Mira Kamdar - TINYT
Philippe Huguen/AFP
Imigrantes pulam a cerca em Coquelles, próximo a Calais, no norte da França, para chegar à ferrovia que leva ao terminal do Eurotúnel
Depois que me mudei para Pantin, na fronteira com Paris, percebi que meu status como estrangeiro na França havia mudado. Ao deixar Paris e ir para o banlieue [periferia da cidade], eu tinha deixado de ser um expatriado norte-americano e me tornado apenas mais um imigrante na França.
Pantin fica no departamento de Seine-Saint-Denis, que tem um dos maiores números de residentes estrangeiros legais na França: 450 mil, quase um terço da população do departamento. Pantin tem aquele tipo de energia criada pela mistura de gente e pelo influxo de recém-chegados, coisa da qual eu sentia falta depois que me mudei de Nova York para Paris.
A vida de imigrante também significa
enfrentar o labirinto burocrático da França. As prefeituras de polícia é
que cuidam dos assuntos de imigração aqui. Em Paris, os
norte-americanos –-e estrangeiros de alguns outros países-– são enviados
para uma sala no andar de cima. Lá, eu peguei um número e em meia hora
estava sentado diante da mesa do administrador. No térreo, uma sala
cheia de pessoas, cuja maioria parecia ser da África sub-saariana e do
Magreb, esperavam pela sua vez diante de um guichê. Agora eu tenho
alguma ideia do que eles passavam.
Em janeiro, dei entrada no processo de mudar o meu endereço no meu cartão de residência, coisa que eu achei que seria simples. Mas a prefeitura de polícia central de Seine-Saint-Denis em Bobigny processa cerca de 1.500 solicitações de estrangeiros por dia, e não há sala de espera separada para os norte-americanos. O tempo de espera costumava ser tão longo que as pessoas chegavam na noite anterior ao horário marcado ou pagavam alguém para ficar na fila. Em 2013, uma nova equipe assumiu o comando e simplificou um pouco o processo, então, pelo menos, as filas durante a noite se foram, e as reservas de vagas também.
Ainda assim ainda levou seis meses, incluindo dois dias inteiros na prefeitura, para atualizar meu endereço. Eu preenchi um formulário na internet no início de janeiro, e consegui um horário em 6 de março. Cheguei cedo e fui encaminhado para uma sala grande cheia de gente. À medida em que o dia passava, pais tentavam acalmar as crianças inquietas e os bebês que choravam. Todos nós sabíamos que não tínhamos escolha: se quiséssemos ficar na França, tínhamos de esperar.
Quando voltei –-três meses depois-– para pegar o meu novo cartão, abri o livro que eu tinha levado para passar o tempo, e ele me pareceu a escolha perfeita: "The Meursault Investigation" ["A Investigação Meursault"], de Kamel Daoud. O autor, que é argelino, imagina a história de "O Estrangeiro", de Albert Camus, do ponto de vista do irmão do argelino sem nome morto a tiros pelo herói francês, Meursault. Muitos dos estrangeiros na prefeitura de Bobigny vêm de ex-colônias francesas na África sub-saariana e no Magreb. Em busca de residência legal, eles pedem o reconhecimento oficial de sua existência na França.
A maioria dos estrangeiros começa com um visto de um ano. Em princípio, depois de cinco anos, você tem direito a pedir um visto de dez, e também a requerer a cidadania. Na prática, muitas pessoas precisam renovar seu visto de residência todo ano, um exercício humilhante que torna quase impossível fazer as coisas que de fato as ajudariam a se integrar na sociedade francesa, como conseguir um emprego permanente ou um empréstimo.
O verdadeiro problema é a atitude da França em relação aos imigrantes. A direita populista provocou histeria com visões do país sendo invadido por muçulmanos das ex-colônias. Na verdade, quase metade de todos os imigrantes que chegaram à França em 2012 nasceram na Europa.
Em julho, a Assembléia Nacional da França aprovou uma lei de reforma da imigração depois de muito debate. A direita argumentou que a reforma abriria as comportas. Grupos de defesa de imigrantes disseram que ela não vai longe o bastante, e traz novos problemas. O projeto de lei, que deverá ser analisado pelo Senado no final do ano, criaria um cartão de residência plurianual destinado a reduzir filas e os custos de processamento nas prefeituras. Isso permitiria que os imigrantes ilegais que aguardam deportação fossem encaminhados para uma residência, em vez de um centro de detenção.
O projeto de lei também daria às prefeituras novos poderes intrusivos para verificar informações sobre os estrangeiros junto aos departamentos de saúde e de emprego. A maioria dos imigrantes na França seria obrigada a assinar um "contrato" prometendo aprender francês e os valores da República. Segundo o projeto, os imigrantes poderiam, dependendo do seu progresso, receber mais um visto plurianual, ter de voltar para um visto anual ou ter seu cartão de residência totalmente negado. O projeto de lei não faria nada para garantir o acesso aos cartões de dez anos que os bancos e empregadores exigem como prova de um compromisso de longo prazo em permanecer na França.
Em junho, com meu cartão de residência atualizado finalmente em mãos, preenchi o formulário para solicitar um visto de dez anos. Como todos os imigrantes aqui, eu sei que não há garantias.
Tradutor: Eloise De Vylder
Em janeiro, dei entrada no processo de mudar o meu endereço no meu cartão de residência, coisa que eu achei que seria simples. Mas a prefeitura de polícia central de Seine-Saint-Denis em Bobigny processa cerca de 1.500 solicitações de estrangeiros por dia, e não há sala de espera separada para os norte-americanos. O tempo de espera costumava ser tão longo que as pessoas chegavam na noite anterior ao horário marcado ou pagavam alguém para ficar na fila. Em 2013, uma nova equipe assumiu o comando e simplificou um pouco o processo, então, pelo menos, as filas durante a noite se foram, e as reservas de vagas também.
Ainda assim ainda levou seis meses, incluindo dois dias inteiros na prefeitura, para atualizar meu endereço. Eu preenchi um formulário na internet no início de janeiro, e consegui um horário em 6 de março. Cheguei cedo e fui encaminhado para uma sala grande cheia de gente. À medida em que o dia passava, pais tentavam acalmar as crianças inquietas e os bebês que choravam. Todos nós sabíamos que não tínhamos escolha: se quiséssemos ficar na França, tínhamos de esperar.
Quando voltei –-três meses depois-– para pegar o meu novo cartão, abri o livro que eu tinha levado para passar o tempo, e ele me pareceu a escolha perfeita: "The Meursault Investigation" ["A Investigação Meursault"], de Kamel Daoud. O autor, que é argelino, imagina a história de "O Estrangeiro", de Albert Camus, do ponto de vista do irmão do argelino sem nome morto a tiros pelo herói francês, Meursault. Muitos dos estrangeiros na prefeitura de Bobigny vêm de ex-colônias francesas na África sub-saariana e no Magreb. Em busca de residência legal, eles pedem o reconhecimento oficial de sua existência na França.
A maioria dos estrangeiros começa com um visto de um ano. Em princípio, depois de cinco anos, você tem direito a pedir um visto de dez, e também a requerer a cidadania. Na prática, muitas pessoas precisam renovar seu visto de residência todo ano, um exercício humilhante que torna quase impossível fazer as coisas que de fato as ajudariam a se integrar na sociedade francesa, como conseguir um emprego permanente ou um empréstimo.
O verdadeiro problema é a atitude da França em relação aos imigrantes. A direita populista provocou histeria com visões do país sendo invadido por muçulmanos das ex-colônias. Na verdade, quase metade de todos os imigrantes que chegaram à França em 2012 nasceram na Europa.
Em julho, a Assembléia Nacional da França aprovou uma lei de reforma da imigração depois de muito debate. A direita argumentou que a reforma abriria as comportas. Grupos de defesa de imigrantes disseram que ela não vai longe o bastante, e traz novos problemas. O projeto de lei, que deverá ser analisado pelo Senado no final do ano, criaria um cartão de residência plurianual destinado a reduzir filas e os custos de processamento nas prefeituras. Isso permitiria que os imigrantes ilegais que aguardam deportação fossem encaminhados para uma residência, em vez de um centro de detenção.
O projeto de lei também daria às prefeituras novos poderes intrusivos para verificar informações sobre os estrangeiros junto aos departamentos de saúde e de emprego. A maioria dos imigrantes na França seria obrigada a assinar um "contrato" prometendo aprender francês e os valores da República. Segundo o projeto, os imigrantes poderiam, dependendo do seu progresso, receber mais um visto plurianual, ter de voltar para um visto anual ou ter seu cartão de residência totalmente negado. O projeto de lei não faria nada para garantir o acesso aos cartões de dez anos que os bancos e empregadores exigem como prova de um compromisso de longo prazo em permanecer na França.
Em junho, com meu cartão de residência atualizado finalmente em mãos, preenchi o formulário para solicitar um visto de dez anos. Como todos os imigrantes aqui, eu sei que não há garantias.
Tradutor: Eloise De Vylder
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