De boca fechada
João Bosco Rabello - OESP
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, poderia
mesmo ter evitado os adjetivos que empregou ao anunciar o fim das
desonerações nas folhas de empresas, implantado no primeiro mandato da
presidente Dilma Rousseff. Mas esse não é o ponto central do episódio.
O ministro poderia se limitar a anunciar o fim do
ciclo de desonerações sem fazer juízo e valor, mas até para a
justificativa indispensável a atos dessa natureza, precisa exercer a
crítica. Se um programa é suspenso ou revogado, é imprescindível saber a
razão.
Não fosse a defesa pública da presidente à
implantação das desonerações, o caso teria menor importância. A reação
da presidente à classificação de “grosseiro”, empregada por Levy na sua
crítica, poderia até se resumir ao que o ministro da Defesa, Jacques
Wagner, chamou de “alinhamento”.
O problema é que a presidente acrescentou à sua
reprimenda, diagnóstico oposto ao de Levy: para ela, as desonerações não
foram ruins e, muito menos, “uma brincadeira de R$ 25 bilhões”, como
afirmou o ministro da Fazenda. Aqui , a divergência chama a atenção,
menos pela polêmica, mas por colocar uma vez mais em dúvida o apoio de
Dilma às medidas do ajuste fiscal.
Ou, no mínimo, realçar que a convicção da presidente
no campo econômico não mudou. Algo na linha do “faria tudo outra vez” – o
que talvez pense para após o ajuste, já que o definiu como uma pausa
para a retomada do ciclo de crescimento.
Nessa toada, considerada a reprimenda anterior ao
ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, estabeleceu-se um cenário
inusitado: a equipe econômica deve aplicar as medidas necessárias à
recuperação da economia, sem mencionar jamais as causas que a levaram ao
chão.
Mudou-se o ministro da Fazenda, não porque os maus
resultados do antecessor assim recomendassem. Talvez porque Guido
Mantega estivesse cansado ou sua vida particular o requisitasse. Pela
economia, não faria sentido, é o que deixa sugerido o veto a críticas
por parte do sucessor.
Levy tem, assim, que conduzir os ajustes necessários à
retomada da economia, “pisando em ovos”, pois cada explicação para
determinada medida, requer cautela para não provocar melindres – não só
no seu antecessor e no seu partido, mas também na própria presidente da
República.
O que Dilma impõe é que a equipe econômica faça seu
serviço calada, retirando do cidadão afetado pela recessão, a
compreensão do que se passou, do que está sendo decidido e a relação de
causa e efeito entre ambos. Não é para entender, mas simplesmente
aceitar.
A presidente não quer a exposição dos erros da
política econômica do primeiro mandato – ou melhor, das mudanças que
implementou. Não só pelo efeito político negativo, mas porque ainda
parece comungar de convicções que já deveriam ter sido revogadas pelos
resultados desastrosos.
Essa postura reduz substancialmente a autoridade
política da presidente para enquadrar seu partido, o PT, que contesta o
ajuste fiscal, em tom de oposição ao governo. E mais ainda o PMDB.
Se transmite a ideia de que faz o ajuste de nariz
tapado, a contragosto, e avessa a críticas sobre o que o torna
irreversível hoje, não tem credibilidade para exigir o voto da base
aliada à sua aprovação.
Na melhor das hipóteses, Dilma repete o comportamento
do PT que, segundo seu líder no Senado, Humberto Costa (PE), finge
descontentamento com o ajuste fiscal apenas para “marcar posição com o
eleitor”. Na hora certa, diz ele, o partido não faltará ao governo na
aprovação das medidas recessivas.
Outro efeito colateral desse comportamento da
presidente é o de reforçar a percepção sobre sua perda de autonomia na
condução da economia. Se discorda dos diagnósticos, por óbvio rejeita o
remédio. Se, no entanto, este é aplicado, quem está no leme não é ela.
Trocando em miúdos, Dilma não pode prescindir de
Levy, ainda que torça o nariz para sua receita recessiva. Conhecido seu
temperamento, ninguém duvida de que em outros tempos, de altos índices
de aprovação e com os números da economia ainda manipuláveis, sua reação
iria muito além do conformado “infeliz”, com que se queixou da fala do
ministro.
Dilma foi moderada para seus padrões de reprimenda, o
que indica consciência da fragilidade de seu governo. Nesse momento,
talvez seja mais recomendável à presidente a cautela que exige de Levy
no relacionamento de ambos, forçado pela crise econômica.
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