quinta-feira, 1 de maio de 2014

Escândalo de espionagem não deve dominar visita de Merkel aos EUA 
Nikolaus Blome, Gregor Peter Schmitz e Holger Stark - Der Spiegel
24.out.2013 - Fabrizio Bensch/ReutersA chanceler alemã, Angela Merkel, cujo celular pessoal foi alvo de espionagem pela NSA A chanceler alemã, Angela Merkel, cujo celular pessoal foi alvo de espionagem pela NSA 
Em 14 de abril, o embaixador alemão Peter Ammon esteve no Passeio Nacional para anunciar a reabertura do Jardim da Amizade Germano-Americana após uma extensa reforma. Ele ficou atrás de uma tribuna de madeira em uma grande tenda organizada pela embaixada, flanqueado pelas bandeiras alemã e americana. Uma orquestra tocou os hinos nacionais de ambos os países enquanto, atrás dele, a Casa Branca era banhada pela luz do sol de primavera.
O evento visava melhorar as relações germano-americanas. Os americanos doaram o jardim em 1983, mas de algum modo ele permaneceu negligenciado ao longo dos anos. Ammon plantou sálvia no solo recém preparado, uma planta medicinal que pode ser usada para tratar resfriados. O embaixador alemão de partida disse que a cerimônia foi "altamente simbólica".

Encruzilhada difícil

Quando a chanceler alemã Angela Merkel viajar para Washington no final desta semana, o sucessor de Ammon, Peter Wittig, já terá assumido na capital americana. É uma coincidência, mas significativa, porque as relações germano-americanas estão em uma encruzilhada difícil, prejudicadas pelo escândalo de espionagem da NSA, que envolveu o monitoramento do celular de Merkel, atoladas nas negociações complicadas do acordo de livre comércio transatlântico (TTIP) e desafiadas pelos novos esforços de Moscou de mudar a balança de poder global.
Quando ela chegar a Washington, a chanceler alemã terá ao menos um motivo para ser grata ao presidente da Rússia, Vladimir Putin. A escalada da crise na Ucrânia permitirá que ela demonstre um senso de unidade transatlântica em um relacionamento, fora isso, estragado atualmente por um profundo desentendimento. "A crise Leste-Oeste veio a calhar", disse um assessor de Merkel.
Durante a visita de Merkel, Obama provavelmente alertará o público alemão sobre o risco da inação ou de uma paralisia política em relação à Rússia, diz Julianne Smith, ex-vice-conselheira de segurança do vice-presidente americano, Joe Biden. Ela diz que Obama também provavelmente descreverá a chanceler como sendo uma "líder impressionante" ou uma "amiga próxima", como costuma fazer.
No contexto da crise na Ucrânia, essas declarações podem ser genuínas. Muitos em Washington veem Merkel como alguém com uma linha direta de comunicação com o presidente russo. Dado que as relações germano-americanas atualmente representam o núcleo da relação transatlântica, Merkel virá na condição de chanceler alemã mais poderosa que já visitou Washington, diz Robert Kimmitt, que serviu como embaixador americano na Alemanha sob o presidente George Bush pai.

Escândalo de espionagem

Mas isso não será de ajuda em relação ao caso de espionagem da NSA. Obama buscou enterrar a disputa após impor alguns limites aos serviços de inteligência americanos em meados de janeiro. Ele o fez sem fazer qualquer pergunta fundamental sobre os modos como as agências americanas coletam dados em massa.
Annette Heuser --chefe do escritório em Washington da Fundação Bertelsmann, o centro de estudos sem fins lucrativos afiliado ao conglomerado multimídia alemão-- diz que o monitoramento da chanceler foi uma "quebra de confiança" que ainda afeta as relações. "O governo Obama ainda não entendeu que, se não esclarecer o assunto, ele continuará sendo um fardo duradouro nas suas relações com a Alemanha." Para demonstrar uma unidade transatlântica para Moscou, ela diz, Merkel precisará de "compromissos concretos do presidente de forte limitação das atividades de espionagem da NSA na Alemanha".
Em vez disso, fontes no governo acreditam que a abordagem dela não irá além da indignação --por causa do conflito com a Rússia.
Christoph Heusgen, conselheiro de relações exteriores de Merkel, está atualmente discutindo com sua colega Susan Rice, na Casa Branca, o possível texto para uma coletiva de imprensa conjunta. Quando perguntado quão longe é esperado que o presidente americano vá em sua explicação da interceptação do celular da chanceler, fontes em Berlim responderam sobriamente: "Ele não dirá muito".
Obama e Merkel querem lançar oficialmente um "diálogo estruturado" --um gesto que dificilmente terá muito valor prático. Como parte do programa, autoridades do governo, membros do Parlamento, representantes do meio empresarial e especialistas de vários campos de ambos os países se reuniriam regularmente para tratar de questões ligadas a liberdade, segurança, direitos civis e os "grandes dados". O ministro das Relações Exteriores alemão, Frank-Walter Steinmeier, e o secretário de Estado americano, John Kerry, concordaram com o formato pouco tempo atrás e um representante do governo em Washington visitou recentemente Berlim para as primeiras conversas para organização do diálogo.
Mas nenhum progresso é esperado em relação ao acordo de "nenhuma espionagem" prometido por Merkel aos eleitores como parte de sua campanha de reeleição no ano passado. Merkel pessoalmente deseja --de seu modo tipicamente pragmático e frio-- colocar o caso da NSA de lado. A crise na Ucrânia pode ajudá-la a fazer isso: "Agora há coisas para tratar que são mais importantes que as histórias da NSA", disseram fontes no governo.
Além de tratar da crise na Ucrânia, Merkel quer mapear os pontos em comum enquanto prosseguem as negociações de uma zona de livre comércio transatlântica. Merkel está planejando apenas um discurso público durante sua visita, e ela o usará para promover o TTIP perante os membros da Câmara de Comércio dos Estados Unidos.
Karel de Gucht, comissário de comércio da União Europeia, também reconheceu isso --e ele diz preferir que o acordo de livre comércio esteja no topo da agenda do que o escândalo da NSA. Apesar de dizer que se solidariza com a fúria da chanceler pela espionagem ao seu celular, ele aponta que "uma forte economia de exportação como a Alemanha lucraria especialmente com o TTIP".
"Eu presumo que ela enviará uma mensagem clara a respeito da necessidade deste acordo de livro comércio durante a visita dela a Washington", disse. "Não se pode esquecer que foi ela quem teve esta ideia --afinal, ela estabeleceu as fundações sete anos atrás."
Tradutor: George El Khouri Andolfato

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