sábado, 3 de maio de 2014

Cientistas estabelecem relação entre comportamento de meninos e finanças
David Leonhardt - NYT
Shutterstock
 
A diferença de comportamento entre crianças ricas e pobres, desde as idades mais tenras, é um tema bastante conhecido da ciência social hoje. Ao entrar no jardim da infância, as crianças ricas não só sabem mais palavras e conseguem ler melhor do que as crianças mais pobres como também têm intervalos maiores de atenção, temperamentos mais controlados e são mais sensíveis às outras crianças.
Tudo isso torna as comparações entre meninos e meninas pertencentes às mesmas categorias surpreendentes: a diferença de habilidades comportamentais entre meninas e meninos é ainda maior do que a diferença entre ricos e pobres.
No jardim da infância, as meninas são mais compenetradas, mais comportadas, mais sensíveis, mais persistentes, mais flexíveis e mais independentes do que os meninos, de acordo com um novo artigo da Third Way, um grupo de pesquisa de Washington. A diferença cresce ao longo do ensino fundamental e alimenta as diferenças acadêmicas entre os sexos. No oitavo ano, 48% das meninas tiram uma mistura de notas entre A e B (ou mais As). Apenas 31% dos meninos tiram essas notas.
Em uma economia que recompensa o conhecimento, as dificuldades dos meninos nas escolas se transformam em dificuldades econômicas. Os salários dos homens estão estagnando. Os homens têm uma probabilidade bem maior de ficarem desocupados --nem trabalhando, nem procurando trabalho, nem cuidando da família-- do que antes e muito mais chances de ficarem desocupados do que as mulheres.
Já reportamos que os Estados Unidos havia perdido sua liderança global, antes enorme, nos salários da classe média, baseado em pesquisas de renda internacionais ao longo das últimas três décadas. A renda líquida média no Canadá foi mais alta no ano passado do que a mesma métrica nos EUA. Os pobres no Canadá e na maior parte do oeste da Europa ganham mais do que os pobres nos EUA.
Essas tendências têm muitas causas, mas as dificuldades sociais dos homens e meninos são uma causa importante. Se os Estados Unidos quiserem construir uma economia mais funcional do que a que tivemos nos últimos 15 anos, teremos que resolver os problemas dos nossos meninos.
Colocando de outra forma, a economia dos EUA --apesar de todos os seus problemas (e de todo o sexismo que ainda persiste)-- parece estar indo muito bem no que diz respeito às meninas. A porção de mulheres que se formam em cursos universitários de quatro anos cresceu mais de 75% ao longo do último quarto de século, tal como aconteceu em outros países desenvolvidos. A renda média das mulheres, ajustada pela inflação, cresceu quase 35% no mesmo período, mostram dados do censo --enquanto a renda dos homens, inacreditavelmente, não cresceu nada.
"Sabemos que temos uma crise, e que a crise é com os meninos", disse Elaine Kamarck, acadêmica residente da Third Way e ex-funcionária do governo Clinton. "Não temos muita certeza do porquê isso está acontecendo."
Duas das principais teorias envolvem famílias de mães ou pais solteiros e as escolas. O número de famílias de mães ou pais solteiros cresceu durante a última geração, e o efeito parece ser maior sobre os meninos dessas famílias do que sobre as meninas. As meninas que crescem com apenas um dos pais --normalmente a mãe-- em média têm um desempenho tão bom quanto as meninas com dois pais. Os meninos não.
Mas as tendências parecem amplas demais para a estrutura familiar ser a única causa. É aí que entram as escolas.
As meninas entram na escola à frente dos meninos, e a escola não consegue eliminar as diferenças. A vantagem comportamental que as meninas têm em relação aos meninos no jardim da infância, baseada nas avaliações que os professores fazem dos alunos, é ainda maior no quinto ano.
Então, uma menina média chega a 60% em um índice de capacidades comportamentais e sociais, enquanto o menino médio chega a apenas 40%, de acordo com Claudia Buchmann, de Ohio, e Thomas DiPrete, de Columbia, autores do novo artigo. A diferença de 20 pontos percentuais é maior do que a diferença de 14 pontos entre crianças pobres e não pobres ou os 15 pontos de diferença entre crianças brancas e negras.
Essas métricas de comportamento são subjetivas, é claro, e baseadas no ponto de vista de professores em todo o país em salas de aula bem diferentes. Contudo, está claro que as métricas refletem algo real, porque as diferenças de comportamento mais tarde se traduzem em diferenças acadêmicas. No segundo grau, até as aulas de matemática e ciências avançadas agora têm mais meninas do que meninos. Nas cerimônias de graduação das universidades de todo o país nesta primavera, mulheres com becas e chapéus irão facilmente superar o número de homens.
Os especialistas que estudam o tema discordam quanto às soluções. Alguns, como Buchmann e DiPrete, apontam que os meninos continuam indo relativamente bem nas escolas de melhor desempenho. Quando as notas boas trazem status, os meninos respondem. Para os pesquisadores deste campo, a resposta envolve melhorar as escolas, que terão um efeito desproporcional sobre os meninos, em vez de mudar as escolas para que elas estejam mais adequadas às necessidades dos meninos.
Outros, como Christina Hoff Sommers, argumentam que o sistema de educação atual não reconhece as profundas diferenças entre meninos e meninas. Ele pede aos meninos para ficarem sentados por quatro horas todos os dias e oferecem a eles poucos modelos de comportamento diante da classe. Assim como a falta de professoras de ciências nas escolas desestimula alunas que estudariam ciências na faculdade, a falta de professores homens no quarto ano cria problemas para os meninos de 10 anos de idade.
Minha opinião é que ambos os lados têm uma certa razão --e que suas ideias não são mutuamente exclusivas. Experimentar com todos os tipos de soluções oferecerá respostas melhores do que as que temos agora.
Os problemas advindos de gênero se tornaram uma faca de dois gumes. As velhas formas de sexismo, embora tenham diminuído bastante, ainda restringem as mulheres. O mercado de trabalho cobra um preço muito alto sobre as finanças e as carreiras daqueles que decidem trabalhar meio período ou parar de trabalhar por um tempo, e os trabalhadores que fazem isso são em sua maioria mulheres. É em grande parte por isso que as altas hierarquias do mundo corporativo dos EUA, Vale do Silício e do governo continuam dominadas por homens.
Mas os homens têm seus próprios desafios. À medida que a economia continua deixando os músculos de lado em favor dos cérebros, muitos homens tiveram dificuldades com a transição.
"Os meninos estão recebendo a mensagem errada sobre o que precisam fazer para serem bem sucedidos", disse Buchmann. "Os papéis tradicionais de gênero estão confundindo os meninos. Na economia de hoje, ser durão e ser forte não é o que leva ao sucesso."
O problema não envolve simplesmente os homens tentarem superar as demissões em uma fábrica local ou os meninos adolescentes evitarem confusão. Envolve crianças tão novas que a maioria nem aprendeu a palavra "gênero". Mas seu gênero já está começando a exercer um papel importante em suas vidas.
Tradutor: Eloise De Vylder

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