sexta-feira, 2 de maio de 2014

Especial Veja: Celso Furtado, sozinho na ilha da razão
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De ambos os lados dos acontecimentos de 1964 havia homens brilhantes, honrados, indecisos, aproveitadores ou canalhas. Do lado da esquerda, provavelmente nenhum era tão excepcionalmente qualificado quanto o economista paraibano Celso Furtado. Estava em sua sala na sede da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, no Recife, quando soube que a Voz da América noticiava a eclosão de um levante militar em Minas contra João Goulart. Não chegava a ser uma surpresa para Furtado, ilha de razão em meio ao caos de uma administração comandada por um presidente que considerava “fraco”.
Na Sudene, sentia-se assediado pelas demandas do Partido Comunista e pouco sobrava do Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, que havia apresentado como ministro do Planejamento. “As reformas de base foram mal definidas e usadas como bandeiras de mobilização de massas, sem viabilidade em face da estrutura do poder vigente no país”, analisou o próprio Furtado, anos depois da madrugada em que saiu da sede da Sudene e foi ao encontro do governador Miguel Arraes.
Encontrou-o de roupão, falando ao telefone. Juntos souberam que o general Amaury Kruel havia aderido aos rebeldes. Pela manhã, foi à sede do IV Exército e disse que, se quisessem prendê-lo, tinha endereço certo. Voltou à Sudene e, à noite, sentindo-se só, quis ouvir música – na juventude, havia sonhado ser crítico musical. Talvez pelo canto final de vitória, escolheu Alexandre Nevsky, de Prokofiev, compositor que sobreviveu ao stalinismo acatando no fim da vida as “correções” oficiais em sua poderosa obra. Dias depois, em Brasília, Furtado escutou no rádio lerem o seu nome na primeira lista de pessoas cassadas da vida pública. Sentiu-se homenageado.
Colaboradores: André Petry, Augusto Nunes, Carlos Graieb, Diogo Schelp, Duda Teixeira, Eurípedes Alcântara, Fábio Altman, Giuliano Guandalini, Jerônimo Teixeira, Juliana Linhares, Leslie Lestão, Otávio Cabral, Pedro Dias, Rinaldo Gama, Thaís Oyama e Vilma Gryzinski.

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