sábado, 25 de abril de 2015

Quênia planeja muro para manter a violência fora do país
Isma'il Kushkush - NYT
Ben Curtis/AP
8.abr.2015 - Um funcionário de necrotério caminha entre caixões prontos para receber os corpos de algumas das vítimas do ataque terrorista à Universidade de Garissa, em Nairóbi, nesta quarta-feira (8). O Quênia divulgou nesta quarta-feira uma lista de 85 pessoas e empresas, incluindo ao menos 13 sociedades de transferência de dinheiro, com supostos vínculos com a milícia islamita somali Al-Shebab, que terão suas contas bancárias bloqueadas preventivamente
8.abr.2015 - Um funcionário de necrotério caminha entre caixões prontos para receber os corpos de algumas das vítimas do ataque terrorista à Universidade de Garissa, em Nairóbi, nesta quarta-feira (8). O Quênia divulgou nesta quarta-feira uma lista de 85 pessoas e empresas, incluindo ao menos 13 sociedades de transferência de dinheiro, com supostos vínculos com a milícia islamita somali Al-Shebab, que terão suas contas bancárias bloqueadas preventivamente
Quando o portão da fronteira foi aberto no início da manhã, micro-ônibus desembarcaram passageiros, carrinhos puxados a burro trotaram para o outro lado e pedestres começaram a atravessar livremente, em ambas as direções.
Os guardas quenianos parados do lado das guaritas vazias na fronteira assistiam casualmente ao fluxo de pessoas entrando e saindo do país. Os muitos laços familiares, econômicos e educacionais entre os dois lados são arraigados demais para que qualquer linha divisória seja prática, dizem muitos moradores locais.
Mas os ataques recentes da Al-Shabab, o grupo extremista somali que já matou centenas de pessoas no Quênia nos últimos dois anos, deram origem a uma proposta nacional ambiciosa que deve começar aqui: uma enorme barreira ao longo dos 682 quilômetros de fronteira com a Somália.
"Todos os problemas vêm daquele lado", disse Abdi Billow, 60, um queniano de ascendência étnica somali que vive em Mandera.
Esta região distante no norte do Quênia sofreu a maior parte da violência, incluindo ataques – a um ônibus de professores durante o Natal e contra trabalhadores de uma pedreira no ano passado – em que cristãos foram separados dos muçulmanos e assassinados a tiros.
Um dos agressores do ataque que deixou quase 150 pessoas mortas em uma universidade no leste do Quênia este mês também veio daí.
"Um muro será um grande passo para instituir algum controle sobre o movimento", disse Alex Nkoyo, comissário distrital do Condado de Mandera.
As autoridades quenianas dizem que os equipamentos de construção chegaram em Mandera para levantar o que muitos chamam de muro, mas que na verdade é uma barreira composta de de cercas, valas e guaritas que se estendem de Mandera ao Oceano Índico.
"Não é como a Grande Muralha da China", disse Mwende Njoka, porta-voz do Ministério do Interior. "Isso seria caro demais."
O projeto provocou um debate aqui em Mandera, onde os dois lados da fronteira são bastante interligados.
Bula Hawa é cidade-irmã de Mandera, querendo ou não, do outro lado da fronteira, no lado somali – uma fronteira que não significa muito para boa parte dos moradores.
Os serviços de telefonia celular aqui costumam flutuar entre companhias quenianas e somalis, e os comerciantes atravessam a fronteira para cá e para lá. Algumas crianças da Somália vêm a Mandera, onde é mais seguro, para ter uma educação formal, e até o comissário do distrito de Bula Hawa tem uma casa em Mandera.
Também existe a questão de como uma barreira na fronteira será capaz de lidar com o extremismo que vem crescendo lentamente entre os próprios quenianos, alguns implicados em ataques fatais, entre eles o da universidade.
"Um muro de segurança não vai ajudar", disse Ishak Aden, 60, um somali de Bula Hawa. "A Shabab se mistura com o povo e tem muitos espiões."
George Morara, vice-presidente da Comissão Nacional do Quênia para Direitos Humanos, disse: "a guerra contra o terrorismo precisa ser uma ação bem coordenada entre as polícias e liderada pela inteligência, capaz de prevenir ativamente os ataques terroristas antes que eles ocorram em solo queniano."
Ele acrescentou: "O que temos de fazer enquanto país é adotar estratégias de longo prazo visando criar oportunidades de emprego bem remunerado para os jovens, que estão cada vez mais se tornando alvos fáceis para as iniciativas de recrutamento da Al-Shabab."
Dawud Farah, 60, vende camelos em um mercado de gado local, onde o preço médio de um desses animais chega perto dos US$ 900. Ele explica que os camelos seguem para pastagens disponíveis, e chegam a avançar até 50 quilômetros em território somali.
"Os camelos não vão passar pelos portões", disse ele, observando que o gado muitas vezes cruza a fronteira empoeirada entre os dois países onde não existem portões, guaritas ou guardas.
Mas Abdullah Mohamed, de 51 anos, outro empresário, discorda.
"Eu quero o muro", disse ele. "Homens armados vêm do outro lado, atacam e fogem. Meus parentes foram assassinados."
Em outro mercado, Zeinab Hassan, 45, uma mãe divorciada de três filhos, cruza a fronteira para Mandera para comprar pilhas de khat, uma folha que é mascada como estimulante, e vendê-las em Bula Hawa.
"Nós não queremos o muro", ela gritou.
Mas Rubaba Mohamed, 50, uma viúva e mãe de nove filhos, também de Bula Hawa, disse que apoia a ideia de um muro, desde que seja possível atravessar.
"A segurança é ruim", disse ela. "Desde que eu possa comprar o meu khat para vender, não me importo."
Mohamed Abdi, 38, é vice-presidente do mercado de khat. Ele acredita que o verdadeiro problema está na corrupção.
"Um guarda de fronteira fica com 50 shillings e você pode passar", disse ele, citando o equivalente a cerca de 55 centavos de dólar.
Conhecido pelo apelido de Bush, porque apoiou a missão do presidente George H.W. Bush na Somália quando era adolescente, Abdi Abdi acredita que o comércio, incluindo os preços dos alimentos, irão sofrer por causa do muro.
"Um saco de arroz da Somália custa 1.500 xelins", ou quase US$ 17, disse ele. "Não há impostos na fronteira."
Mas o mesmo saco de arroz na capital queniana, Nairobi, custa US$ 50. "Não podemos pagar isso."
Tradutor: Eloise De Vylder 

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