Contra a Lava Jato
Uma guerra virtual pelas mídias sociais precede a
análise na quarta-feira, pela Comissão de Constituição e Justiça do
Senado, da proposta do senador Roberto Requião para a lei de abuso de
autoridade. Os procuradores da Lava Jato viralizaram na internet um
vídeo em que pedem o apoio da sociedade para evitar a aprovação da
proposta, o que irritou muito Requião, que também gravou um vídeo
rebatendo as críticas.
E neste fim de semana três senadores que
se opõem ao projeto também distribuíram um vídeo. Randolfe Rodrigues,
Cristovam Buarque e Ragufe consideram que a proposta de Requião, ao
invés de ser contra o abuso de autoridade, é de proteção das autoridades
que estão sendo processadas em conseqüência da Lava Jato.
O
senador Randolfe Rodrigues, que apresentou um texto alternativo ao de
Requião, chega a dizer que a aprovação da proposta do senador paranaense
seria o fim da Operação Lava Jato. Embora a pressão política tenha
levado ao adiamento da votação, e o senador Requião tenha alterado
pontos de sua proposta para atender a sugestões do Procurador-Geral da
República, persistem potenciais ameaças à investigação e a decisões da
Justiça.
No artigo 1, que Requião chegou a dizer que havia sido
combinado com o Juiz Sérgio Moro e depois teve que recuar diante do seu
desmentido, está uma das principais causas de desentendimento. Está dito
que “A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e
provas, necessariamente razoável e fundamentada, não configura, por si
só, abuso de autoridade”.
O Juiz Moro, refletindo a posição da
maioria esmagadora dos agentes da Justiça, diz que a expressão
“necessariamente razoável e fundamentada”, por ser imprecisa, faz
persistir “o risco à independência judicial”. Ninguém é favorável ao
abuso de autoridade, alega Moro, mas o juiz não pode ser punido por mera
divergência na interpretação da lei, “especialmente quando dela
discordarem pessoas politicamente poderosas.”.
De fato, se
divergências de interpretação da legislação fossem consideradas crimes,
não haveria resultados de 6 a 5 no Supremo Tribunal Federal, nem mesmo
recursos a instâncias superiores. E, como disse com, bom humor o
ministro do Supremo Marco Aurélio Mello, conhecido por geralmente ir
contra a corrente majoritária, ele “já estaria preso”.
Outro
ponto que é visto como uma ameaça à atuação da Justiça está no artigo
3º, que prevê a possibilidade de o próprio investigado processar o
investigador. Além do fato de que uma acusação deve ser feita por um
órgão imparcial, e não pelo próprio investigado, os procuradores de
Curitiba consideram que réus poderosos usarão essa abertura da lei como
parte do arsenal jurídico para intimidar seus investigadores e
acusadores.
As acusações de abuso que já estão sendo feitas como
argumento de defesa por diversos acusados na Lava Jato passariam a ser
instrumento de intimidação, e razão para dezenas de ações. Mesmo que ao
final dos processos os promotores e procuradores viessem a ser
absolvidos, teriam perdido tempo e dinheiro respondendo às diversas
ações que serão colocadas no caminho do processo, retardando-o.
No
caso da Operação Lava Jato, quando cerca de 250 réus estão sendo
processados, quase todos com grande poder econômico, essas ações
serviriam para paralisar os processos. A proposta de legislação sobre
abuso de poder faz parte do mesmo esquema que já tentou anistiar o caixa
2 das campanhas eleitorais, e segue o mesmo caminho que os políticos
acusados na operação Mãos Limpas, na Itália, trilharam: substituir a
pauta anticorrupção pela contra supostos abusos de autoridade.
Mas
se, apesar de todas as restrições e protestos de diversos setores da
sociedade civil, essa proposta for aprovada na CCJ do Senado e depois no
plenário, a disputa certamente será levada ao STF, em mais uma etapa da
judicialização da política, pela incapacidade de negociação no
Congresso.
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