domingo, 2 de novembro de 2014

Nova política econômica
Amir Khair - OESP
Há consenso nas análises econômicas de que o maior desafio é retomar o crescimento interrompido nos últimos quatro anos. Mas as divergências surgem ao se discutir como fazer isso.
Uns acham que o modelo econômico baseado no estímulo ao consumo teve seu papel válido no período inicial da crise com a retração do mercado mundial. Mas esse modelo se esgotou, pois as pessoas compraram bens financiados e as prestações comprometem o orçamento doméstico, além do fato de estarem atendidas em parte de suas necessidades. Assim, o consumo precisa ser contido restringindo o crédito, e no lugar do consumo, fazer crescer o investimento.
Já o governo, para crescer, procurou fazer, e ainda continua fazendo, estímulos ao consumo, à produção e ao investimento através dos bancos oficiais no que diz respeito ao crédito, programas sociais e desonerações tributárias a setores empresariais que elege. Os resultados são decepcionantes. Nesses quatro anos de governo Dilma, o crescimento médio vai ser de 1,6% ao ano, índice inferior ao período negro da economia (1981 a 2003) de 2,0%. As contas fiscais estão cada vez piores com baixos superávits primários e alta despesa com juros, devendo neste ano ocorrer um déficit no setor público próximo a 4,5% do PIB, que vai ser o pior desempenho desde 2003, quando foi de 5,2% do PIB.
Nas contas externas, o déficit deste ano pode alcançar US$ 85 bilhões, acima do recorde do ano passado de US$ 81 bilhões. A inflação ronda desde 2010 na casa de 6% ao ano. Assim, com crescimento, contas internas, externas e inflação ruins para qualquer padrão de comparação não vejo razão alguma para a comemoração do governo pelo "sucesso" de sua política econômica e, nem de pôr a culpa no mau desempenho exclusivamente no fator externo.
Há de mudar a política econômica e não vejo que possa ocorrer de forma gradual. O tempo urge e se continuar nessa letargia não só o País terá rebaixamento na classificação de risco, mas, principalmente, elevação do desemprego e crise social.
O problema é que infelizmente não estou vendo saída nas propostas defendidas pelos dois candidatos na eleição passada. Ambas não tocam na questão das elevadas taxas de juros. Quando muito afirmam que só vão cair após resolver o problema fiscal, ou seja, com substancial elevação do superávit fiscal (receitas menos despesas exclusive juros no setor público).
Equilíbrio fiscal. Quem deseja consertar o dano fiscal que vem sendo cometido deve atacar simultaneamente todas as contas do setor público, inclusive e, principalmente, a de juros que consome 5,5% do PIB (!), um dos índices mais altos do mundo. Subordinar a redução dessa despesa às demais, como defenderam os dois postulantes ao Planalto, é postergar e inviabilizar a saída para a crise fiscal em marcha.
Tenho defendido, nesta coluna, três ações simultâneas para alcançar o equilíbrio fiscal (déficit zero): a) A mais rápida, e que depende apenas de determinar ao Banco Central a redução de um ponto porcentual da Selic a cada mês para conduzi-la ao cabo do primeiro semestre do ano a 6%, que é o nível da inflação quase estável desde 2010. Os países em sua maioria, sejam desenvolvidos ou emergentes, estão há vários anos com taxa de juros ao nível da inflação. No caso dos países emergentes, a inflação média gira no entorno de 6% ao ano e nos países desenvolvidos, no entorno de 2%, com alguma ameaça de deflação na Europa e no Japão; b) Retomar o crescimento econômico da fase Lula (média de 4,0%, com políticas apresentadas à frente) necessário para alavancar a receita pública e; c) Com gestão fiscal competente envolvendo maior priorização e controle de despesas. É a ação mais demorada e difícil para obter resultados, pois nas despesas primárias (custeio e investimento) só 36% depende do governo federal e 64% de Estados e municípios. Tratarei dessa ação em novo artigo.
Com essas três ações, será possível alcançar o equilíbrio fiscal e com ele a redução mais rápida da relação dívida bruta/PIB para o nível de 30%, que é próxima da média dos países emergentes. Longo percurso a ser conquistado, pois está o dobro disso.
Equilíbrio nas contas externas. O câmbio é de fundamental importância para alcançar o equilíbrio nas contas externas. Ele se encontra fora de lugar, que estimo em R$ 3,00/US$ (média atualizada de 2003/2007, quando ocorreu superávit externo). Nesse nível é possível elevar as exportações, reduzir as importações, reduzir os elevados déficits das viagens internacionais e de outras despesas com a conta de serviços. O câmbio pode fluir a esse nível caso, de fato, o governo o deixe flutuar, pois ele é administrado desde o Plano Real. Isso pode ocorrer se for determinado ao Banco Central que interrompa os leilões de swap cambial que já ultrapassam U$ 100 bilhões e reduza a elevada Selic, que causa excesso de dólares especulativos no mercado.
Crescimento. Para crescer, é necessário em primeiro lugar tirar o pé do freio da economia que são as taxas de juros ao consumidor e às empresas, respectivamente em 103% e 50% para financiamentos em 12 meses. Isso dobra (!) o preço dos bens, afeta o capital de giro das empresas e impede o financiamento do investimento. Em segundo lugar, reduzir a tributação ao consumo, especialmente sobre os bens populares. Essa tributação acrescenta 40% a 50% ao preço sem imposto. Juros e tributos em excesso para padrões internacionais fazem com que o País apresente preços bem acima da oferta internacional. O Brasil se tornou um país caro. Para estimular o investimento e a produção é necessário reduzir a Selic para permitir a opção das aplicações de recursos na atividade da empresa em vez de títulos do governo que apresentam rentabilidade e liquidez altas, sem risco. Outro estímulo é o câmbio no lugar, o que permite devolver às empresas a competitividade interna e externa face ao produto estrangeiro.
Preços e inflação. O nível de preços da economia é elevado diante da oferta internacional. Há que reduzi-los. Como visto, são precisos a redução dos juros ao consumo e da carga tributária incidente sobre o consumo. Além disso, a redução do custo dos insumos do início das cadeias produtivas (minério de ferro/aço, nafta/gás petroquímico, celulose, etc.) através de desoneração total sobre a importação.
Quanto à inflação (variação dos preços) há de ter políticas articuladas fiscal e monetária para combatê-la, pois é de ambas e de outras políticas públicas que o controle de preços deve ser exercido. Em primeiro lugar, há de considerar que 80% (!) da inflação não depende do Banco Central, pois não são alcançados pela Selic a inflação de serviços (35%), de alimentos e bebidas (25%) e de preços monitorados (20%). Apenas 20% da composição do IPCA depende da Selic, que manipula o câmbio para tornar os bens importados baratos, causando as distorções econômicas apontadas.
Há de se implementar nova política econômica. E o momento é agora.

Nenhum comentário: