O vazio político na França
Gilles Lapouge - O Estado de S.Paulo
A França atravessa um momento estranho. Politicamente,
parece que o país está flutuando. É indecifrável. Duas eleições - as
municipais e as europeias - acompanhadas de um escândalo de corrupção
(envolvendo o líder da direita Jean-François Copé) bastaram para
transformar sua paisagem numa espécie de deserto.
A leitura dos jornais no início da semana foi divertida: os
periódicos de direita falavam apenas da esquerda e os de esquerda só se
referiam à direita. O Figaro não escondeu sua satisfação com o desastre
que vitimou os socialistas de François Hollande nas eleições europeias.
O Libération, pelo contrário, deleitou-se ao detalhar a inexorável
"descida ao inferno" do partido de direita, UMP, depois de um dirigente,
o insuportável Copé ser pego em flagrante delito, com inúmeras faturas
falsas.
O problema é que o Figaro tem razão e o Libération também. Ou seja, o
Partido Socialista e o UMP fizeram tantas cretinices (os socialistas)
ou vilanias (a direita) que parecem peixes na areia procurando respirar
em vão.
É evidente que essa fragilidade das duas agremiações abre na
geografia política um vasto espaço inocupado e portanto disponível para
outros participantes. Que são os da extrema direita: o partido fascista
de Marine Le Pen (a Frente Nacional, criada pelo pai de Marine,
Jean-Marie Le Pen), abocanhou 25% dos votos. Ficou bem na frente da UMP e
ainda mais dos socialistas.
Disputa. Em 2017, haverá eleições presidenciais na
França. A Frente Nacional teria chances de assumir o poder se os dois
partidos que se alternam no governo, os socialistas e a UMP, não
conseguirem se regenerar, ou melhor, passar por uma reformulação.
Primeira missão: descobrir líderes. Nos anos 60 e 80, a direita
francesa tinha o general De Gaulle, gênio e herói ao mesmo tempo. Em
seguida, surgiu um socialista de envergadura, François Mitterrand.
Esses dois homens parecem gigantes quando comparados aos "anões" que
hoje grunhem e estufam seus minúsculos peitos. À direita, não vamos
falar de Copé, um especulador sombrio e insípido. O verdadeiro chefe da
direita ainda é o ex-presidente Nicolas Sarkozy, que espera retornar ao
poder em 2017.
Ora, Sarkozy legou uma França extenuada, inerte. E esteve no centro
de tantos negócios nauseabundos (financiamento de campanha pelo ditador
líbio Muamar Kadafi, vendas duvidosas de submarinos ao Paquistão e
outros negócios ilícitos) que Copé parece, em comparação, um cordeiro.
E à esquerda? Mas que esquerda? A esquerda do socialista Hollande,
que empreende uma política de direita, desprovida de qualquer talento?
Mas sejamos otimistas.
Talvez nos livremos de Hollande em 2017, se o seu fracasso for
determinante. Então, será preciso buscar uma figura brilhante em meio
aos jovens socialistas? É provável que exista algum jovem talentoso, mas
no momento ele está oculto.
O quadro não é auspicioso. E torna-se mais sombrio se ampliarmos o
foco para o restante da Europa. Porque em toda a parte é a mesma
situação. As populações revoltadas com os partidos no governo votaram a
favor de líderes improváveis, aventureiros pouco democráticos, com
discursos xenófobos, por vezes racistas.
Essa foi a lição de fato das últimas eleições europeias: praticamente
por todo lado o partido vencedor foi essa enorme multidão de cidadãos
que detesta a política e odeia os políticos.
Claro que há algumas exceções: na Itália um jovem líder de esquerda,
Matteo Renzi, saiu triunfante. Mas se Renzi é um homem de esquerda, isso
é recente, uma vez que ele surgiu da democracia cristã.
Outra exceção foi a Alemanha, da poderosa Angela Merkel. E por aí vamos! Tentemos sonhar com a senhora Merkel. Ao trabalho!
TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
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