronteiras externas da Europa, outra antiga exigência húngara, ele sugeriu que os requerentes de asilo permaneçam detidos por até 18 meses, para dar às autoridades tempo para identificação e envio de volta dos imigrantes econômicos.
"Isso mostra o quanto a opinião geral europeia agora está se movendo em outra direção", disse Peter Kreko, diretor do Instituto de Capital Político em Budapeste, uma organização independente de pesquisa. "Ela está se movendo para mais perto do que Orban representa."
Como prova, ele apontou para a recente vitória eleitoral na Polônia do ultraconservador e preocupado com conspirações Partido Lei e Justiça, o forte resultado na França da Frente Nacional de extrema-direita no primeiro turno das eleições regionais e o esfacelamento por toda a Escandinávia do consenso pró-imigrantes.
Peter Szijjarto, o ministro das Relações Exteriores da Hungria, disse que em suas reuniões com outros ministros europeus, o tom mudou drasticamente desde meados do ano, quando a Hungria era repetidamente condenada por erguer uma cerca para fechar sua fronteira sul aos imigrantes que desejavam chegar à Alemanha.
Cercas e outros obstáculos agora se tornaram a norma por grande parte da Europa, com até mesmo a Suécia, o país tradicionalmente mais receptivo da Europa aos refugiados, anunciando controles de fronteira mais rígidos.
"Está cada vez mais óbvio que o que vínhamos dizendo nos últimos seis meses estava certo", disse Szijjarto em uma entrevista. "Isso está sendo reconhecido cada vez mais: alguns dizem abertamente, alguns dizem por trás de portas fechadas e alguns não dizem nada, mas agem de acordo."
O apoio aberto a Orban e sua abordagem, que mistura medidas práticas eficazes para reduzir o fluxo de imigrantes com teorias conspiratórias bizarras envoltas em racismo e antissemitismo, limita-se em grande parte às margens políticas da Europa.
Em uma visita neste mês à Estônia, por exemplo, Szijjarto ouviu muitos elogios ao seu chefe, Orban, por parte do Partido Popular Conservador, um partido de oposição nacionalista com uma mensagem simples para imigrantes não brancos: "Se você é negro, vá embora".
A maioria dos políticos dirá apenas que "Orban não estava completamente errado", como comentou recentemente Reinhold Mitterlehner, o vice-chanceler conservador da Áustria.
As autoridades em Bruxelas, a sede da União Europeia, reconhecem de modo privado que Orban estava certo em muitas coisas, mas dizem que ele e seus simpatizantes minaram seus argumentos com seu discurso beligerante, que costuma tratar o afluxo de requerentes de asilo como uma invasão muçulmana, uma conspiração pelos socialistas europeus para importar futuros eleitores de esquerda e uma trama do filantropo judeu George Soros, de origem húngara, para minar os países europeus.
O elemento central da resposta comum da Europa à crise dos imigrantes tem sido um plano bem-intencionado, mas até o momento impraticável, de espalhar 160 mil imigrantes, que entraram por países na linha de frente como a Grécia, por todo o continente por meio de um sistema de quotas.
Apresentado sete meses atrás pela Comissão Europeia, o braço executivo da União em Bruxelas, com forte apoio de Berlim, o plano só conseguiu realocar 208 pessoas, provocou meses de recriminação divisora e deixou os 28 países da União em confusão.
Mesmo enquanto se deslocava na direção das políticas dele, a Comissão Europeia, farta de Orban zombar de sua impotência, anunciou no início de dezembro que levaria a Hungria à Justiça pela legislação que ela adotou em setembro, que dificulta para os requerentes de asilo apelar das rejeições aceleradas de seus requerimentos e outras alegadas violações das regras europeias.
Szijjarto, o ministro das Relações Exteriores húngaro, considerou a medida como "vingança" pela decisão da Hungria de contestar o plano de realocação baseado em quotas na Corte Europeia de Justiça.
A recente revelação pelas autoridades belgas de que Salah Abdeslam, um suspeito de participação nos ataques de 13 de novembro em Paris, viajou para a Hungria para buscar dois cúmplices que entraram na Europa junto com os imigrantes, provocou outra onda de comentários "eu lhe disse" em Budapeste.
O governo húngaro distorceu o que aconteceu, alegando contra todas as evidências de que os cúmplices pegos por Abdeslam eram refugiados. Mas o fato de terroristas aparentemente terem entrado na Europa escondidos entre os requerentes de asilo ainda justifica os alertas por Orban de que o fluxo incontrolado de tantas pessoas apresentava sérios riscos à segurança.
"Sempre que a Hungria argumentava a resposta era: 'São húngaros estúpidos. São xenófobos e nazistas'", disse Zoltan Kovacs, um porta-voz do governo. "De repente, fica claro que o que dizíamos era verdade. A ingenuidade da Europa é realmente espantosa."
Tradutor: George El Khouri Andolfato 

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